Os carros autônomos podem mudar o mundo, mas como isso vai acontecer?

Hoje em Dia*
21/11/2015 às 12:15.
Atualizado em 17/11/2021 às 03:01
 (Volvo / Divulgação )

(Volvo / Divulgação )

Quando a fotografia digital começava despontar como uma opção ao analógico, a Kodak realizou estudos—que se mostraram certeiros—indicando que o nova técnica iria dominar o mercado em 20 anos. Apesar de ter tempo para isso, a empresa torceu o nariz e não se modernizou. Atualmente, a gigante se encolheu e sobrevive apenas como um laboratório de patentes.

Para não cometer o mesmo erro, as grandes montadoras de hoje vêm correndo atrás para não perder o mercado do futuro. A General Motors, por exemplo, planeja entregar até 2017 veículos capazes de automação quando em rodovias. A sueca Volvo já apresentava em 2014 seus primeiros protótipos de carros que andavam e até estacionavam sozinhos. O desenvolvimento de carros completamente independentes por empresas de tecnologia já tem até mesmo estimulado novas contratações nas grandes marcas. Mas, para o pesquisador norte-americano Zack Kander, estes esforços podem não ser suficientes.

No artigo “Como o carro autônomo do Uber vai destruir 10 milhões de empregos e redefinir a economia em 2025”, Zack Kander argumenta que toda a indústria será reinventada na próxima década.

Sua tese é ratificada por Denis Wolf, coordenador do projeto brasileiro de carro sem motorista, o CaRINA II. Para o cientista, quando a tecnologia já estiver bem desenvolvida e for maioria nas ruas, a tendência é que o mercado mude. “O modelo de negócio vai mudar. O carro vai deixar de ser um produto de consumo para se tornar um serviço”, argumenta o cientista da USP.

Seu carro será seu motorista

 

CADU, projeto que nasceu no campus da UFMG

Considere que, para a maioria da população, o carro é usado por pouco tempo, mas o custo para mantê-lo não é tão baixo—no Brasil, um carro popular custa pelo menos R$ 700 por mês para ser mantido.

Some a isto o interesse do Uber em substituir seus motoristas por carros autônomos. A mudança reduziria drasticamente os custos de transporte oferecido pela empresa e o barateamento do serviço pode fazer com que a máxima do ter o carro próprio deixe de ser interessante.

Dessa maneira, segundo o pesquisador Zack Kander, “os carros do futuro serão padronizados, elétricos e autônomos e serão vendidos à empresas de transporte”. Para ele, será difícil que a lógica de produção atual—com milhões de carros fabricados todos os dias—sobreviva a essa disrupção. Se Kander estiver certo, a modernização do transporte custará caro para o mercado e as novidades, dependendo do ponto de vista, parecem prever um futuro distópico.

Segundo o anuário de 2009 da Associação Nacional de Veículos Automotores, Anfavea, a indústria automotiva tem ligações que atingem cerca de 200 mil empresas no Brasil. Sua importância para a economia é evidente. Oficinas, borracharias, seguradoras, concessionárias, profissionais liberais (como motoristas, taxistas, serviços como garagens, aluguel, etc.), perderiam postos de trabalho. Além, é claro, das próprias linhas de montagem.

No futuro previsto por Orwell, todo mundo será rastreável

Muito além das preocupações de mercado, há problemas na adoção de carros autônomos que se assemelham à distopia orwelliana, de “1984”. Afinal, com a adoção em massa desse tipo de transporte, todo usuário terá rotas e destinos facilmente rastreáveis: seja pelo mercado, seja pelo Estado, seja por hackers.

Aliás, dois hackers deram mostras de como os mais recentes avanços dos computadores de bordo em veículos podem ser perigosos. Em uma demonstração para a revista norte-americana Wired, Charlie Miller e Chris Valasek – hoje funcionários do Uber – invadiram o sistema em rede de um Jeep Cherokee, produzidos pela Fiat Chrysler.

Ao hackear o sistema, eles tinham controle sobre o rádio, vidros elétricos, ar-condicionado e também podiam desligar a transmissão e até acionar os freios do veículo. O repórter que passou pelo experimento classificou a situação como assustadora.

Para o mestre em modelagem matemática e computacional pelo Cefet-MG, Izaquiel Lopes, “esse assunto deve ser ainda muito discutido e é um dos impedimentos para a adoção de carros autônomos”. O cientista frisa que esse debate devia ser mais constante.

Brasileiros são os mais ansiosos pela nova tecnologia

 

Carros do Google circulam sem motorista

Nos EUA, onde modelos de carros autônomos já podem ser vistos circulando, a Cisco System publicou uma pesquisa em 2013 apontando que cerca de 60% dos consumidores norte-americanos usariam tais veículos.

O mesmo estudo mostra que, no Brasil, a aceitação chega a 95%, sendo que, dos países catalogados, é o que mais anseia pela novidade.

Um dos projetos brasileiros de carros autônomos mais promissores é o CaRINA II, que começou a ser desenvolvido em 2011, pela USP São Carlos. É como coordenador deste projeto que o professor Denis Wolf sustenta que até o ano de 2020 a tecnologia destes automóveis
já estará amadurecida.

Minas Gerais também não fica atrás. O Grupo de Pesquisa e Desenvolvimento de Veículos Autônomos (PDVA), ligado à Faculdade de Engenharia da UFMG, já apresentou o CADU (Carro Autônomo Desenvolvido).

Devem se passar pelo menos duas décadas até que passe a ser incomum ver humanos dirigindo carros. Pelo menos é o que imagina Wolf, que, aliás, se diz pessimista. “Entre 2020 e 2025 vão começar as primeiras iniciativas, dez anos depois vamos começar a consolidar isso. Eu não sou tão otimista, a indústria automobilística é muito conservadora”, arrisca.

PEDRAS NO CAMINHO

Além desse conservadorismo da indústria de automóveis, outros dois empecilhos devem atrasar a difusão do uso de carros autônomos: os seguros e a legislação. “As seguradoras terão que ser remodeladas, afinal, em caso de acidentes, quem vai responder pela direção do automóvel?”, argumenta Denis Wolf.

Enquanto a questão dos seguros é universal, no caso do Brasil, o que preocupa Wolf é a legislação. Para ele, regras que normatizem o uso dos autônomos já devia estar sendo discutida em Brasília. “Hoje, não podemos fazer testes adequados, isso prejudica muito o desenvolvimento da tecnologia no Brasil”.

Futuro na nuvem

 

 

Se hoje é comum ouvir música através de serviços de streaming de dados, pode ser que o futuro dos transportes também esteja nas nuvens. De repente, parece que o ano de 2084, da ficção científica “O Vingador do Futuro”, foi antecipado e até a fuga de Quaid (Schwarzenegger) em um carro dirigido por um robô esquisitão, parece menos absurda.

*Com Alex Bessa

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