100 anos de Mandela: líder africano que virou mito guarda relações próximas com o mundo das artes

Thiago Alberto
17/07/2018 às 17:42.
Atualizado em 10/11/2021 às 01:27
 (Shaun Curry/AFP)

(Shaun Curry/AFP)

O século XX possuí uma dimensão importante no que se refere ao embaralhamento de figuras públicas na sociedade. Foi um período muito marcado por misturas improváveis entre o político e o pessoal e em como este processo se deu nas mais diversas instâncias.

O ambiente midiático, por exemplo, passou a ser povoado por representantes da política que ganharam estatura de celebridades, muito em função das trocas que estes mantinham com outros espaços sociais. Dos gabinetes oficiais e institucionalizados, até o espaço da cultura em seus mais diversos eixos (literatura, artes visuais, música, cinema, televisão), o último século transformou de forma definitiva notáveis figuras do campo político em representantes da cultura da mídia.

Poucos nomes são tão representativos nesse arranjo que o sul-africano Nelson Mandela. Seu centenário, celebrado hoje, é uma oportunidade para situar o ex-presidente da África do Sul como inspiração gigantesca para o mundo das artes.“Ele possuí uma dimensão que perpassa a vida política, mas alcança a vida comum”, diz Rosália Diogo jornalista, escritora e coordenadora do Festival de Arte Negra (FAN). “Não é em todo século que temos um Mandela, o ser humano grandioso e iluminado, de uma sensibilidade e generosidades muito grandes”. Assim, podemos pensar em Mandela como o libertário, o ícone da fraternidade, o símbolo de resistência e, por que não, com o mito pop. Como nota Rosália, as interseções entre ele e o mundo das artes se dão muito na chave da inspiração: o homem que “entregou a vida para uma causa não como estratégia política, mas por sua humanidade. Por exemplo a questão do rúgbi na África do Sul que diz de um esforço de unificar as partes dissonantes, das etnias, não é necessariamente política do ponto de vista técnico– tem a dimensão do lazer, do desejo, mas de algo que poderia também mobilizar as pessoas por sua grandiosidade”.

Não à toa, este episódio foi inspiração para o filme “Invictus”, de 2009, mais um quadro na longa galeria de produções que relacionam Mandela e as artes. Rosália aponta Mandela como inspiração para uma gama de grandes artistas brasileiros, no sentido de que a sensibilidade do líder africano se encontra próxima a outros sensíveis típicos da expressão cultural. “Uma escritora como a Conceição Evaristo, por exemplo, que faz de sua literatura uma crítica social de alto nível, que fala de igualdade de gênero e de raça, já citou que se inspira em Mandela”, diz. 

A luta contra o apartheid (a segregação racial como prática social), uma das marcas de Mandela, é outro aspecto lembrado por artistas. “No mundo das artes visuais esta é uma denúncia comum, que tem nele uma inspiração. Na obra do Jorge dos Anjos (artista mineiro), um monstro, podemos identificar um pouco disso, Mandela como inspirador de uma pintura que diz da delicadeza, resolvendo a agressão pelo trabalho artístico, que revela uma outra possibilidade mundo”, diz. 

E, claro, a resistência, aspecto aderente ao homem que passou décadas preso devido à seu ativismo– e, pouco depois de livre, se tornou presidente da África do Sul– é outro aspecto notável que Rosália destaca no campo das artes. “Podemos citar o músico Sérgio Pererê, um sujeito que diz sempre que ‘resiste hoje, bravamente, para não ficar resistindo a vida inteira’. Ou seja: que nossa luta seja um momento de transição, para ver um amanhã melhor. Isso me remete à Mandela, que ficou a vida inteira lutando. Um libertário que através de um movimento político mudou seu país”, concluí. 

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