Artistas mineiros se rendem ao Carnaval e lançam álbuns autorais temáticos

Vanessa Perroni
vperroni@hojeemdia.com.br
18/02/2017 às 06:00.
Atualizado em 16/11/2021 às 00:34

Não foi só o Carnaval de rua de Belo Horizonte que despertou o crescente interesse dos foliões nos últimos anos. No embalo da festa, marchinhas produzidas em solo mineiro caíram no gosto e fizeram a alegria de quem foi atrás dos blocos em anos anteriores. O sucesso de títulos irreverentes – e carregados de humor político – como “Prefeito, Libera o Cooler” e “Coxinha da Madrasta” estimulou ainda mais a produção autoral. Resultado? Muitos trabalhos viraram discos dedicados à folia momesca.

Inspirada nos tradicionais bailes, a Orquestra Royal, formada em BH ano passado por artistas de diferentes estilos musicais, vai distribuir gratuitamente o primeiro CD “As Mais Gozadas” no domingo de Carnaval, às 17h, na rua Sapucaí, bairro Floresta. O disco reúne 12 marchinhas compostas por integrantes do grupo nos últimos cinco anos.

Dentre as canções estão “Selfolia”, “Manja Rolha”, “Não Enche o Saco do Chico”, “Sudorese em BH”, “Prefeito, Libera o Cooler”, e, claro, “O Baile do Pó Royal”, que inspirou o nome da orquestra. Muitos “hinos” viralizaram na internet. 

“‘O Baile do Pó Royal’ já existe há três anos e a galera ainda canta”, diz o idealizador da orquestra, Vitor Velloso. “Acaba fugindo um pouco do tema da época. Vai tomando outros significados e vira um hino de Carnaval”, diz Velloso, também parceiro na autoria das composições “Pinto Por Cima” e “Solta o Cano”, que faturaram, respectivamente, o segundo e o terceiro lugares da 6ª edição do Concurso de Marchinhas Mestre Jonas. 

Hoje, às 16h, a Orquestra Royal toca na rua Paraíba com Cláudio Manoel, na Savassi. Dia 21, no Granfinos com Hermes & Renato; e dia 25 na Vila Albertini, em Santa Tereza

Para ele, “o tom irreverente ligado ao protesto” é a cara da festa em BH. “As pessoas muitas vezes querem um grito para resumir o que estão pensando ou sentindo, e a marchinha cumpre bem esse papel”, acredita, acrescentando que o Carnaval foi, por assim dizer, naturalmente pedindo para os artistas montarem projetos em torno da festa. 

“Felizmente, a resposta é muito boa. Estamos recebendo muitos contatos de produtores. Tocamos em outras cidades. Fora o trabalho de cada um que têm as próprias bandas. É uma correria positiva”, comemora o músico.

Que público exatamente curte o trabalho? É variado, diz Vitor. “São pessoas que nos conhecem do concurso de marchinhas. Ou que se identificam com a mensagem das canções. E há gente de todas as idades”.

Trilha sonora própria vira grande diferencial dos blocos

O músico e compositor Marcos Frederico fez do Carnaval um parceiro a mais na bem-sucedida dupla formada por ele e o bandolim. Integrante da Orquestra Royal, o artista já soma cerca de 15 marchinhas ao currículo e, em meados de março, lança “Carnaval Cigano” –álbum instrumental com forte influência da festa em Minas. 

“A intenção foi fazer um disco para dançar. Focado no bandolim, mas com influências de tudo que ouço e conheço. Desejo que seja um legado para o Carnaval de BH”, comenta.

 Ciro Thielmann/Divulgação / N/A
“Carnaval Cigano” – Marcos Frederico lança álbum instrumental “para dançar”

No álbum, ele contou com a ajuda de parceiros como Flávio Henrique, com quem divide a faixa-título, e Murilo Antunes, compositor da faixa “Enigma”, a única com letra. “Enxergamos no carnaval uma janela para escoar a produção. Atingimos pessoas que não conheciam o nosso trabalho e agora nos acompanha ao longo do ano”, assegura.

A marchinha “Solta o Cano” – 2º lugar no concurso Mestre Jonas este ano – feita em parceria com Vitor Velloso vai ganhar nova versão para o carnaval, em ritmo de frevo. “A música te dá essa possibilidade. Ela pode ser tocada o ano todo. Mesmo que o mote tenha passado. Mas nesse caso acho que vai ser atual por um bom tempo”, ironiza. 

“Tropical Lacrador”

O bloco Juventude Bronzeada, que arrasta milhares de foliões pelas ruas de BH, lançou recentemente “Tropical Lacrador”. O disco, na opinião dos integrantes, contribui para o fortalecimento da cena musical autoral. “A ideia foi aproveitar essa voz e alcance que o Carnaval nos deu, e apresentar para o público esses compositores”, comenta o regente do bloco e produtor musical do disco Rodrigo “Boi” Magalhães.

O Juventude tem na equipe músicos dos grupos A Fase Rosa, Djambê e Djalma Não Entende de Política. “Unimos as duas coisas. As composições são muito fortes no carnaval de BH. Espero que esse seja o primeiro de muitos discos”, anseia Boi.

Para ele, mesmo que o mote de muitas marchinhas se torne antigo, as canções resistem ao tempo. “As marchinhas ficam para sempre. E o próprio hino dos blocos mostra força. A música do ‘Então Brilha!’ sempre causa comoção”, exemplifica, avaliando ainda que “a tendência do grupo é cada vez mais cantar músicas próprias” durante a folia. 

Com oito composições autorais, o disco do Juventude já está disponível para download em várias plataformas on-line e será também vendido em diversos eventos do bloco.Fernando Dilly/Divulgação / N/AJUVENTUDE BRONZEADA – Bloco lançou, no fim de janeiro, o disco “Tropical Lacrador”, com oito faixas autorais

 Concurso de marchinhas reflete diversidade da música local

O Concurso de Marchinhas Mestre Jonas sintetiza a força da música produzida em Minas. A primeira edição contou com 120 canções. A sexta, realizada neste ano, reuniu 191 concorrentes na finalíssima, sábado passado.

“Participa gente de todas as matizes da cena musical. É um espelho do que acontece no Estado. Temos composições mais românticas, experimentais, roqueiras, e por aí vai. É o Carnaval da diversidade”, comenta o produtor cultural Kuru Lima, organizador do concurso.

Kuru defende a competição como uma oportunidade para os músicos mostrarem o próprio trabalho, “ainda que travestidos desse clima carnavalesco”. 

“O Carnaval abre a possibilidade de impulsionar muitos compositores da cena mineira. Ano passado a música ‘Não Enche o Saco do Chico’, que ganhou o 5º Concurso Mestre Jonas, foi vice no 11º Concurso Nacional de Marchinhas da Fundição Progresso, na Lapa, no Rio”, relembra o artista.

O aumento no número de canções inscritas no Concurso de Marchinhas Mestre Jonas também aponta para a intensa produção da cena autoral, diz ele. “O número quase dobrou em seis anos. Isso é muito significativo. Sem contar que 90% das inscritas esse ano eram inéditas”. 

Em 2014, o concurso recebeu recorde até agora de 228 inscrições. “Está se mantendo esse padrão. Temos a consciência da importância e o papel do concurso dentro da cena musical”, frisa Kuru Lima.

Registros fonográficos

Os organizadores do concurso também lançaram disco com canções participantes. “Foi em 2015. Contou com marchinhas daquele ano, e as três vencedoras dos anos anteriores”, rememora Kuru.

Outros discos relacionados ao Carnaval de BH lançados aos longo dos últimos anos foram o vinil “Deita no Cimento!” (2015) e o álbum “Coisa de Louco (2014), do músico Dudu Nicácio.

Além disso

Hoje e amanhã, o bloco Trio Chacoalha desfila pelo baixo centro de BH com dez bandas autorais em cima do trio elétrico. De BH, Graveola, Família de Rua, Djalma Não Entende de Política, Iconili, Gustavito, Pequena Morte e Di Souza, além da alemã Yellow Cap, a pernambucana Eddie e BNegão e os Seletores de Frequência. O bloco se concentra às 14h na avenida do Contorno entre as ruas da Bahia e Espírito Santo, em frente à antiga Escola de Engenharia da UFMG, e segue até a Praça da Estação, onde deverá encerrar às 22h. A entrada é franca. 

“Nossa ideia é aproveitar o desejo por folia que toma conta de BH, para levar ao maior número de pessoas possível a música de artistas independentes, com shows festivos e eletrizantes”, explica Gabriel Assad, sócio da Híbrido Comunicação e Cultura, produtora do bloco. “Temos a esperança de ajudar a transformar o carnaval de rua da cidade em uma poderosa ferramenta de fomento da música contemporânea de Belo Horizonte”, afirma Victor Diniz, outro sócio da Híbrido.

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