CCBB BH anuncia mostra do filme livre

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
31/05/2015 às 11:41.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:17
 (MFL/DIVUGAÇÃO)

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Escolhido para abrir, amanhã, no CCBB, a extensão mineira da 14ª Mostra do Filme Livre, “O Tempo Não Existe no Lugar em que Estamos” dá nome, profissão e um RG brasileiro para as teorias pós-modernas do filósofo francês Jean Baudrillard expressas no livro “Simulacros e Simulação”, publicado em 1981.   Essa relação é construída a partir da história de um veterano fotógrafo que não consegue se adaptar às mudanças tecnológicas e sociais de agora, não vendo mais objetivos na vida. O filme de Dellani Lima passa grande parte de sua narrativa questionando uma sociedade que prefere a cópia ao original.   Ao se lembrar de um tempo em que a fotografia se aproximava do trabalho de um artesão, o protagonista está se referindo à afirmação de Baudrillard de que a sociedade atual substituiu toda a realidade e significados por símbolos e signos, tornando a experiência humana uma simulação da realidade.   Essa nova situação é ampliada pela economia e pela falta de utopias, representadas no filme pela “perseguição” sofrida pelo fotógrafo por seu eu do passado, presumivelmente comunista, o que o leva, gradualmente, a se desfazer de sua história, queimando os negativos e as cópias de suas fotos.   FIM DAS IDEOLOGIAS   Enquanto a câmera de Dellani, em sua obra mais linear e afeita ao gênero dramático, exibe imagens de prédios decadentes de Belo Horizonte, a narrativa caminha na direção de encontrar um novo lugar para esse personagem, que agora só quer compensar o tempo que não pôde ficar ao lado de sua família.   Até mesmo pela presença no elenco de André Gatti, professor de cinema e ator bissexto, o filme nos remete a “Avanti Popolo”, que também junta o fim das ideologias à decadência física, além do retorno ao seio familiar.    Outro ponto comum são as imagens, que registram com melancolia o tempo passado.   Lançado há dois anos, “Avanti” tem um desfecho mais melancólico que a obra de Dellani, que ainda se agarra na possibilidade de compreensão do outro, como demonstra a sequência final do parto (real) da filha do fotógrafo, interpretada por Julieta Dobbin.   ENTREVISTA   “Um filme melancólico, nostálgico e, ao mesmo tempo, sobre outras formas de amar, de perder, de reconstruir”   Você deixa um pouco de lado o experimental e aposta numa narrativa com início, meio e fim, calcada principalmente em personagens. Qual a razão? Sim, o filme tem essa característica linear e narrativa, na qual a personagem realmente é a potência que engendra, anima e movimenta a alma do espectador. Mas existem muitas experimentações ainda, principalmente no que se refere ao tempo da montagem, a composição espacial dos quadros, presentes no diálogos alternados, no desenho de som, na trilha sonora e no próprio processo de realização. Sempre serei um experimentalista, por amor e por necessidade, só que agora quero trafegar mais na prosa do que na poesia ou na crônica.   A mensagem do filme também é bastante clara, a respeito do fim natural das coisas, além das utopias, já que o personagem não luta muito para fazer prevalecer os seus sonhos. Concorda que, apesar da cena final, é um filme melancólico sobre o ciclo da vida? Essa é a questão. O problema de muita gente no mundo. Ter que dar certo. Vencer, ganhar, ser o melhor: dilemas impostos pelo caçador primitivo, artimanha perigosa do capital consumista. Aldo, o fotógrafo, desiste. Mas não da vida, e sim de ter que dar certo. Ele dá conta, a partir daquele reset mental, de uma sensação boa ao se perder e de saber que podia, a partir daquele momento, reinventar a sua história. Para ele basta os sentimentos, mais nada. Sem pulsão de morte. As sensações já seriam seus guias, seus oráculos, seus xamãs. Ele queria abandonar a cópia e viver. Disso não saberemos ainda. Quem sabe numa continuação. Um filme melancólico, nostálgico e, ao mesmo tempo, sobre outras formas de amar, de perder, de reconstruir.

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