Cemflores ganha edição comemorativa e promete possível volta

Thiago Pereira
talberto@hojeemdia.com.br
21/08/2017 às 09:13.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:11
 (Marcelo Pinheiro/arquivo)

(Marcelo Pinheiro/arquivo)

O mote de Mao Tsé Tung proferido em 1956, em destaque na página ao lado, servia como um libelo à liberdade, só possível com confrontos narrativos e reconhecimento das diferenças. Dez anos depois a beleza teórica da frase ganhou contornos práticos muito distantes- com uma Revolução Cultural chinesa, marcada por censuras e autoritarismos. 

Mas para um grupo de jovens na Belo Horizonte em fins dos anos 1970, o desabrochar das flores exigia um irrigar de novas ideias- que eles estavam dispostos a dar: poesia, ensaios literários, viagens visuais. Tudo isso compunha a Cemflores, revista editada inicialmente por estudantes da UFMG (mas que logo estendeu a outras faculdades e escolas), em 1977. 

O projeto capturava o espírito da época: traçar as esquinas entre poesia, cultura pop e algum ativismo político.Um outro clube, uma outra Belo Horizonte. “Realmente, para nós a poesia revolucionária de Maiakovski ligou-se com a chamada poesia marginal e o punk já na revista e nas performances que fazíamos”, lembra Jair Fonseca, o Gato Jair, um dos fundadores. 

E o caráter faça você mesmo alcançava tanto meio como mensagem. “Nós mesmos fazíamos o design, a diagramação e a paginação dos textos. Aliás, nesse aspecto era importante a referência da poesia concreta–Augusto e Haroldo de Campos, Décio Pignatari– de uma geração anterior à da poesia marginal. Isso era curioso porque os concretos eram muito rigorosos e ‘limpos’, enquanto os marginais eram desleixados e ‘sujos’. Deu uma mistura interessante”, diz.

“Ela foi essencial para a cultura literária e de poesia marginal naquele período de ditadura. A Cemflores tinha um certo ar de resistência, numa época em que publicar era algo extremamente difícil, e hoje a publicação se tornou algo mais vulgar, temos redes sociais onde todos publicam textos, palavras e ideias”, resume o professor e músico Francesco Napoli, parceiro artístico de fundadores da revista como Marcelo Dolabela. “Publicar qualquer coisa naquela época exigia um processo mais solene. Hoje acho que precisamos de coisas mais dessa ordem, retomara esta aura que a publicação tinha”, diz. 

Retorno

Quase quatro décadas depois de seu lançamento, a Cemflores retornou com um número especial em comemoração aos 40 anos do III Encontro Nacional de Estudantes, que aconteceu em Belo Horizonte em 1977, e foi considerado um marco histórico do Movimento Estudantil contra a ditadura militar. 

A comemoração, no início deste mês, reuniu nomes da época em um recital, como Jair, Luciano Cortez, Mário Aléxis , Marcelo Dolabela, Virgílio Mattos, entre outros. “O momento político no Brasil está conturbado de novo, então aproximando-se esta data redonda de 40 anos, houve a possibilidade de juntar os remanescentes dessa turma e fazer a publicação comemorativa, diz Jair. 

A celebração dos quarenta anos pode ser apenas o início de uma nova fase, segundo Jair. “A ideia é continuar a publicar mais, quem sabe retomar a revista, mesmo numa época em que o meio eletrônico é predominante”, diz. Entusiastas à ideia não faltam: “Neste contexto que estamos vivendo hoje, a Cemflores traria de novo um caráter de resistência, fundamental”, acredita Napoli.

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