Cineasta Allan Fiterman fala sobre seu filme 'Berenice Procura'

Estadão Conteúdo
25/06/2018 às 08:12.
Atualizado em 10/11/2021 às 00:58
 (Reprodução/Instagram)

(Reprodução/Instagram)

Quando visitou o set de "Berenice Procura", no Rio - a cena filmada era a do concurso na boate -, o repórter falou com todo mundo no set, menos com Valentina Sampaio, que faz Isabelle. Ela filmou sua cena e recolheu-se ao camarim improvisado. Muita intensidade. Agora, de novo, Valentina, a trans do longa de Allan Fiterman, permanece distante e misteriosa. Ela reside atualmente em Milão, onde se firmou como modelo top e é muito solicitada. Num período relativamente curto - menos de um mês -, o cinéfilo brasileiro está sendo confrontado com esse universo trans.

Primeiro, estreou "Paraíso Perdido", de Monique Gardenberg, e a diferença é que Jaloo participou ativamente do lançamento. Valentina segue isolada. A entrevista acordada ainda não se realizou - questão de agenda e horário. É bela. Feminina, sem afetação. O filme que estreia na quinta, (28), traz um elenco estelar cercando Valentina - Cláudia Abreu, Du Moscovis, Emílio Dantas. O filme baseia-se no livro de Garcia Roza. A trans Isabelle é assassinada em Copacabana. Ao descobrir que seu filho jovem tem ligação com ela, uma taxista, Berenice/Cláudia Abreu, investiga o caso. Seu marido, Du, com quem mantém uma relação desgastada, é o repórter que cobre o caso para uma grande rede de TV. E há a atividade da polícia, claro. A dupla investigação converge para um desfecho... Assista ao filme.

Allan Fiterman está num momento de muita atividade, mas também estava quando o repórter visitou o set. É um conceituado diretor de novelas e a Globo o liberara para realizar o filme. Agora, é o inverso. Ele lança "Berenice Procura" e prepara a próxima novela das 9 - "O Sétimo Guardião", texto fantástico de Aguinaldo Silva, sobre um gato, felino de quatro patas, que guarda uma fonte muito especial.

"Berenice Procura" não nasceu como projeto de Fiterman. Uma amiga o recomendou para a produtora Elisa Tolomelli. Curiosa, a trajetória do diretor. "Queria fazer cinema e fui estudar em Los Angeles. Quando voltei ao Brasil, finalizando um primeiro longa que fiz com Marília Pêra, fui parar na Globo. Lá, dirigi 'A Força do Querer', que fez história ao abordar o universo trans."

Mas em "A Força do Querer", o núcleo que Fiterman dirigiu, e muito bem, foi o do morro, com Juliana Paes e Emílio Dantas, que volta em "Berenice Procura". Tem diferença entre dirigir para cinema e TV? "As pessoas têm preconceito (com a televisão), mas, para mim, o problema é menos o veículo e muito mais a relevância social das questões que você aborda. A Força do Querer deu o que falar. Espero que Berenice também repercuta." Seu desafio? "Quando cheguei, o roteiro era muito mais extenso, e disperso, com mais de 100 páginas. Consegui convencer a Elisa de que não conseguiria filmar em um mês.. Fiz um trabalho de enxugar. Naquele roteiro, Du e Cláudia moravam em casas separadas. Eu os juntei porque queria mostrar que uma família dita normal, com pai, mãe e filho, pode ser mais disfuncional que outra formada pelo afeto, com pessoas cujo comportamento foge às normas."

O repórter lembra "Tudo Sobre Minha Mãe" e pergunta se foi referência - "Puxa vida, agora você pegou pesado. "(Pedro) Almodóvar! Quem sou eu para querer me comparar a ele? Mas, sim, é essa disfuncionalidade funcional, uma nova família, que me interessou nessa história, embora a origem do fascínio de tudo foi a possibilidade de tratar do universo trasns. Acho da maior importância, nesse Brasil retrógrado e conservador em que estamos vivendo. Sinto que há esperança. Se a TV, um meio massivo, consegue tratar do tema, o cinema deve ir mais longe." É o que ele tenta, e consegue, fazer em seu thriller. "Ele é a base, mas o tempo todo me preocupei em fazer com que o suspense fosse uma ferramenta para o drama da família." As revelações explodem numa cena de descontrole emocional no chuveiro. Olha o spoiler. "Nunca duvidei do potencial do meu elenco, mas a cena me surpreendeu", avalia.

Valentina? "É especial, iluminada." Mas o diretor pede segredo - lá vai o repórter contar - da cena de sexo frontal, porque pessoas trans têm uma identidade de gênero diferente de seu sexo atribuído, e convivem mal com ele. A cena, preparem-se, é forte. E agora, Allan? "Dessa vez vou fazer a direção geral da novela O Sétimo Guardião. Estou siderado pelo mundo fantástico do Aguinaldo (Silva) e com um problema. Tenho todo um elenco já escalado, Marina Ruy Barbosa, Bruno Gagliasso, Tony Ramos, mas o gato vai virar homem. Isso vai ocorrer só no capítulo 58. Começo a gravar logo, mas o problema maior é esse. Quem vai ser meu gato?"

Em momento único, e feliz, Cláudia Abreu está em todas: cinema, teatro e TV
Supermãe de três meninos de 6 a 11 anos, mais a enteada, que ama, Cláudia Abreu está em todas - no teatro, com "PI - Panorâmica Insana"; na TV, com "Belíssima"; e nos cinemas, a partir de quinta, 28, com "Berenice Procura".

Por que fazer a taxista de 'Berenice Procura'?

Porque é uma guerreira, uma mulher comum, nada glamourosa, que vive esse momento particular de recuperar a confiança e o afeto do filho. Sou mãe, adoro meus filhos e esse é um tema que, muito naturalmente, mexe comigo. E tinha, claro, o mundo trans. Sou fascinada por esse universo transformista e acho um privilégio que o cinema me permita abordar esse mundo com a compreensão que a Berenice adquire. É o que está faltando no Brasil. O País está muito preconceituoso e, como artistas, temos de lutar contra isso.

Você também está na novela 'Belíssima', de Sílvio de Abreu, no Vale a Pena Ver de Novo...

Cara, é a maior coincidência, e eu estou adorando. Belíssima emenda com Celebridade, outra novela que eu fiz, com texto do Gilberto Braga. Gilberto me deu uma vilã deliciosa, que o público adorou, e a coincidência é que o papel em Belíssima não pode ser mais diferente. Gravamos na Grécia, uma tragédia. Quando matam meu marido a tiros, tenho de gritar em grego. (NR - Quando conversou com o repórter, nem Claudia nem ele sabiam que a cena seria suavizada e descaracterizada em relação ao original, ao passar na sexta, 22. O fato repercutiu nas redes sociais, com muitas críticas.)

E o teatro?

Queria muito voltar ao teatro adulto, depois de ter refeito, para meus filhos, Pluft, O Fantasminha. Sou ligada no infantil. Escrevi, com a Flávia (Lins e Silva), o Valentins, atração do canal Gloob. Foi um projeto que a gente criou do zero, sem se basear em nada, muito bacana. Para o teatro adulto, voltei-me para a minha mentora. A Bia (Lessa) sempre me propõe coisas novas, desafiadoras.

E a boa forma?

Você acha? O segredo é ser feliz.

  

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