CineOP discute preservação de imagens captadas em novos suportes

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
17/06/2017 às 16:39.
Atualizado em 15/11/2021 às 09:08
 (LEONARDO LARA/UNIVERSO PRODUÇÃO)

(LEONARDO LARA/UNIVERSO PRODUÇÃO)

A conservação de filmes deixou de ser uma preocupação. Virou emergência. Sob o nome de “Emergências Digitais”, 12ª edição da Mostra de Cinema de Ouro Preto (CineOP) realiza, a partir de quinta-feira (22), na cidade histórica, uma ampla discussão sobre a preservação das produções, por incrível que pareça, recentes.

O digital barateou os custos de produção e tornou o audiovisual mais acessível. Por outro lado, trouxe uma dor de cabeça para os especialistas na área de preservação, resumida na pergunta: os primeiros títulos brasileiros captados exclusivamente em digital ainda podem ser acessados? 

Mais: como conservar não somente os filmes, mas também o material de divulgação, como blogs? Sem falar em toda uma produção abundante, feita com simples câmeras de celulares, que vem documentando momentos importantes da história atual, como ocupações e manifestações de rua.

Países da América Latina estão um pouco à frente do Brasil, mas o quadro também é preocupante. Na Argentina, por exemplo, a reposta às rápidas mudanças tecnológicas “tem sido lenta e segue sendo lenta”, de acordo com Andres Levinson, especialista em preservação e arquivamento de meios audiovisuais.

À frente do setor de Pesquisa e Desenvolvimento de Projetos do Arquivo Fílmico do Museo del Cine de Buenos Aires, ele observa que as principais dificuldades são referentes à falta de recursos. “A tecnologia exige investimentos constantes, porque você precisa atualizar os computadores a cada dois ou três anos”. 

Como a tecnologia se torna rapidamente obsoleta, o investimento em formação é fundamental, preparando funcionários para migrar de uma plataforma para outra. “O problema é que ainda não encontramos uma tecnologia mais estável, segura e de longo prazo para preservar os materiais”, afirma Andres.

Ele estará em Ouro Preto para falar da experiência argentina no segmento. No Museo del Cine, menos de 10% da coleção se encontra em versões digitais. “O alto custo tem sido a principal razão para a lentidão no processo”, lamenta o especialista, que tinha maior segurança na era analógica. 

“Havia certas garantias e possibilidades de planejamento a médio e longo prazos para preservar materiais como o filme ou suporte magnético, já que seu comportamento ao longo do tempo é previsível. Sabemos que, sob certa segurança, controle de temperatura e umidade, ele pode durar pelo menos cem anos”, compara.

INFLUÊNCIA
Os problemas poderiam ser menores na América Latina se a região não fosse tão afetada pelo vai e vem político e econômico de cada região. Já o México, lembra ele, está à altura de países europeus em termos de formação técnica, recursos tecnológicos e orçamento. Até há pouco tempo o Brasil também tinha posição de destaque.

“O Brasil costumava ter uma política desenvolvida, com recursos próprios, mas, infelizmente, a situação mudou para pior nos últimos três anos”, avalia Andres, sem mencionar os constantes cortes de recursos da Cinemateca Brasileira, em São Paulo, que possui mais de 200 rolos de filmes.

Um projeto em andamento na Argentina é a formação de uma cinemateca nacional. “A ideia gerou grande entusiasmo na comunidade cinematográfica até esbarrar na origem do orçamento. Ela não está disposta a desistir de algum percentual a receber do Instituto Nacional de Cinema para cuidar de seus próprios filmes!”, critica.

A digitalização deve também estar atrelada à função social

Outro convidado internacional que estará em Ouro Preto é Tzutzumatzin Soto, que tem colaborado no resgate e uso de acervo de imagens de movimento na Cidade do México e Oaxaca.

Junto à organização civil OaxacaCine, ela coordenou o “Diagnostico de colecciones audiovisuales oaxaqueñas”, que resultou na publicação “Archivo Comunitario: rebeldía desde la tradición”.

Em entrevista ao Hoje em Dia, por e-mail, Tzutzumatzin revela outra forma de analisar e comparar o desenvolvimento das cinematecas de cada país em relação à preservação de seus filmes.

“Não falaria de atraso em função de outros continentes. Falaria de uma diferença na inclusão da preservação analógica e digital como um objetivo incluído nas políticas públicas relacionadas a arquivos”, observa.

Um caso paradigmático, segundo ela, é o trabalho do Netherland Institute for Sound and Vision, em Amsterdã (Holanda), que tem uma das maiores coleções digitalizadas.

“Eles chamam para uma reflexão sobre o uso de coleções: por que se digitaliza? Eles fazem essa pergunta porque ainda têm um longo caminho a percorrer de apropriação social de suas coleções”, destaca.

Preocupação com imagens amadoras feitas em celulares

A questão da preservação de material audiovisual não diz respeito apenas a instituições e governos. A especialista mexicana Tzutzumatzin Soto salienta que os usuários de celular, por exemplo, potencialmente tem meios de preservar o material que filmam. “Você deve aprender a fazer backups, para entender como ele funciona, dar valor à “nuvem”, ciente de que ela pode ser o nosso apoio a longo prazo, e também migrar as informações a cada tantas vezes. Não se pode deixar para começar do zero”. 

No campo da organização não-governamental e de defesa dos direitos humanos, a questão é geralmente tratada a partir do campo de segurança digital, diz Tzutzumatzin.

“Eles devem proteger os dados que coletam e produzem, e que estão familiarizados, ou deveriam trabalhar com criptografia e software livre? Isso também é preservação”, sublinha.

A especialista defende que a base para uma melhor boa gestão para mudanças tecnológicas é a criação de políticas internas sobre a preservação digital e formação permanente.

12ª Mostra de Cinema de Ouro Preto
De 22 a 26 de junho, na cidade de Ouro Preto.
Veja programação completa no site cineop.com.br

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