Diretor trash é tema do documentário 'Carneiro de Ouro'

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
24/11/2017 às 18:36.
Atualizado em 02/11/2021 às 23:52
 (PEDRO JÚLIO/DIVULGAÇÃO)

(PEDRO JÚLIO/DIVULGAÇÃO)

SÃO MIGUEL DO GOSTOSO (RN) - Estado mais pobre do Brasil, Piauí conta hoje com uma produção intensa em cinema. "Se soubesse que ficaria assim, não precisaria ter saído para buscar trabalho", constata, em tom de brincadeira, a cineasta Dácia Ibiapina, que desenvolveu sua carreira em Brasília.

"Carneiro de Ouro", seu mais recente filme, exibido num cinema ar livre montado na praia de Maceió, em São Miguel do Gostoso (localizado a pouco mais de 100km de Natal), durante uma mostra local, compartilha  com o espectador essa perplexidade sobre o que está sendo feito em Piauí, a partir de um personagem inusitado como Dedé Rodrigues.

 O que chama a atenção na filmografia de Rodrigues é menos a qualidade artística, já que seus longas-metragens são feitos com pouquíssimos recursos. Apesar do cômico surgir diversas vezes, pela ousadia em fazer ficção com efeitos especiais, Dácia explora o amor desse piauiense pelo cinema.

Durante o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em setembro, onde "Carneiro de Ouro" foi apresentado pela primeira vez, Rodrigues levou 100 cópias em DVD de filmes como "Cangaceiros Fora de Tempo" e voltou com a mala vazia, virando atração dos fãs do trash.

Para Dácia, o título de "Cangaceiros" tem dois sentidos. O literal, já que  homens armados como Lampião cortaram o sertão nordestino, enfrentando fazendeiros e policiais contra as injustiças sociais, até o final da década de 1930. E o figurado, com personagens "sem noção" ganhando a tela.

A diretora não refuta outra interpretação, a de um conteúdo político que dialoga com a atualidade. "Estamos vivendo uma espécie de cangaço fora do tempo. Mas os cangaceiros não são os pobres e sim o Congresso, com a formação de uma bancada da bala no Senado", compara Dácia.

Ela destaca a dificuldade em biografar no cinema personagens tão envolventes como Rodrigues. "As pessoas dizem que, com um personagem incrível como esse, fica mais fazer, sem ter a devida compreensão do trabalho do documentarista", ressalta.

"Um documentarista tem que criar relações, administrar conflitos, apostas nas pessoas e deixá-las sentir verdadeiramente. Para alguns cineastas, a construção é mais importante que o personagem. Fazemos documentários para mostrar o personagem e não quem fez o filme", defende Dácia.

Apesar da efervescência da produção atual, favorecida pelas tecnologias digitais, está cada vez mais difícil fazer documentário, de acordo com Dácia. A razão está nas leis de direitos autorais, que obriga o cineasta a pegar autorização de cada pessoa que entra no quadro, protagonista ou não.

"Antes era mais fácil. Você chegava numa feira e ia filmando todo mundo. Depois ia embora, com as pessoas felizes de estarem no filme. Hoje temos que prestar contas de tudo. Se você quer levar a equipe num restaurante com boa comida, cuja dona não tem nota fiscal, não pode. A Agência Nacional de Cinema fala com CNPJs e não com pessoas", critica.

(*) O repórter viajou a convite da organização da Mostra de Cinema de Gostoso

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