Você pode não lembrar a fisionomia da atriz Nancy Cartwright, mas é impossível não reconhecer a sua voz. Há quase três décadas, ela é responsável pela marcante dublagem em inglês do anárquico Bart, da série animada “Os Simpsons”. Com 60 anos recém-completados, Nancy virou tema do filme “Em Busca de Fellini” (em cartaz nos cinemas). O argumento do longa nada tem a ver com a família disfuncional de cor amarela; mas sim com uma história de amor à primeira vista com o diretor italiano Federico Fellini.

Criada pela mãe praticamente sem pôr os pés na rua, vivendo um mundo de faz-de-conta, Nancy continuou a viver entre a realidade e a fantasia quando entrou num cinema para uma mostra de filmes de Fellini, na década de 70. De lá, partiu para a Itália sozinha, para conhecer pessoalmente o realizador. Nesta entrevista ao Hoje em Dia, o diretor sul-africano Taron Lexton, em seu début em longas-metragens, fala deste mergulho no universo felliniano.

Como foi a construção da história de “Em Busca de Fellini”?
Havia três camadas para a história real deste filme – a vida de Nancy, os filmes de Fellini e a Itália. Eu me aproximei dos três da mesma maneira, imergindo-me totalmente para encontrar o coração de cada um. Felizmente, eles naturalmente entrelaçam de maneiras bonitas e surpreendentes, e isso se tornou o coração deste filme. Acima de tudo, a verdadeira história de Nancy foi o principal material de origem. Com ela no set, tanto em Ohio como na Itália, tivemos uma conexão direta com sua história, sua energia e sua vida. Ela era uma incrível força criativa, atrás e à frente da câmera. Seu papel como Cosima é um dos meus personagens favoritos, entrando num momento crucial na jornada de Lucy (o nome que Nancy ganhou no filme, vivida por Ksenia Solo).

Vocês conheceram os outros personagens reais?
Nós conhecemos! Nancy foi a principal, é claro. Mas uma das primeiras coisas que fizemos foi procurar qualquer personagem de Fellini ainda vivo e convidá-los a fazer parte desse filme. Um dos melhores cameos (breves aparições) foi de Bruno Zanin, que interpreta Beppe em nosso filme – ele também foi a estrela do último filme ganhador de Oscar do Fellini, “Amarcord”. Tê-lo no set foi uma grande honra. Ele nos deu algumas ideias surpreendentes sobre Fellini que incorporamos ao filme.

O que é real e o que é fantasia no filme?
Essa é a grande questão! Todos têm uma opinião diferente sobre isso, mesmo entre os cineastas. Adoro ouvir as pessoas debaterem isso depois de ver o filme, mas acho que é importante que deixemos as pessoas tirarem suas próprias conclusões. Os filmes de Fellini foram intencionalmente ambíguos, para que as pessoas pudessem encontrar seu próprio significado e queríamos permanecer fiéis a esse espírito.

Por que Lucy se apaixonou pelos filmes de Federico Fellini?
Eu acho que é como um novo caso de amor: as forças de trabalho são poderosas, mas misteriosas. Ela não entende que isso a atrai para Fellini, sentindo uma forte atração. Na minha opinião, ele representa o oposto da mãe de Lucy, Claire (Maria Belo), e, portanto, um mundo inteiro que nunca conheceu. Ele é tudo o que é misterioso e sensual e libertado sobre o mundo. E para alguém que nunca foi exposto a isso ou mesmo preparado para isso, pode ser bastante eletrizante.

A filmagem na Itália deve ter sido importante para recriar os personagens de Fellini?
Foi muito importante. Fizemos várias viagens à Itália durante a pré-produção para encontrar não apenas os locais de filmagem de Fellini, mas os lugares reais que Nancy visitou em sua jornada real. Nós também queríamos comemorar a beleza da Itália e trabalhamos em estreita colaboração com a nossa equipe de produção italiana para encontrar não apenas os locais de “cartão postal”, mas os lugares conhecidos dos habitantes locais. O filme é uma mistura desses três mundos – Nancy, Fellini e Itália.

Fellini é um diretor de cinema desconhecido do grande público nos Estados Unidos?
Fellini é uma lenda nos Estados Unidos. Ele é considerado por muitos cineastas americanos como um dos maiores diretores de todos os tempos e muitos dos meus cineastas favoritos, de Martin Scorsese a Tim Burton e Quentin Tarantino, consideram-no uma influência fundamental em seu próprio trabalho. Influenciou tanto o cinema americano quanto o italiano, e sua presença ainda pode ser sentida hoje.

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