Funk cresce em todas as classes, mas continua encontrando resistência

Cinthya Oliveira - Hoje em Dia
06/10/2015 às 08:24.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:57
 (Editoria de Arte)

(Editoria de Arte)

Ele está em todos os cantos. Nas festas da periferia, nas boates da zona sul, nos fones de ouvido, na novela das oito, em filmes e seriados, nos carros que circulam pela cidade. No YouTube, é sucesso garantido, rendendo milhões de visualizações. Porém, mesmo com toda essa penetração no cotidiano do brasileiro, há quem ainda não reconheça o funk como uma manifestação cultural legítima.

Prova de que o gênero permanece polêmico após três décadas de existência foi uma postagem do Ministério da Cultura (MinC), feita no último dia 14 de agosto, e que rendeu muito bafafá na rede. Acompanhado da hashtag #DialogaBrasil, o texto afirmava que “você pode até não gostar de funk, mas dizer que ‘não é cultura’ é desconsiderar essa manifestação cultural riquíssima”.

Para se ter uma ideia da repercussão, em pouco mais de duas semanas, foram mais de dez mil compartilhamentos e mais de dois mil comentários – sendo que alguns se transformaram em verdadeiros fóruns de discussão sobre o assunto.

Por e-mail, a assessoria do MinC afirma que o órgão busca, por meio das postagens nas redes sociais, incentivar o debate e as reflexões sobre a cultura. “É papel do Estado defender e garantir a ampla liberdade de expressão, defender o direito ao acesso e à produção da cultura. Defender todas as manifestações culturais significa, sobretudo, entender e absorver as diferenças, combater o discurso de ódio que avança no Brasil e no mundo. Significa entender a cultura como elemento central da experiência democrática”.

Para provar que quer reconhecer todas as formas de cultura, o MinC acaba de lançar a Rede de Cultura Viva, uma ferramenta que tem como objetivo permitir que entidades e coletivos culturais se autodeclarem Pontos de Cultura. A meta, com a autodeclaração, é chegar aos 15 mil pontos em 2020.

Aproximação

Há vários casos de iniciativas públicas e privadas que buscaram estreitar laços com esse universo. O escritório mineiro da União Brasileira dos Compositores (UBC), por exemplo, estreou, ano passado, o projeto “Encontro da UBC com os Artistas do Funk”, promovendo uma integração com artistas do gênero. No Rio de Janeiro, foi criado até um edital estatal de bailes funk, com incentivos financeiros para festas.

MC Delano sofreu preconceito por ter optado pelo gênero

Um dos artistas mais bem-sucedidos de Belo Horizonte na atualidade, MC Delano já sofreu preconceito por ter escolhido o funk como estilo de vida. O rapaz de 18 anos começou a carreira musical na infância, tocando cavaquinho em meio a rodas de samba, e integrou a banda de rock 12Duoito, mas encontrou na batida eletrônica um caminho de sucesso nacional.

“Sofri preconceito por parte de muitos amigos, mas o funk é uma forma de expressão como qualquer outra e merece respeito”, diz o artista, que é um dos expoentes do YouTube, com vídeos que somam quase 15 milhões de visualizações. “Mas compreendo que o preconceito aconteça, porque as letras tratam de assuntos que não são bem aceitos por uma parcela da sociedade”.

A agenda de MC Delano é prova de como o funk de Minas Gerais não tem barreiras. Ele já se apresentou em várias casas da periferia da Região Metropolitana, assim como em boates renomadas da capital. Recentemente, teve apresentações agendadas em grandes cidades, como Salvador, Recife, Florianópolis. “No meu show, deixo a galera cantar. Além das minhas músicas, canto Legião Urbana e Claudinho e Buchecha. O que agrega muito ao meu funk é a diversidade com que trabalho a minha música”.

Andersen Viana mescla batida brasileira a músicas do século 9

O funk pode se encontrar com a música erudita? O compositor e maestro Andersen Viana prova que sim. Hoje, o músico promove o lançamento do disco “Missa Funk”, trabalho em que uma percussão inspirada no funk carioca é integrada à “Missa Romana do Século 9”, obra formada por cinco cânticos de louvação em latim.

Essa mistura foi desenvolvida depois que o artista realizou um trabalho na comunidade de Nova Contagem, em 2009, em que os meninos aprendiam sobre música com instrumentos feitos de sucata. “O ritmo do funk está ali, tem uma presença marcante. Entre as minhas obras, acredito que essa seja a mais interessante na fusão de gêneros. Consegui algo que não é erudito, porque está ali uma batida, mas também não é funk, porque foi construído a partir de moldes seculares”, conta Andersen Viana, acrescentando que a inserção da batida na obra erudita foi sugestão de um dos meninos que participaram do projeto.

Fusão

O artista diz que gosta de experimentar fusões de linguagens e gêneros, tendo como principal referência o grupo coral inglês Libera, que mistura música erudita a ritmos e referências pop. A ideia de unir “Missa Romana” à percussão influenciada pelo funk teve impacto no exterior, encantando o maestro norte-americano David Moore, que comandou essa gravação da mistura de Andersen.

Lançamento do “Missa Funk” na Academia do Café (Rua Grão Pará, 1.024, Funcionários). Nesta terça, das 19h às 21h30. Preço do CD: R$ 25

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