'I, Daniel Blake', do britânico Ken Loach, leva Palma de Ouro em Cannes

AFP
Hoje em Dia - Belo Horizonte
22/05/2016 às 16:21.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:33
 ( AFP PHOTO / ALBERTO PIZZOLI)

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CANNES, França - "I, Daniel Blake', uma implacável narrativa sobre a injustiça social na Inglaterra, do diretor britânico Ken Loach, levou neste domingo a Palma de Ouro, prêmio máximo do Festival de Cannes. "Outro mundo é possível e necessário!", disse o diretor de 79 anos, ao receber a recompensa, a segunda Palma de Ouro de sua longa carreira dedicada ao cinema social.

Em seu discurso de agradecimento ao festival e a toda a sua equipe, Loach aproveitou a oportunidade para fazer uma crítica enérgica aos riscos do  neoliberalismo. "O mundo em que vivemos está em uma situação perigosa, à beira de um projeto de austeridade que chamamos de neoliberal, que corre o risco de nos levar à catástrofe", disse. "Deve-se dizer que outro mundo é possível e, até mesmo, necessário", prosseguiu, falando em francês e em inglês, após ter alertado contra o retorno da extrema direita.

Outro grande vencedor foi o diretor canadense Xavier Dolan, de 27 anos, que faturou o Grande Prêmio do Júri de Cannes por "It's only the end of the world", um drama familiar sobre um escritor homossexual que sabe que vai morrer e decide anunciá-lo a seus familiares. O roteiro é uma adaptação de uma obra de Jean-Luc Lagarce, escrita em 1990, nos terríveis anos da Aids.

O longa conta a história do bem sucedido autor de teatro Louis, interpretado por Gaspard Ulliel, um homossexual, que reencontra a família após 12 anos de afastamento para anunciar sua morte próxima. "Tudo o que fazemos na vida, o fazemos para sermos amados, para sermos aceitos", declarou, chorando, o diretor, ao receber o prêmio. Este é o sexto longa-metragem de Xavier Dolan, jovem prodígio e queridinho de Cannes. "Eu espero realmente não tê-lo decepcionado onde quer que ele esteja", afirmou o jovem diretor em alusão a Lagarce, que morreu de Aids em 1995.

Melhores diretores

O romeno Cristian Mungiu, com "Bacalaureat", e o francês Olivier Assayas, com "Personal Shopper", compartilharam o prêmio de melhor diretor do Festival de Cannes. Em "Bacalaureat", Cristian Mungiu retrata uma sociedade romena devastada pela corrupção, enquanto "Personal Shopper", dirigido por Olivier Assayas, conta a história de uma jovem que tenta entrar em contato com o fantasma de seu irmão.

Melhores atores

O ator iraniano Shahab Hosseini conquistou o prêmio de melhor ator em Cannes por seu papel em "The Salesman", de Asghar Farhadi, um drama doméstico e social sobre a classe média de Teerã, também premiado na categoria de melhor roteiro. A fita conta a história de um casal de atores de teatro que ensaiam a peça "A Morte do caixeiro viajante", de Arthur Miller, e que precisam deixar o apartamento onde vivem na capital iraniana, pois este ameaça desabar.

Eles se mudam para o apartamento conseguido através de um amigo, que omite que a inquilina anterior era uma prostituta. Um dia, um antigo cliente dela entra e estupra a esposa (Taraneh Alidusti), desencadeando a busca por vingança do marido, interpretado por Hosseini, que quer lavar sua honra.

Através desta história de vingança, o diretor se questiona sobre a violência, que o protagonista considera estar no direito de exercer. A trama é entremeada com os ensaios da peça de Miller. "Há tempos queria fazer um filme sobre uma peça de teatro", explicou à AFP Asghar Farhadi, cineasta iraniano de 44 anos, ganhador de um Oscar com "A Separação" (2011).

A melhor atriz da edição 2016 do festival foi para a filipina Jaclyn Jose, do filme "Ma Rosa", do diretor filipino Brillante Mendonza. Na trama, ela interpreta a matriarca de uma família pobre de Manilla e derrotou a favorita Sonia Braga, cotada por sua elogiada interpretação no brasileiro "Aquarius", de Kleber Mendonça Filho, que não levou nenhum prêmio.    AFP PHOTO / ALBERTO PIZZOLI / N/A

Jaclyn Jose agredece ao prêmio, ao lado da filha e do diretor Brillante Mendoza

Palma de Ouro de honra

O ator Jean-Pierre Léaud recebeu uma Palma de Ouro de honra no Festival de Cannes, sendo aplaudido de pé pelo público.    "Nasci em Cannes, em 1959, depois da exibição de 'Os incompreendidos' ('Les quatre cents coups', no original), de François Truffaut", lembrou emocionado o ator, de 72 anos, que foi ao Festival pela primeira vez aos 14. "Ao final da projeção, fui aclamado sob um mar de aplausos", completou.

"Sinto hoje a mesma alegria profunda do que há 58 anos, quando François me disse, remetendo-me ao set de '400 coups', toma, Jean-Pierre, você ganhou o papel principal", acrescentou. "Nunca quis construir uma carreira, mas escolhi filmar com diretores que amo e admiro", completou.

"Uma frase de Jean Cocteau me passou pela cabeça: 'o cinema é a única arte que captura a morte em ação'". Encarnação da Nouvelle Vague, Léaud foi a Cannes este ano por seu papel do Rei Sol agonizante "La Mort de Louis XIV". Ele interpretou o personagem de Antoine Doinel em vários filmes de Truffaut, até "O amor em fuga" ("L'Amour en fuite", no original), de 1979, e trabalhou com Jean-Luc Godard, Jean Eustache e Bernardo Bertolucci.

Vitória brasileira

O documentário "Cinema Novo", de Eryk Rocha, sobre o movimento cinematográfico nascido no Brasil nos anos 1960, ganhou no sábado o Olho de Ouro no Festival de Cannes. "Cinema Novo é um filme-manifesto sobre a vigência de um movimento cinematográfico quase esquecido dos anos 1960", indicou o júri do prêmio, disputado pelos documentários apresentados em Cannes.

O filme brasileiro premiado, de 90 minutos, é um ensaio poético sobre o movimento cinematográfico, e inclui trechos de filmes da época e depoimentos de seus principais expoentes, como Nelson Pereira do Santos, Leon Hirszman, Joaquim Pedro de Andrade,
 Ruy Guerra, Walter Lima Jr., Paulo César Saraceni e Glauber Rocha, pai do realizador. Este é o sétimo filme de Eryk Rocha ("Jard", 2013), que, aos 38 anos, produziu, principalmente, documentários.

O curta-metragem brasileiro "A moça que Dançou com o Diabo", de João Paulo Miranda Maia, que disputava a Palma de Ouro na categoria de melhor curta-metragem, obteve uma menção especial do júri do Festival de Cannes.

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