José Trajano faz de seu novo romance uma obra que mistura biografia e ficção

Thiago Pereira
talberto@hojeemdia.com.br
30/04/2018 às 17:01.
Atualizado em 03/11/2021 às 02:36
 (FÁBIO SÉTIMO/DIVULGAÇÃO)

(FÁBIO SÉTIMO/DIVULGAÇÃO)

O leitor desavisado que começar a devorar o delicioso “Os Beneditinos”, novo livro de José Trajano, tem enormes chances de chegar à conclusão de que o autor, um dos maiores nomes do jornalismo brasileiro, está completamente deprimido. 

Aliás, amigos próximos de Trajano tiveram esta sensação após lerem a obra, e correram ao telefone para saber notícias do parceiro. “Alguns me ligaram, perguntando o porque de tanta desilusão, se eu estava bem, se tinha perdido o emprego”, conta, revelando alguns de seus truques narrativos. “O livro embaralha as coisas mesmo. É o encerramento– mas que deveria ser o início– de uma trilogia, que começa com meus dois primeiros livros (“Procurando Mônica” de 2014 e “Tijucamérica”, de 2015). Depois de falar da minha infância e do meu bairro, volto agora aos tempos de colégio”.

Na verdade, bastaria uma pesquisa básica para saber que Trajano segue ativíssimo, seja no YouTube com seu canal Ultrajano, seja na TV com o “Bonde do Zé”, no Canal Brasil. Mas ao mesmo tempo, esta situação revela um dos méritos da obra: ao embaçar as fronteiras do biográfico e da ficção, de forma tão sedutora, “Os Beneditinos” convence e aproxima o leitor do protagonista da obra. 

Como era de se esperar, Trajano está sim meio amargo com os rumos do mundo– até por isso realizou no livro uma viagem sentimental. “Existe um pouco de desânimo em como as coisas estão acontecendo, o que de alguma forma justifica ir ao passado, lembrar dos tempos de escola, de uma época emocionante”, assume. É o colégio de Trajano–e, especialmente, seus colegas– a inspiração maior para a obra. O personagem principal é um jornalista esportivo às voltas com desemprego e problemas de saúde típicos da idade avançada, que vê em uma nova modalidade esportiva, o walking football, uma chance de voltar aos tempos de Colégio São Bento (daí o título do livro), mentalmente e fisicamente, para reencontrar sua velha turma de futebol. 

Depois de ter contato com a modalidade, que consiste em jogar futebol andando, sem correr, através do sogro de sua filha, Trajano encontrou o gancho ideal para abrir seu baú de memórias. Assim, “Os Beneditinos” tem traços do que é chamado romance de formação, capturando toda uma geração sob o diapasão da amizade, e do afeto ginasial. “Um livro que me influenciou muito foi ‘O Encontro Marcado’ do Fernando Sabino, que inclusive cito no meu livro. No sentido em que falo dos jovens estudantes, faço descrições do Rio de Janeiro nos anos 1950, o rádio, a televisão, as idas ao Maracanã. Mas vou e volto constantemente na história, não fico apenas no passado”, diz o autor. 

Desta maneira, o atual e o antigo, o real e o inventado, vão tecendo a trama com certa naturalidade. O reencontro do São Bento Futebol Clube, time no qual Trajano era técnico e jogador, realmente aconteceu ‘na vida real’, em um daqueles jantares de reunião de escola. Já a sonhada revanche contra o time do colégio Santo Inácio, rival histórico dos então adolescentes cariocas, durante um torneio de walking football em Londres, não. Ele também garante que segue vivendo na Vila Madalena, em São Paulo, e não na idílica Mooca que abriga o protagonista do livro. Mas divide com o personagem paixões como o futebol de botão e, claro, a torcida pelo América carioca.

No fim das contas, o romance se situa como uma belíssima meditação sobre o envelhecimento. Algo que Trajano, constata (“Com 72 anos, estou mais próximo do fim do que do começo, claro”), mas não o tira o sono. “Não é algo que me preocupa de forma absurda, cruel”, garante.

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