José Padilha fala sobre seu Robocop, outro policial linha dura

Paulo Henrique Silva - Hoje em Dia
21/02/2014 às 08:34.
Atualizado em 20/11/2021 às 16:10
 (Sony)

(Sony)

RoboCop não pede para sair, como faz o Capitão Nascimento em “Tropa de Elite”, um dos grandes sucessos do cinema brasileiro. Mas o enfrentamento da violência, com suas várias facetas (filosófica, social e política), é comum a esses dois policiais de linha dura.

“RoboCop fala sobre um risco concreto, que é a automatização da violência, abrindo uma janela para o fascismo”, registra o diretor José Padilha em entrevista ao Hoje em Dia. Respirando aliviado após acompanhar os números da estreia da nova versão do ciborgue (no Brasil, o filme entra em cartaz a partir desta sexta-feira, 21), Padilha não esconde que fez um filme político.

“Uma das questões do filme é que, fora do país, os robôs podem ser usados para matar, enquanto nos Estados Unidos são ilegais”, salienta o cineasta, deixando explícito o link com o escândalo da espionagem denunciado pelo ex-agente da CIA Edward Snowden.

Embora sejam produções bem distintas, em tamanho e proposta, “Tropa de Elite” e “RoboCop” abordam uma mesma questão: a escalada de violência. É um tema que está na sua ordem do dia?
A violência está na ordem do dia em vários lugares do mundo. Os dois filmes têm essa abordagem, mas “Tropa de Elite” está circunscrito a uma realidade do Rio de Janeiro, que também atinge as grandes cidades do Brasil, envolvendo a constituição político-militar e a forma como os nossos governos usam a segurança pública para fazer política. “RoboCop” fala sobre um risco concreto, que é a automatização da violência, abrindo uma janela para o fascismo. Os americanos saíram das guerras do Vietnã e do Iraque com vários soldados mortos. A substituição por robôs é algo que vem acontecendo. Outra questão é quando se decide, no filme, que, fora do país, os robôs podem ser usados para matar, enquanto nos Estados Unidos são ilegais.

Não é possível deixar de remeter essa questão ao escândalo da espionagem, denunciado pelo ex-analista da CIA Edward Snowden, em que os Estados Unidos tinham acesso a e-mails e telefonemas no estrangeiro, enquanto no país era considerado uma prática ilegal.
Mas é bom lembrar que há uma simetria de tratamento com o estrangeiro no Brasil, como a relação com os bolivianos em São Paulo. De qualquer forma, os Estados Unidos respeitam os direitos dos seus cidadãos, mas espionam qualquer pessoa de fora, como a presidenta da Alemanha, que teve seu sigilo telefônico quebrado.

Mais do que o filme original, que recorre ao sarcasmo, você amplia a discussão ética nas mais variadas esferas, das empresas de comunicação e privadas aos cientistas e políticos.
Acho o primeiro “RoboCop” bastante inteligente e corajoso. Ele usa um sarcasmo agressivo e uma estética ultra-violenta para mostrar o ambiente corporativo da época do Reagan. O nosso tem um cunho mais filosófico, uma ironia mais fina ao registrar a mídia radical de direita que deturpa os fatos para justificar a política externa. O Samuel L. Jackson é quase um apresentador da Fox News. Então, aonde tinha sarcasmo, como você bem notou, agora tem sátira. Também abrimos espaço para uma questão filosófica, que é encontrar o que separa os homens das máquinas. Discutimos se a atividade policial é inerente ao homem a partir do drama existencial de Alex Murphy, que acorda, descobre-se robô e questiona se vale a pena viver.

“RoboCop” dá maior a importância ao personagem de Gary Oldman, que sintetiza esse limite ético. É o grande protagonista do filme, já que o ciborgue parece mais uma peça dessa engrenagem.
Gary faz o personagem que detém a tecnologia e a capacidade de criar o RoboCop. É o doutor Victor Frankenstein, concebendo um monstro. É ele quem lança as grandes teses filosóficas que estão sendo discutidas hoje em dia, como a ilusão do livre arbítrio, sobre o software que a nossa mente se transformou. Hoje somos computadores orgânicos.

Considero que o seu filme também é menos violento que o trabalho de Paul Verhoeven. Pelo menos, não é uma violência chocante.
A gente precisava dessa violência para estabelecer a lógica interna do filme, mas a função dela é diferente nessa versão. É outra ótica. Não precisávamos de explosões para falar o que queríamos.

Vem aí um segundo “RoboCop”? Quais são seus próximos projetos?
Ainda não pensei nisso. Não sei se vou querer fazer um “RoboCop 2”. É difícil responder isso agora. No momento, estou escrevendo um roteiro para a Warner, além de filmar meu episódio de “Rio, Eu Te Amo”. Também tenho outro projeto para ser filmado no Brasil (sobre a pacificação do morro do Alemão, no Rio de Janeiro).  

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