O dragão da ignorância contra a tríade da leitura

Especial para o Hoje em Dia (*)
23/04/2014 às 12:02.
Atualizado em 18/11/2021 às 02:15
 (Arquivo Hoje em Dia)

(Arquivo Hoje em Dia)

Hoje, 23 de abril , Dia Internacional do Livro e dos Direitos do Autor, é data de morte de Miguel de Cervantes e William Shakespeare. Hoje também se comemora o Dia de São Jorge. Neste 2014, sua lança se transforma em uma pena que subjulga o dragão da ignorância. E dezenas de países convocam esta tríade dos sonhos para fazer outros sonharem com um mundo leitor. Um mundo de leitores. As festas são inúmeras, em especial, em Barcelona, Espanha, onde nasceu a ideia. Lá, é dia dos namorados para a literatura. Pessoas colocam mesas e tablados na rua e trocam rosas por livros. Todos se presenteiam, agradecem, tudo é homenagem.

Num outro plano, naquele ali ao lado, todos estão preocupados. A velocidade que a tecnologia traz no seu diretório mostra outra face do dragão: a falta de concentração. Os celulares são os dragões da modernidade. Ao mesmo tempo que deixam os jovens e as crianças (sim, as crianças) durante horas, absortas, torpemente concentradas, promovem a dispersão. Uma desatenção, um alheamento, uma ausência de realidade. O celular-dragão substitui a interação da experiência humana.

Mas atenção, amantes de Cervantes: o fogo desta figura tecno-mística vem na forma de música, vídeo, conversa, mensagens, jogos, diálogos, emoções e, até, pasmem, leitura e redação. Sim, ele nos convida a ler, a experimentar as falsas emoções que o mundo virtual nos traz. Convida os jovens a “fazer conexões” e viver o universo dos aplicativos. Este Dragão, mitológico, traz consigo, como o canto da sereia moderna, os ingredientes da maldade, os pecados capitais: a vaidade, a luxúria, a soberba e a preguiça. A foto no Instagram que tem menos de 400 curtidas leva à depressão. As caretas no Snapchat se transformaram em meio de comunicação. Os grupos no Whatsap são fontes absolutas de verdades e falsa afirmação. Ali, todos são Deuses invertidos, governados pelo absolutismo da anarquia e do suposto anonimato. Os selfies são modos de se lançar no mercado, uma nova personalidade, um novo caráter, uma nova casca - uma velha armadura.

Pais, professores, escolas, indústrias, fábricas, comércio e todo o mundo empresarial não sabem mais como lidar com este Dragão da Virtualidade. O tempo livre, antes dedicado às coisas da naturalidade, até um certo bucolismo, viraram pó - pó de silício. O tempo livre, hoje, é o tempo da distração eletrônica. O livro e a leitura passam, como todo o processo, por brutais transformações. O e-book virou um astro da nova dinâmica. Com a mesma velocidade que veio, está indo, com número cada vez mais magros. É o reflexo da inconsistência destes tempos velozes. Não há prognóstico possível, ou confiável. E e TV e o computador nem foram citados, até agora.

Esta tríade, formada por São Jorge, Shakeaspeare e Cervantes não vai ter descanso tão cedo. O Dragão da Maldade e da Ignorância solta fogo por aí. No fim, o livro triunfa. Assim esperamos.

(*) Afonso Borges é escritor e idealizador do programa "Sempre um Papo"

 


 

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