Professor no topo da lista da formação do leitor brasileiro

Pedro Artur - Hoje em Dia
15/10/2014 às 09:01.
Atualizado em 18/11/2021 às 04:37
 (Divulgação)

(Divulgação)

O objetivo foi mostrar o que e quem influencia o hábito da leitura. Lançada pelo Instituto Pró-Livro (IPL) e realizada pelo Ibope Inteligência, a pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil” revelou, em sua mais recente edição, algumas mudanças em relação à anterior. A mais interessante diz respeito ao papel do professor, que ascendeu ao topo da lista por sua importância na propagação do gosto pela leitura – posto, até então, ocupado pela figura da “mãe”. No novo levantamento, 45% apontaram o professor em primeiro lugar – a mãe ficou em segundo, com 43%, e o pai em terceiro (17%).

“A pesquisa revelou de forma concreta a importância do professor na educação e na formação do comportamento do leitor do brasileiro”, diz Zoara Failla, coordenadora da obra “Retratos da Leitura no Brasil III”. Nesta quarta-feira (15), Dia do Professor, nada mais justo, pois, que dar a este profissional, loas também por este mérito.

“Tenho falado aos meus alunos que a educação é o pilar de qualquer sociedade. E a gente vive em um mundo absolutamente inserido na cultura escrita. Então, aqueles que detêm essa cultura têm mais mobilidade social, circula mais intensamente na sociedade”, diz Bianka de Andrade Silva, poeta e professora bolsista de Literatura da UFMG, onde também oferece curso de poesia contemporânea lusófona.

Ela concorda que o professor tem, sim, em mãos a responsabilidade de formar o público consumidor de leitura. “Infelizmente, o Brasil não é um país de leitores, a maioria das famílias não é leitora. E essa responsabilidade acaba se transferindo para a escola. Então, o papel do professor não é só formar o leitor, mas tentar fazer com que a família dele também seja leitora”, advoga.

Para Suzana Lima, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) – leciona ensinos de língua portuguesa e literatura – e coordenadora do programa “Leitura no Campus”, o professor se torna referência para os alunos no desenvolvimento do gosto pela leitura. “Mas professor não só de português e literatura. É gente que compartilha o que está lendo e consegue seduzir o aluno para vivenciar essa prática de pensar literatura não só como tarefa, mas como experiência para torná-los cidadãos mais conscientes”.

De Mariana, a também professora e poeta Deia Leal destaca a importância do professor como orientador que amplia horizontes “por partir do respeito ao conhecimento prévio do aluno”. O fato de ser professor-poeta, diz, acrescentaria, nessa relação, uma pitada de sensibilidade. “No caso específico de estudantes da EJA (Educação de Jovens e Adultos, parceria com a secretaria municipal de educação de Mariana), esse componente da sensibilidade torna-se item essencial, uma vez que os alunos comparecem às aulas após um dia cansativo de trabalho. Assim, os professores têm que dosar a exposição dos conteúdos de forma a manter aceso o interesse pelo crescimento e pelo sucesso”.

Independentemente do perfil do aluno, não falta quem defenda o que só ano passado a citada pesquisa traduziu em números. Luciana Gomes, a DJ Black Josie, conta que a musicista Elisa Freixo foi marcante em seus estudos sobre música colonial no Conservatório UFMG, onde ela teve seu primeiro contato com “O Discurso dos Sons”, de Nicolau Harnoncourt graças à professora. “É um livro que revoluciona a interpretação da música no período barroco. Ela influenciou toda uma geração de músicos ao indicar essa leitura”, diz.

A família do poeta Lucas Guimaraens sempre esteve entrelaçada à literatura – portanto, o universo não era novidade para ele. Mesmo assim, não se furta a citar dois mestres: “No (Colégio) Loyola, a Imaculada me conduziu às entrelinhas da leitura. Lembro-me que a turma do colégio foi com ela para Ouro Preto. Lá, estudamos, sobre as pedras de minério do chão da cidade, os Inconfidentes, os barrocos e seus contextos. Considero isto um momento de ruptura na minha formação”, diz ele, que também não esquece de Arthur José de Almeida Diniz. “Ele me levou a encontrar seriedade na pesquisa científica acadêmica e, ao mesmo tempo, ensinou-me que nenhum livro exaure a vida, que a literatura, que a filosofia jamais poderiam se dissociar da vida”.  

Professora doutora da Faculdade de Letras da PUC Minas, Márcia Morais só discorda de um ponto, da citada pesquisa: "O professor, penso, não supera a mãe - mãe é insuperável, já pensava Freud (risos). Penso, no entanto, que o professor que acredita que a leitura, sobretudo a de textos literários, seja um lugar de encontros de subjetividades, acaba sublinhando o gosto pela leitura". Ela explica: "Quando se joga - e a literatura é também jogo- com os sentidos de um texto, e o professor está aberto às interpretações que surgem entre os alunos, não se fechando naquela interpretação 'chapada' que surge sem grandes reflexões e já é um "déjà vu", o professor não apenas contempla o aluno-leitor, que passa a construir com o autor as direções de sentido para um texto, como também promove o exercício de troca de opiniões e respeito às diferenças".

Márcia prossegue: "Sendo o texto literário uma arena de muitas vozes - do autor, do narrador, das personagens e dos leitores - , sua leitura é ainda um exercício de democracia muito instigante. Por outro lado, a atuação do professor na orquestração das muitas leituras ainda faz acontecer as projeções dos alunos-leitores, mediadas pelo texto literário. Assim, tanto em termos de inscrição de subjetividades como em termos de exercício da cidadania, encontros de leitura bem conduzidos acabam sendo muito desafiadores e instigantes. Acabam sendo, então, lugares de desejo!", conclui.

 
 

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por