Tecendo fonogramas: Jongui sintetiza trajetória plural em seu primeiro disco solo

Lucas Buzatti
lbuzatti@hojeemdia.com.br
28/07/2018 às 19:06.
Atualizado em 10/11/2021 às 01:39
 (Foto Marlos Bakker/Jongui/Divulgação)

(Foto Marlos Bakker/Jongui/Divulgação)

Emanuella Palma/Divulgação

Após quase 30 anos de trabalho como instrumentista e produtor, Jongui lança seu primeiro disco solo

“‘Elétrico Fio Que Teço’ é sem dúvida um disco de travessia. Estética, pessoal, de vida”, comenta o baiano Lucas Santtana sobre o primeiro disco solo de Jongui – nome artístico de João Guilherme Valdetaro. De fato, ao mesmo tempo que é fruto atravessamentos conceituais e sonoros de uma caminhada de quase 30 anos, o álbum também é novidade na vida deste prolífico artista gaúcho, que hoje divide morada entre o Rio e BH. 

É que, no trabalho, Jongui enfim se assume cantor e compositor, dando cria a dez faixas autorais após uma intensa caminhada como baterista, percussionista, produtor musical e engenheiro de som. Inquieto, ele conta que o clique para lançar seu trabalho solo veio em 2011, quando produziu o primeiro álbum da mineira Raquel Coutinho, com quem é casado. “Foi um processo delicioso, de muita escuta, e acabei sendo parceiro dela em grande parte do disco. Naturalmente, isso se voltou para mim. Pensei: ‘Está na hora de fazer minhas coisas’”, relembra o músico, que já tocou com Lulu Santos, Daúde e Lobão. 

A partir dali, o artista iniciou um mergulho interno para encontrar exatamente o que buscava – com o esmero de arte-finalista próprio de um produtor. “Antes de começar a compor eu já sabia a sonoridade que queria que o disco tivesse, cellos, sopros, batuques e synths. Mistura de batuque afro-brasileiro e musica eletrônica. Uma música popular, de invenção e não de gênero”, afirma, ressaltando que o trabalho com a voz foi desafiador.

"Sobre o time de músicos que o acompanha no disco, Jongui conta que o processo de formação foi orgânico. “Fui encontrando pessoas na minha vida e me identificando com elas. Não bastava tocar determinado instrumento, eu precisava sentir que havia uma ressonância, um interesse pela minha proposta”, afirma. “Eu penso a música em 3D, não só letra e melodia. Adoro a canção, mas tenho esse outro lugar do todo, como num quadro. Essa relação com o fonograma, com as camadas, das coisas irem aparecendo e se completando”. Jongui/Divulgação

Capa do disco traz foto de Marlos Bakker, inspirada no pintor inglês Francis Bacon

Entre o palco e o estúdio desde a adolescência

A estreia de Jongui no mundo da música foi precoce. Aos 17 anos, o gaúcho, recém-radicado no Rio, fez um teste para tocar bateria na banda Buana 4, projeto do tecladista Maurício Barros, que havia acabado de sair do Barão Vermelho. “Foi o maior barato. Eu era um moleque, de aparelho nos dentes. E logo nossa música já estava tocando em novela, fomos contratados pela EMI/Odeon. Meus primeiros shows foram no Circo Voador lotado, dois dias, abrindo para o Blues Etílícos”, lembra. 

Pouco tempo depois, encerrada a banda e já com um filho pequeno, Jongui partiu para as gigs. “Comecei a tocar bateria com muita gente. Tinha 24 anos, estava tocando com o Lobão. Até que, em 1996, fiz uma turnê com a Daúde pela Europa, que foi lindíssima. Tocamos em Montreaux, em Nice... Foi muito importante para mim, me liguei que era possível viver do que eu gostava, que não era o mainstream. Foi o que me colocou diante do que seria a gravadora”.Arquivo pessoal 

Jongui, em 1996, acompanhando a cantora baiana Daúde, na primeira turnê pela Europa

Depois de tocar com outros nomes como Lulu Santos, Léo Jaime e Leoni, Jongui decidiu, então, abrir sua própria gravadora independente: a Net Records, pioneira no Brasil. “O primeiro disco que lancei pela gravadora foi ‘Noite’, do Lobão, e depois ‘Vida é Doce’, também dele. Como eu tocava com o Vulgue Tostoi, também lancei pela gravadora, além de trabalhos do Karnak, do Marcelo D2. Fizemos muitas coisas legais”, pontua.

“Nessa época, fiquei mais ligado em ser produtor e tocar só com a galera da cena independente. Recusei gigs grandes porque estava afim de ficar no estúdio ou acompanhando apenas quem eu acreditava no trabalho, indo contra a hegemonia das gravadoras”, afirma. “Foi uma época auspiciosa, início da internet, 2001, 2002. Aprendi um bocado”, completa.

Nascido no Rio Grande do Sul, radicado no Rio de Janeiro e adotado por BH

Foi no início dos anos 2000 que, através do contato com o músico e agitador cultural Gustavo Ziller, Jongui estreitou sua relação com a capital mineira. “Ele me conheceu por conta do lance da gravadora. Me contratou para produzir a banda dele na época, o Zippados, e para fazer uma pós-produção do DJ Roger Moore. A partir daí, eu nunca mais parei de trabalhar em BH. Virou minha segunda casa”, conta.

Entre 2004 e 2008, o artista morou na Serra do Cipó, na casa da esposa Raquel Coutinho. “Nos casamos, depois produzi o disco dela, fomos para Montreaux divulgar o trabalho. Foi uma época deliciosa”.Arquivo pessoal 

No camarim com o Vulgue Tostoi em 2001; Jongui é o segundo à esquerda

Depois, vieram outros trabalhos, com nomes como Bruno Couto, Tambor Mineiro e Maurício Tizumba. “BH me apresentou um jeito diferente do que eu conhecia de fazer arte. Tinha uma outra lida, suave, afetuosa. E é uma cidade que está fervilhando há muito tempo, cheia de artistas talentosos”, afirma. “Quando cheguei, disse que BH era a nova Recife. Mas depois vi que não. Que BH é a nova BH, mesmo. É uma coisa peculiar, das montanhas, cheia de dobras, barroca”.

Jongui ressalta que o lançamento de “Elétrico Fio Que Teço” na cidade tem sabor especial. “Será em um projeto legal, o Salve o Compositor. Vamos fazer em formato diferente, com batera, batuque e dois synths. Vai ser especial”. 

Serviço:  Lançamento de “Elétrico Fio Que Teço”, de Jongui. Dia 9 de agosto, quinta-feira, às 20h, no Teatro de Bolso do Sesc Palladium (rua Rio de Janeiro, 1.046 – Centro). Os ingressos para o show, pelo projeto Salve o Compositor, custam R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

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