Catalunha inicia votação que pode levar região a se separar da Espanha

Folhapress e AFP
27/09/2015 às 13:40.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:52
 (AFP)

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Os catalães votam neste domingo (27) em eleições históricas, que decidirão não apenas a composição do Parlamento e o novo governo, mas o futuro do projeto de separação da Espanha. As urnas foram abertas às 9 horas (4 horas em Brasília) já com fila em muitos locais. Às 13 horas, foi registrado um recorde parcial de comparecimento. Haviam votado 34,74% dos cerca de 5,5 milhões de eleitores, cinco pontos percentuais mais que os 29,43% das eleições de 2012, no mesmo horário.

A apuração começa às 20h e os resultados deverão ser conhecidos às 22h30.

"É um momento histórico. Fiquei arrepiada na hora de votar. Queremos que nos deixem decidir e seguir nosso caminho, somos diferentes do resto da Espanha", disse a professora aposentada Mercé Gratacos, 74, que votou em Pedralves, um dos bairros mais ricos de Barcelona, na parte alta da cidade.

O governador Artur Mas, do partido de centro-direita CDC (Convergência Democrática da Catalunha), antecipou as eleições, que estavam previstas para 2016, e jogou todas as fichas em dar-lhes um caráter plebiscitário: "sim" ou "não" à independência da Catalunha.

Tentativas anteriores de realização de plebiscito foram barradas pelo Tribunal Constitucional e pelo governo federal espanhol.

Mas se coligou com a ERC (Esquerda Republicana da Catalunha) para formar o "Juntos pelo Sim" e anunciou que abrirá um processo unilateral de independência caso obtenha a maioria absoluta das 135 cadeiras do Parlamento.

Embora legalmente a eleição não seja plebiscitária, Mas conseguiu transferir o foco da campanha para a discussão da independência. Evitou, assim, o debate sobre sua administração, marcada por cortes nos gastos sociais, especialmente nas áreas de saúde e educação.

Belviche, bairro operário da cidade-dormitório L'Hospitalet, na periferia de Barcelona, é uma das áreas mais afetadas pelos cortes e pelo desemprego. Ali, o entusiasmo pela independência é menos palpável que nas zonas afluentes. Em lugar da bandeira "estelada" (estandarte do independentismo), onipresente nas janelas e sacadas do Centro de Barcelona, notam-se muitas bandeiras da Espanha.

"Há coisas bem mais importantes com que se preocupar, como o desemprego. Precisamos trabalhar, precisamos ajudar quem está em dificuldade antes de pensar em independência", disse Mercedes Malla, 55, que trabalha como faxineira.

As opiniões estão divididas. Muitos catalães acreditam que o caminho para melhorar a situação econômica é separar-se da Espanha. A taxa de desemprego na Catalunha é de 19%, abaixo do índice nacional, que é de 22%.

Os independentistas alegam que a Catalunha paga mais em impostos ao governo central do que recebe de volta em serviços e investimentos. "Não queremos mais ter essa sensação de estarmos sendo utilizados, explorados. Estou convencido de que haverá uma melhora da atividade econômica e do mercado de trabalho se sairmos da Espanha", disse o estudante Victor Agoiz, 28.

"Se a independência ganhar, vamos ter mais ferrovias, mais rodovias, mais autonomia para decidir nossos gastos", disse o aposentado Bartolomeu Pausas, 79, ao votar no Colégio Cervantes, no Bairro Gótico, no centro histórico de Barcelona.

No mesmo local, a cubana naturalizada espanhola Lenia Perez, 48, votou contra a independência, incomodada com o ambiente nacionalista e a proliferação de bandeiras. "Já vi essa obsessão com a bandeira em Cuba, e não gostei. Não advogo por bandeiras, mas por valores", disse Perez, que trabalha com design gráfico.

Datas históricas

Estas são as principais datas da história da Catalunha, região do noroeste da Espanha que realiza suas eleições legislativas neste domingo, apresentadas pelo governo regional e seus aliados como um plebiscito para iniciar seu caminho rumo à independência.

1479: os reis católicos Fernando e Isabel estreitam a união entre as coroas de Castela e Aragão, da qual a Catalunha dependia, firmando os pilares da coroa espanhola.

11 de setembro de 1714: durante a guerra de sucessão pelo trono da Espanha entre o duque francês Philippe d'Anjou e Carlos da Áustria, Barcelona sucumbe após um longo cerco às tropas franco-espanholas e a Catalunha perde suas instituições de autogoverno. A data, hoje em dia, marca a festa nacional da Catalunha.

Abril de 1931: com a proclamação da Segunda República Espanhola (1931-1939), a Catalunha recupera suas instituições de governo, aprova um Estatuto de autonomia (1932) e o idioma catalão ganha status oficial ao lado do castelhano.

24 de janeiro de 1939: as tropas do general Francisco Franco tomam Barcelona após dois anos e meio de guerra civil. As instituições catalãs são suprimidas e é proibido o uso público do catalão até 1975, data da morte do ditador.

Setembro e outubro de 1977: restabelecimento provisional do governo regional e retorno do presidente catalão em exílio durante a transição para a democracia.

6 de dezembro de 1978: referendo para ratificar a Constituição espanhola, que se fundamenta "na indissolúvel unidade da Nação Espanhola" e "reconhece e garante o direito à economia das nacionalidades e regiões que a integram". Na Catalunha, o apoio foi de 90%.

25 de outubro de 1979: os catalães aprovam em referendo seu novo estatuto de autonomia regional, que define o catalão e o castelhano como línguas oficiais. Este estatuto lhes permitiu assumir competências em educação, saúde, política linguística e cultura, e incluiu a criação de uma polícia própria.

18 de junho de 2006: os catalães aprovam em referendo um novo estatuto que amplia a autonomia da região, negociado com o governo socialista de José Luis Rodríguez Zapatero e aprovado pela justiça espanhola. O estatuto, que define a Catalunha como nação, é levado ao Tribunal Constitucional pelo Partido Popular, do conservador Mariano Rajoy.

13 de setembro de 2009: a cidade de Arenys de Munt torna-se o primeiro de centenas de municípios que organizam votações simbólicas sobre a independência da Catalunha.

28 de junho de 2010: o Tribunal Constitucional anula uma parte do estatuto catalão e deixa "sem valor jurídico" a definição da Catalunha como nação. Centenas de milhares de catalães se manifestam em Barcelona ao grito de "somos uma nação, nós decidimos".

Setembro de 2012: após uma grande manifestação independentista em Barcelona, o chefe de governo espanhol Mariano Rajoy nega-se a negociar uma maior autonomia fiscal para a Catalunha com o presidente regional Artur Mas - que convoca eleições em novembro com a promessa de realizar um referendo.

25 de novembro de 2012: Artur Mas ganha as eleições mas sem maioria absoluta. Em segundo lugar ficam os independentistas progressistas do ERC e os partidos comprometidos com um referendo superam amplamente a maioria absoluta.

9 de novembro de 2014: Cerca de 2,3 milhões de catalães votam em um referendo simbólico - declarado inconstitucional por Madri. Quase 1,9 milhões (80%) votam pela independência, embora a participação supere apenas 37% do censo.

27 de setembro de 2015: eleições regionais antecipadas convocadas por Artur Mas para convertê-las num plebiscito a favor ou contra o lançamento de um processo de separação que termine com a constituição da República Catalã em 2017.

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