Ao abordar a solidão, o espetáculo 'Ausência' foca nos gestos

Vanessa Perroni
vperroni@hojeemdia.com.br
12/05/2016 às 17:28.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:24
 (Renato Mangolin/Divulgação)

(Renato Mangolin/Divulgação)

Conhecido como um ator da palavra, Luis Melo aceitou o desafio de abdicar-se dela, mudando a sua forma de atuar, em prol de um trabalho centrado no corpo e nos gestos, força motriz do espetáculo “Ausência”, cartaz amanhã e domingo, no Sesc Palladium.

“Como não existe palavra em cena, o espetáculo depende da nossa relação com nossas ausências, pois o texto é criado no imaginário do espectador”, afirma Melo, que confessa certo receio de aceitar o papel. 

“Como é uma peça que trabalha com os gestos, pensei em um bailarino para viver essa história. Mas os diretores queriam uma pessoa em movimento”, conta o ator que, no processo de criação, teve aulas de dança, mímica e outras modalidades que trabalham o gestual.

Exigência
Ambientada em 2036, a peça traz a história do sobrevivente de uma Nova York devastada pela radioatividade, o racionamento de energia e pela escassez de água potável. A solidão do homem moderno e suas reações quando colocado em situações extremas permeiam a montagem, assinada pelos diretores André Curtie e Artur Luanda Ribeiro, da companhia franco-brasileira Dos à Deux.

Admirador confesso do trabalho da companhia, que desenvolve um “teatro gestual”, Melo salienta que, por mais que seja amante da contação de histórias (fascínio que atribui a Minas Gerais e seu Guimarães Rosa), esse tipo de abordagem exige muito do ator.

“Nos questionamos sobre a real necessidade da palavra: ou você encontra essa necessidade orgânica de dizer aquela palavra ou então ela não se faz necessária”, justifica. Mas para o gesto funcionar em cena tudo tem que estar muito bem alinhado – “Manipulação de objetos, luz, sons, trilha sonora, tudo é de extrema importância e trabalha junto”. 

Solidão
O ator curitibano enfatiza que o tema da solidão é pulsante em nossa sociedade, mesmo com tanta tecnologia para aproximar as pessoas. “Nesse momento a tecnologia promove a comunicação, mas não os encontros. E isso causa um esgotamento. As pessoas não estão sabendo se relacionar e o sentimento de solidão e abandono fica mais evidente”, analisa.

Na trama de “Ausência”, seu personagem vive em estado de penúria, com medo de sair de casa. Os alimentos acabam, depois a água, e então chega ao grande ponto de tensão da peça. A única água que resta é a de um aquário, onde vive um peixe de estimação, o único ser vivo que o acompanha em suas ausências. Ele precisa decidir se mata o peixe ou sua sede e garante a sobrevivência. 

VOYEURISMO
“Essa é uma forma de levar o público a questionar sua solidão e desvendar sua capacidade de ação em circunstâncias extremas”, comenta Melo. A ausência de palavras cria uma relação de ‘voyeurismo’ com a plateia. “É como assistir, da sua janela, os apartamentos vizinhos. Ao observar um vizinho, com todas as suas ações, podemos montar uma história”, compara.

Serviço:

“Ausência” – No Sesc Palladium (rua Rio de Janeiro, 1046, Centro). Sábado, às 20h, e domingo, às 19h. Ingresso: R$ 30 e R$ 15 (meia)

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