Festa Literária Internacional de Paraty festeja Graciliano Ramos

Leida Reis - Hoje em Dia
05/07/2013 às 10:11.
Atualizado em 20/11/2021 às 19:47

PARATY (RJ) – A cidade histórica de Paraty se deixa contaminar pelas personagens sofridas e os cenários de devastação existencial do alagoano Graciliano Ramos (1892-1953), homenageado da 11ª Festa Literária Internacional da cidade, a Flip. Na abertura do evento, o amazonense Milton Hatoum visitou obras célebres para desferir a maestria do escritor. Citando semelhanças com Eça de Queiroz, Machado de Assis e Flaubert, Hatoum evocou a originalidade de Graciliano e o desprezo à linguagem formal, estabelecendo relação entre a dura realidade e o imaginário.

Hatoum, um estudioso de Graciliano, também mostrou o quanto é atual a crítica aos políticos. Tanto que a Flip incluiu mesas para discutir as recentes manifestações no país.

Num evento que se propõe a realizar, segundo o seu curador, Miguel Conde, "um esforço redobrado de pensamento sobre o momento político", a trajetória e a obra do autor de "Vidas Secas" (1938) permitiram a Hatoum aludir, indiretamente, aos manifestos pelo país. "Graciliano teve plena consciência das contradições do país e viu nelas um impasse. E uma das causas seria a ausência ou inconsistência da educação", disse, referindo-se ao uso da palavra pelo alagoano como uma "arma de explicação sutil".

Hatoum mesclou trechos de obras como "São Bernardo"(1934), "Angústia" (1936) e "Memórias do Cárcere" (1953), com interpretações próprias e de críticos como Antonio Candido e Otto Maria Carpeaux.

A isso costurou detalhes da trajetória pessoal e profissional de Graciliano, que, nos anos 20 e 30, foi prefeito de Palmeira dos Índios (AL) e diretor da Instrução Pública de Alagoas, cargo equivalente ao de um atual secretário da Educação. Hatoum lembrou os célebres relatórios de prestação de contas que renderiam, ao autor, o convite para publicar o primeiro romance, "Caetés" (1933).

"Nesses textos já aparecem os assuntos de Vidas Secas’, São Bernardo’ e Infância’, e a crítica ferina, o tom desabusado e as frases breves de seu estilo literário".
Já Conde lembrou que "Graciliano devolveria com olhos meio desconfiados o olhar de admiração" que o público leitor lança sobre ele. "Era avesso a eventos solenes e desconfiava da mistificação da figura do escritor, especialmente numa sociedade como a nossa, em que a cultura letrada muitas vezes serve de signo de demarcação das diferenças sociais".

Efeméride

E Graciliano teria motivos de sobra para "desconfiar" de Paraty por estes dias. A figura da cadela Baleia ("Vidas Secas") ilustra o painel da Tenda dos Autores e a Casa da Cultura abriga a exposição "Graciliano Ramos, a Ética da Escrita".

Neto do autor, Ricardo Ramos, participou, na casa ocupada pelo Sesc Literatura, do lançamento da nova edição de "Caetés" (Record). Segundo ele, o avô, conhecido pelo pessimismo e pela autoironia, dizia que o romance não era tão bom assim, "mas tinha um ótimo prefácio" – referência ao texto de Antonio Candido para a terceira edição.

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