(Rafael Freire/Divulgação)
Não é preciso ser familiarizado com o universo funk para reconhecer os passinhos – como são chamadas as várias maneiras de se dançar o estilo país afora. Na web, pipocam vídeos que quase sempre tornam-se virais, com grupos de jovens se movendo de forma sincronizada ao som de hits, incluindo rock. Muitos viram memes.
Mas, por mais que o caráter viral das imagens faça parecer que o passinho é só um passatempo adolescente, a dança é levada a sério. Tanto que existem estilos diferentes e vários representantes para cada um deles, além de grupos e dançarinos profissionais encarregados de divulgá-los. Mas dentro dessa vasta seara de passinhos, o fenômeno mais recente da internet vem de Minas: é o Passinho de BH.
Apesar de já ser conhecido nos movimentos dos frequentadores de bailes funk da capital, o passinho com jeito mineiro ganhou notoriedade nos últimos meses, quando vídeos da dança começaram a viralizar.
Um dos responsáveis por esse impulso é Mike Gabriel Severino, de 23 anos, o MC Zilu. Funkeiro em Belo Horizonte, criou no Facebook uma página dedicada exclusivamente a vídeos de pessoas dançando o passinho da capital. Já são 6 mil curtidas.
“Sempre vi páginas de outros tipos de passinho, aí decidi criar algo para representar BH”, conta.
No Instagram também é possível encontrar vários perfis dedicados à coreografia mineira. A maior tem quase 190 mil seguidores.
Jeitinho
Mas o que está por trás da força do estilo de BH? Para MC Zilu, principalmente a possibilidade de se dançar tanto sozinho quanto junto.
O dançarino e funkeiro Johnathan Gomes tem outro palpite. Membro e um dos idealizadores do grupo mineiro Passistas Dancy, ele diz que o Passinho de BH lembra muito o Miami, outro estilo da dança. “Mas é mais tranquilo e suave, com mais molejo no corpo”, compara.
Para Welleton Carlos, integrante de um dos grupos de maior visibilidade da capital, o Favelinha Dance, o passinho mineiro também tem como característica a liberdade e a variedade de movimentos que abarca. “Cada dia você aprende uma coisa nova e pode fazer do seu jeito”.
Cenário
Embora tenha um passinho particular, BH abre espaço também para outros passinhos, que arrebatam a turma em apresentações, oficinas e batalhas de funk.
Os Passistas Dancy são um exemplo disso, já que são representantes “batizados” pelos próprios cariocas como representantes do Passinho Foda, em Belo Horizonte.Danilo Dilva/Divulgação
Os Passistas Dancy foi formado no Aglomerado da Serra
Manifestação cultural transforma membros da comunidade
“Tanto o passinho quanto o funk mudaram a minha vida e a de muitos meninos que dançam comigo”, diz Jonhathan Gomes, que além de se apresentar com o Passistas Dancy também dá aulas de dança em espaços da capital mineira.
Mas é principalmente ao trabalho com o grupo que ele credita várias oportunidades que teve. “Foi por meio do passinho e do funk que conseguimos viajar, conhecer vários lugares”, conta.
Essa possibilidade de abrir portas faz o funk ganhar espaço nas quebradas. “Para a galera da comunidade, é algo muito importante também, porque com o funk você pode se tornar um dançarino, um MC, um DJ. Consegue ganhar uma grana com o trabalho e, com isso, pode incentivar um menino a correr atrás daquilo que quer”.
Mas o funk também traz desafios. “Acabamos virando uma referência para vários jovens. Então temos que tomar cuidado com certos comportamentos, com o que vamos falar e como vamos agir”, afirma.
A visão estereotipada, que associa o funk muitas vezes à criminalidade, é outro obstáculo – mas que, para Jonhathan, tem sido superado com o tempo.
“O funk está sendo bem aceito dentro da sociedade. Há ainda quem critique, queira criminalizar, mas graças a Deus estamos conquistando nosso reconhecimento a cada dia mais”, destaca. Doug Filmes/Divulgação
MC Zilu é um dos responsáveis por impulsionar coreografia no Instagram e no Facebook
Reconhecimento
Embora as várias manifestações do universo do funk conquistem novos espaços – foi com o passinho, por exemplo, que o grupo Favelinha Dance, do Aglomerado da Serra, se apresentou no MECAInhotim em 2017 e, recentemente, abriu o show da banda Liniker e os Caramelows, em BH – existe ainda uma luta por reconhecimento, respeito e legitimação do movimento.
“O passinho, o funk e os bailes são o que a quebrada tem de cultural. Muitas vezes a polícia chega com truculência e não consegue entender isso, sabe? Existe ainda uma barreira muito grande entre a periferia e o asfalto”, diz Welleton Carlos, do Favelinha Dance.
E se como música e manifestação cultural o funk luta por reconhecimento, na dança não é diferente. Welleton conta que uma das lutas do grupo de que participa é pela inserção do Passinho de BH como uma técnica específica de dança. “Acreditamos na força da nossa luta de falar que o funk é, sim, cultura”, declara.