Cubano naturalizado sonha disputar olimpíada do rio pelo Brasil

Felippe Drummond Neto - Hoje em Dia
Hoje em Dia - Belo Horizonte
17/01/2016 às 09:29.
Atualizado em 16/11/2021 às 01:03
 (Ricardo Bastos/Hoje em Dia)

(Ricardo Bastos/Hoje em Dia)

Em dezembro passado, o ponteiro cubano Yoandy Leal obteve a naturalização brasileira. Após quatro anos jogando pelo Sada/Cruzeiro, com o qual conquistou dois títulos da Superliga, dois Mundiais de Clubes e foi eleito o MVP – o jogador mais valioso, o destaque – da última competição, em 2015, Leal conseguiu a concessão que abre a possibilidade para ele defender a seleção brasileira, inclusive na Olimpíada do Rio. Neste caso, porém, ele ainda depende de uma reunião da Federação Internacional de Vôlei (FIVB), marcada para o próximo domingo (24), quando serão discutidas as regras para convocações de estrangeiros. Pelo atual regulamento, ele precisaria aguardar dois anos para poder ser chamado. Leal conversou, com exclusividade, com o Hoje em Dia, sobre tudo que cerca essa expectativa.


Qual é o seu nível de identificação com a cultura brasileira? Há muitas diferenças entre brasileiros e cubanos?
Me sinto em casa aqui no Brasil. Me identifico com tudo aqui, porque apesar de terem algumas diferenças culturais, as pessoas e a forma como tratam a todos é muito semelhante. Aqui e lá todos têm o hábito de conversar, de tentar agradar. Além disso, não tenho problema com a comida. Também há as diferenças culturais, as pessoas aqui são mais individualistas, enquanto em Cuba, por não ter muito o que fazer, as pessoas ficam mais em grupo. Felizmente, eu posso conviver com ambas as culturas e sei me adaptar a ambas.


Em quê teve mais dificuldade no processo de adaptação ao Brasil?
O que mais senti falta foi da minha família. Vim sozinho, era tudo uma aposta pessoal, o que achei mais difícil de me acostumar. Mas eu sabia que eu tinha que chegar e fazer bem o meu trabalho para poder depois trazer a minha família, como fiz. Em compensação, desde a minha chegada, fui muito bem recebido pelo clube e isso ajudou a crescer ano após ano. Hoje tenho certeza de que todos têm a confiança em mim e minha família comigo.


Por que decidiu se naturalizar brasileiro?
Na realidade, são dois motivos que me levaram a tomar essa decisão. O primeiro é para eu voltar a jogar no mais alto nível do vôlei mundial. O segundo e mais importante é por que meu maior sonho é ser campeão olímpico, e jogando na seleção brasileira eu estaria bem perto disso.


Recebeu alguma sinalização de Bernardinho de que poderá ser convocado para a seleção?
Eu conversei com o Bernardinho há muito tempo, antes de eu ter a aprovação para me naturalizar, e ele me perguntou se eu queria jogar pela seleção. Na época, eu falei que se tudo desse certo este seria meu maior desejo. Até agora essa foi a única conversa que tive com ele. Depois que saiu a minha naturalização, não conversei com ele, mas sei que ele está atento a todos os acontecimentos e sou um jogador a mais que ele pode convocar para montar a melhor seleção brasileira possível.


Quando você estava no processo para deixar Cuba, já pensava em se naturalizar por outro pais?
Não pensava. Nunca havia passado pela minha cabeça isso. Meu plano era vir para o Brasil para jogar e ajudar minha família. Só que tudo mudou há um ano, quando fiquei sabendo que havia a possibilidade de eu me naturalizar e jogar uma Olimpíada pelo Brasil. Conversei com meu agente se havia uma possibilidade real disso acontecer, ele conversou com o Bernardinho, que gostou da ideia, e a partir dali dei entrada nos papeis.


Juan Torena, você e Leon se naturalizaram. Como os cubanos e a sua família veem isso?
Minha família me apoiou, mas não tenho informações de como foi a aceitação em Cuba, mas com certeza deve haver uma conversa para mudarem essa polícia que envolve os atletas cubanos. Pois quem mais está perdendo são eles, que veem seus principais jogadores tendo que se naturalizar em outros países, sendo que poderiam estar todos jogando por Cuba, mesmo jogando fora. Tem algo errado aí, já que isso impede os atletas de seguir seus sonhos.


Como você vê isso, já que era para todos estarem juntos na seleção cubana?
Como falei anteriormente, algo está errado. Era para Cuba ter uma das seleções mais fortes do mundo. Não sei qual é o objetivo dessa lei que não deixa os atletas saírem do país, e mesmo os que saem, não podem mais atuar pela seleção. Cuba está classificada para a Olimpíada, torço para que faça uma boa competição, mas é difícil isso acontecer, já que lá enfrentará os melhores jogadores do mundo.


Como está a expectativa para a reunião que pode liberar ou não uma eventual convocação sua para a seleção brasileira?
Tudo será decidido no próximo dia 24, quando a FIVB terá essa reunião e vai estudar dois casos, o meu e o do León, que se naturalizou Polonês. Lá decidirão se podemos ser convocados assim como aconteceu com o Juantorena na seleção italiana. Não vejo nada que impeça isso, afinal já estou há quase seis anos sem atuar por Cuba. Mas como são eles que decidem, só me resta esperar o sim.


Como os cubanos acompanham essa abertura de Cuba para o mercado dos Estados Unidos?
Para mim, que estou fora e vejo a situação de longe, acho que essa abertura será muito boa para meu país. Mas, ainda tem que fazer muitas outras coisas para melhorar Cuba. Esse bloqueio durou quase 60 anos, então não é uma mudança que acontece rapidamente. Fui agora no Natal para Cuba e a situação está pior que um ano atrás. Apesar do bloqueio ter caído, para melhorar a relação demanda tempo, uns cinco anos pelo menos.


Como cubano, qual é a dica de roteiro que daria aos turistas brasileiros em Cuba?
Todo mundo fala em Havana, pois é uma cidade muito bonita, que tem prédios muito velhos e uma beleza única. Além disso, a parte histórica é muito rica, já que é uma cidade que resistiu à Segunda Guerra Mundial e carrega toda a história do país. Existem dois tipos de turistas que vão à Cuba, os que querem passear, e os que querem conhecer a história. Aos que querem passear eu recomendo ir à Varadero, que tem muitas praias maravilhosas para conhecer.


William, Wallace, Éder e Isac, seus colegas de Cruzeiro, conhecem bem a seleção brasileira. Você conversa com eles sobre como é o clima da equipe de Bernardinho?
Desde que iniciei o processo de naturalização eu converso com eles sobre a seleção, como funciona e como é a relação entre os jogadores. Mas creio que não haverá nenhum problema pra mim com eles. Também já tive a oportunidade de conversar com jogadores de outros times e todos falam superbem de tudo. Do meu lado, tento sempre mostrar que se eu realmente for chamado, eles podem confiar em mim que farei o meu melhor trabalho para ajudar o Brasil a ser campeão, que este é o meu maior sonho.


Por ser um estrangeiro naturalizado você teme sofrer alguma rejeição entre os brasileiros?
Temo muito. O Brasil nunca teve um estrangeiro na seleção, e eu posso ser o primeiro. Além disso, sou cubano, e Brasil e Cuba sempre tiveram uma grande rivalidade no vôlei, mas tenho que encarar de forma profissional; eu vou lá para ajudar todos, não quero tomar o lugar de ninguém, só quero realizar um sonho em comum com o deles, que é ser campeão olímpico.


Quais os principais favoritos ao ouro olímpico?
Vendo de fora todas as competições envolvendo seleções, coloco cinco seleções como as favoritas: Itália, França, Rússia, Estados Unidos e o Brasil, que sempre é favorito, ainda mais jogando em casa.

 

Você já conquistou dois mundiais com o Sada Cruzeiro. O que ainda falta na carreira do Leal?
Olimpíada. Quando eu estava na seleção de Cuba, este era meu grande sonho. Brigamos muito para conseguir uma vaga em Pequim-2008, mas não conseguimos. Depois fui embora de meu país em 2010, com isso minha possibilidade de conquistar um ouro olímpico sumiu, e só agora pude voltar a sonhar com isso, com a minha naturalização. Minha parte para ir em busca deste sonho eu estou fazendo, e se Deus quiser eu vou conseguir uma vaga na seleção brasileira para tentar o título.


Mais um ano que o Cruzeiro tem a possibilidade de conquistar todos os títulos. A que se deve o sucesso desse time?
A união deste time é algo difícil de se encontrar. Desde o meu primeiro ano aqui o time mudou muito pouco. Todos os jogadores se conhecem muito bem dentro e fora de quadra, e isso aparece quando estamos jogando. Somos uma família. Além disso, todos os jogadores têm o mesmo pensamento de querer ganhar tudo que disputamos.

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