Há quase 70 anos é assim: véspera de Copa do Mundo e medo de não contar com estrela

Rodrigo Gini
Hoje em Dia - Belo Horizonte
01/03/2018 às 16:32.
Atualizado em 03/11/2021 às 01:39
 (Colagem com fotos de CBF, EBC, Red Bull e arquivo Hoje em Dia)

(Colagem com fotos de CBF, EBC, Red Bull e arquivo Hoje em Dia)

Viver a ansiedade e o temor de não contar com um jogador decisivo meses antes de uma Copa do Mundo, como ocorre agora com Neymar – o camisa 10 do PSG é esperado amanhã em Belo Horizonte para operar o quinto metatarso do pé direito –, é algo que se tornou frequente na história da Seleção Brasileira, desde antes da campanha que valeu o primeiro título, em 1958, na Suécia. Nesse período, houve tanto histórias com finais felizes quanto casos em que a ausência acabou pesando diretamente no resultado. Felizmente, em quase sete décadas, a evolução na medicina esportiva ajudou a abreviar os prazos e a desenvolver técnicas que garantem o efeito esperado.

O primeiro grande susto veio às vésperas da Copa de 1950, quando o mestre Zizinho sofreu uma forte pancada no joelho durante um treino para o Mundial. Apesar da incerteza sobre a recuperação, o técnico Flávio Costa resolveu mantê-lo na relação de inscritos. Sem condições de atuar nas duas primeiras partidas, ele foi considerado fundamental para encarar a Iugoslávia, quando a Seleção definiria sua classificação para o quadrangular final. Como revelou mais tarde em livro, o genial atacante de Flamengo, Bangu e São Paulo precisou de uma ajuda curiosa para entrar em campo. Os médicos da CBD aplicaram uma pomada usada para a recuperação de cavalos de corrida, o que acabou surtindo efeito mas, segundo o saudoso jogador, "queimava a perna absurdamente".

Oito anos depois, foi a vez daquele que via em Zizinho sua grande inspiração e acabaria se tornando o atleta do século 20. Pelé era um promissor atacante no Santos em 1958 mas, no no último amistoso de preparação antes do embarque, sofreu uma lesão no joelho direito. Por precaução, foi mantido no banco por Vicente Feola na vitória sobre a Áustria (3 a 0) e no 0 a 0 com a Inglaterra. Quando enfim teve a chance de entrar, contra a União Soviética, não precisou de muito para encantar o mundo e se transformar no grande personagem da conquista inédita, ao lado de Garrincha. O mineiro de Três Corações não teria a mesma sorte em 1962, ao sofrer um estiramento que o tirou do time na segunda partida da Copa do Chile, contra a Tchecoeslováquia.

E a lendária geração do tri poderia ter ficado sem um de seus grandes nomes devido a um lance inusitado. Tostão foi atingido no olho por uma bolada do zagueiro Ditão, do Corinthians, e sofreu o descolamento da retina do olho esquerdo, na época, um problema grave e solução difícil. Temendo um adeus prematuro dos gramados, o atacante aceitou passar por uma então revolucionária cirurgia desenvolvida pelo oftalmologista brasileiro Roberto Abdala Moura, que clinicava nos Estados Unidos. Recuperado, foi convocado por João Saldanha, mantido por Zagallo, brilhou no México e acabou se despedindo do futebol três anos depois, quando uma inflamação no olho operado trouxe de volta o risco de cegueira.

Outro mineiro de pé calibrado e sinônimo de gols não teve a mesma sorte. Reinaldo vivia seu auge com a camisa do Atlético às vésperas do Mundial da Argentina'1978 mas, sem os meniscos dos dois joelhos, teve a preparação dificultada, lutou contra a dor constante e, nos gramados do país vizinho, acabou não sendo decisivo como se esperava. O problema também pesou quatro anos depois, quando outro atacante acabou cortado por uma distensão: Careca, que apareceu com o Guarani campeão brasileiro de 78 sob o comando de Carlos Alberto Silva.

Coincidência
O Mundial voltou a ser disputado em gramados mexicanos em 1986 e, se aquela geração não era tão brilhante quanto a de quatro anos antes, ainda assim tinha ambição legítima pelo tetra. Só que um de seus destaques vivia um drama que começou na temporada anterior. Atingido com violência pelo zagueiro Márcio Nunes, do Bangu, numa partida do Campeonato Carioca, Zico iniciava um calvário de cirurgias: foram três, as duas últimas feitas em Belo Horizonte por Neylor Lasmar, pai de Rodrigo, que cuidará de Neymar.

Diante do risco inicial de deixar o futebol, as intervenções foram bem sucedidas, mas o longo período de recuperação e fisioterapia fez com que o Galinho chegasse à Copa longe da condição ideal. Na primeira fase e nas oitavas, chegou a entrar no decorrer das partidas, mas não aguentaria os 90 minutos. Diante da França, nas quartas de final, ganhou nova chance de Telê Santana mas, ainda frio, acabou perdendo um pênalti no tempo normal – na disputa das penalidades, o Brasil acabaria eliminado.

O cenário se repetiria às vésperas de outro Mundial e outra doída derrota para os franceses. Em 1998, Romário já havia retornado da Europa e, mesmo com o Flamengo vivendo momento apagado, era  escolha obrigatória para formar a dupla de ataque com Ronaldo Fenômeno. Um estiramento na panturrilha, no entanto, na reta final dos treinos da Seleção levou Zagallo a cortá-lo, embora o "Baixinho" garantisse que se recuperaria a tempo. O treinador não arriscou, e o atacante confirmou o que prometia ao atuar em um amistoso do rubro-negro durante a Copa. O desfecho da goleada comandada por Zinedine Zidane numa final que não contou com Ronaldo poderia ter sido outro, ainda que, também no futebol, o "se" não entre em campo.

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