Marcelo Oliveira fala de Cruzeiro, Palmeiras, carreira e aposentadoria

Henrique André e Felippe Drummond Neto - Hoje em Dia
Hoje em Dia - Belo Horizonte
12/07/2015 às 09:54.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:52
 (Washington Alves)

(Washington Alves)

Da demissão no Cruzeiro, no início de junho, à admissão no Palmeiras, foram apenas duas semanas de descanso na vida do técnico Marcelo Oliveira. Bicampeão brasileiro pela Raposa nas temporadas 2013/14, o belo-horizontino, de 60 anos, tenta igualar, agora, a marca de Rubens Minelli (1975 a 77) e Muricy Ramalho (2006 a 08), que levantaram o caneco por três temporadas consecutivas. Em entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, Marcelo conta como encara o dia a dia da maior cidade do país, minimiza as aparentes divergências que teve com o presidente do Cruzeiro, Gilvan de Pinho, e diz porque sacou Dagoberto do time. Além disso, o técnico lamenta os 11 jogos sem vencer o Atlético e revela quando pretende se aposentar.    Após quatro vitórias seguidas, a torcida do Palmeiras e a mídia paulista estão em lua de mel com você. Como se sente com a badalação?    É gratificante ver um trabalho que começou há tão pouco tempo já estar convivendo com vitórias. Isso fortalece e estimula o grupo de jogadores e acaba levando a torcida junto. Em termos de produção, a gente sabe que há muita coisa a melhorar.   Você herdou um Palmeiras instável quanto aos resultados. Essa sequência é fruto da motivação natural pela troca de comando ou o seu toque tático já está surtindo efeito?    Sempre a chegada de um novo técnico gera uma esperança de um jogador que não está jogando, e muda-se o discurso. A parte tática também. Temos um jeito nosso de jogar. Isso fica mais acentuado quando você faz quatro jogos e não leva nenhum gol. As duas coisas estão funcionando.   O Palmeiras é um dos favoritos ao título nacional? Quais são os outros?    Não tem nenhum favorito absoluto. O Palmeiras, pela sua tradição, estrutura e elenco, é um candidato. Junto com Atlético, Grêmio, Cruzeiro – creio que vá crescer também –, Corinthians e São Paulo, que são equipes que estão sempre no pelotão de frente.   Você faz o estilo mineirinho. Como tem sido viver em São Paulo pela primeira vez? Já está adaptado ou ainda há algum estranhamento?   Vim várias vezes como atleta e técnico, mas é bem diferente. Não conhecia São Paulo e tinha aquela imagem de cidade grande, de trânsito muito difícil. Só que optei por morar perto da Academia (Centro de Treinamento do Palmeiras) e o deslocamento é tranquilo. Estou morando num bairro (Higienó-polis) que é muito tranquilo. Faço uma caminhada todos dias numa praça e estou achando muito bacana a opção de lazer e restaurantes. Mas a maioria do tempo estou envolvido com o dia a dia do clube. Estou morando sozinho num hotel. Minha esposa ficou em BH.   Qual é o segredo para ter regularidade nos pontos corridos? Como conseguiu fazer o Cruzeiro ficar mais de 40 rodadas na liderança do Brasileirão nas duas últimas temporadas?    Não tem nada garantido. Temos uma idéia e uma parte teórica que seguimos. Mas futebol é imprevisível e você pode perder um jogo fácil. Temos que aproveitar a torcida e fazer valer o fator casa, além de criar estratégias para buscar pontos fora. Penso que no Campeonato Brasileiro você precisa ganhar as duas partidas daqueles que não vão brigar pelo título e fazer seis ou quatro pontos contra os concorrentes diretos. Assim, com certeza estará na parte de cima da tabela.   Você voltou a trabalhar com Alexandre Mattos, diretor com o qual trabalhou no Cruzeiro. Fale um pouco sobre esta sintonia entre vocês e como isso funciona para o clube e o time.   No Cruzeiro, tínhamos uma interação muito bacana. No dia a dia, havia a conversa sobre ajustes de trabalho. Trocamos ideias. Acho que ele é um diretor jovem e muito dinâmico, que está muito atento às coisas do clube e do time. Acho que esta relação saudável vai nos ajudar a buscar os resultados que a gente procura.   Acredita que treinador tenha prazo de validade em clube? Gilvan, certa vez, afirmou acreditar nesta teoria.    É uma cultura que eu até pensei que pudesse mudar aí no Cruzeiro, mas quando existe na ideia do próprio presidente, fica ainda mais difícil. No Brasil, mandam os resultados. Podem achar que meu trabalho é muito bom, mas se eu não gerar um resultado, certamente acontecerá uma pressão para trocar o técnico, que é uma situação mais simples. Às vezes, é até uma transferência de responsabilidades. Descobri neste tempo que o jogador brasileiro precisa ser muito mobilizado. Ele fica muito disperso por pouca coisa. Se ganha um jogo, o atleta tende a acomodar e relaxar. É preciso estar sempre conscientizando os atletas da importância de entrar mais forte. Quando o treinador fica muito tempo no comando, acaba que o discurso fica esvaziado. Você não tem mais tantos argumentos quando vem uma fase ruim. Então, é um pouco da cultura misturada com nossos jogadores.   Você foi demitido do Cruzeiro, mas, desde a saída, pouca coisa mudou no clube. É a comprovação de que o problema não era o comando técnico?    Eu não gostaria de avaliar isso. Eu naturalmente estava no Cruzeiro pensando em cumprir o contrato, mas não foi possível. Entendo que foi uma opção profissional, mas torço para que o Cruzeiro retome seu caminho. Hoje tem um técnico muito experiente e acho que vai seguir um caminho natural, buscando subir na tabela.   Era nítido o desgaste de sua relação com Gilvan, inclusive com declarações desencontradas e troca de farpas, publicamente. Por que a relação chegou a esse ponto?    Acho que fui mal entendido em algum momento. Ficamos dois anos aí muito tranquilos, sem nenhum problema no Cruzeiro. Nunca tive nenhum problema com a diretoria e nem com jogadores. Até brincava com a imprensa que não havia notícia negativa para dar Ibope. Foi uma vez que eu coloquei que estávamos com muitos atacantes e laterais, mas com poucos meias. Talvez ele tenha interpretado de outra forma, já que falei publicamente, e tenha respondido também, através da imprensa. Mas nunca tivemos problemas. Nossa relação sempre foi muito boa e gerou bons frutos para o Cruzeiro.   O que realmente aconteceu entre você e o Dagoberto? É um jogador difícil de lidar?    Pelo contrário. Criaram isso. Nunca tive problemas com o Dagoberto. Ele apenas fugia, às vezes, da nossa forma de jogar. Gosto que o atacante de lado acompanhe o lateral, mas ele não tinha este hábito. O problema era mais tático do que pessoal e disciplinar. Da forma que ele queria atuar não servia pra mim, embora fosse muito técnico.   Ficar 11 clássicos sem derrotar o Atlético foi o seu maior pesadelo no Cruzeiro? Você acha que este tabu contou para que você fosse demitido uma semana antes do duelo contra o rival no Brasileiro?    Não sei se contou. Ninguém gostaria de ganhar mais o clássico do que eu. Vibrava muito nas nossas vitórias e sofria muito quando não acontecia. Apesar de ser um número elevado, dois deles nos deram um campeonato mineiro invicto, outros nós jogamos melhor e, por infelicidade, não vencemos, e eu lamento que isso tenha acontecido. Gostaria que tivesse sido muito diferente.   O futebol brasileiro e a Seleção vivem uma crise que talvez seja a maior da história. Você aceitaria dirigi-la se te ligassem hoje?    Não sei te responder isso. Difícil falar. Só acho que o técnico da Seleção tem muita dificuldade de realizar seu trabalho. É muito difícil formar um time sem estar treinando, sem criar uma empatia entre comissão e atletas. Vejo que Dunga e qualquer outro têm muita dificuldade. Cada jogador atua em um canto, por isso, cada um vem com uma situação física diferente. É difícil montar time assim, sem tempo de trabalho e dia a dia. Por isso, neste momento, eu não iria.   Marcelo Oliveira é um “novo treinador” que já chegou aos 60 anos. Quanto tempo mais você espera trabalhar? Gostaria de ter tido este reconhecimento e essas oportunidades há mais tempo?    Foi uma opção própria. Quando parei de jogar, fui convidado para ser treinador, mas não quis naquele momento. Quando voltei, me sentia uma pessoa mais feliz e realizada. Não é só um trabalho. Sou apaixonado pelo o que faço. Espero trabalhar mais uns cinco anos. Acho que com 65 anos seria um tempo legal para continuar trabalhar em alto nível.   “Acho que fui mal entendido em algum momento. Nunca tive nenhum problema com a diretoria (do Cruzeiro) e nem com jogadores. Até brincava com a imprensa que não havia notícia negativa para dar Ibope. Minha relação com o presidente Gilvan sempre foi muito boa e gerou bons frutos para o clube”    “Descobri neste tempo que o jogador brasileiro precisa ser muito mobilizado. Ele fica muito disperso por pouca coisa. Se ganha um jogo, o atleta tende a acomodar e relaxar. É preciso estar sempre conscientizando os atletas da importância de entrar mais forte”

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