Pela chapecoense, João Ricardo acredita que a bola só deveria rolar em 2017

Cristiano Martins e Henrique André
esportes@hojeemdia.com.br
04/12/2016 às 08:05.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:56

O status de “Santo” talvez seja a maior honraria (fictícia) oferecida a um goleiro. Aos 28 anos e na melhor fase da carreira, o gaúcho João Ricardo obteve o título, mesmo com o rebaixamento do América para a Segunda Divisão do Campeonato Brasileiro.

No clube desde 2014, o arqueiro se firmou como titular e, pelas grandes atuações, caiu nas graças da torcida e de todos os treinadores que passaram pelo Coelho neste período. O caneco do Estadual, conquistado no primeiro semestre, coroou esta relação entre goleiro e instituição.

Com vínculo até 2018, João Ricardo se diz apaixonado por Belo Horizonte e pelo América. Defender o clube, segundo ele, era meta desde que o enfrentou na capital mineira, em 17 setembro de 2013, quando ainda atuava pelo Icasa-CE.

Em entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, o camisa 1 fala sobre a carreira, comenta a tragédia que dizimou o time da Chapecoense no início da semana passada, faz um balanço do 2016 do América e diz se fica no clube em 2017. 

Como o grupo recebeu a notícia do desastre aéreo que vitimou todo o time da Chapecoense?
É uma fatalidade. A gente do meio do futebol, jogando contra ou junto, fica muito triste. São irmãos nossos, da nossa família. Infelizmente aconteceu, a tristeza bateu no mundo todo e será lembrada para sempre. É trágico e acho que era o momento de parar a competição, mas não sei o que a CBF pensa. Temos que erguer a cabeça e pensar para frente. É vida que segue. Muitos jogadores estão chateados e ainda conversam sobre o assunto. 

Sua esposa costuma se envolver muito no seu trabalho. Torce e sofre junto. Qual foi a reação dela ao saber do acidentecom seus companheiros de profissão?
A minha esposa sofre mais que a gente que joga. Quem me deu a notícia foi ela. Estávamos dormindo, o pai dela ligou contando e ela me repassou, bastante chateada. Ela conhecia alguns jogadores de lá. A gente se comove, ainda mais com esta informação, que tudo aconteceu por falta de combustível, que é o que mais nos deixa chateado. Eu vi ela chorar várias vezes assistindo televisão.
 Flávio Tavares/Hoje em Dia 

"Passamos por uma situação que não é a que queríamos. Por mais que você brilhe em uma partida ou seja destaque, não quer passar por isso. Eu pude ajudar da melhor maneira, dei meu máximo. Estou num patamarde tranquilidade, de um goleiro seguro e preparado para jogar", diz João Ricardo


Como estão sendo os dias após o rebaixamento matemático para a Série B? O grupo já se acostumou com a ideia?
A gente já se conformou há algum tempo. Era uma coisa inevitável pela situação. Não estávamos dando resultado, ganhamos poucas partidas. Agora, com esta situação da Chapecoense, o ânimo não é mais o mesmo. Ninguém mais quer jogar. O Brasil não quer mais ver futebol. Muitos falam que é preciso fazer uma homenagem à Chape, mas é preciso pensar se eles querem esta festa e se é o momento certo. Nem o torcedor quer mais ver futebol por enquanto. 

Você é gaúcho mas começou no futebol de Santa Catarina. Como foi esse início?
Comecei no interior de Santa Catarina, no Concórdia e depois no Brusque. Times com pouca estrutura, mas com salário em dia. Jogava o primeiro semestre e era emprestado no segundo para times menores ainda. 

Lembra de como surgiu a proposta do América? O que determinou a sua decisão na época?
Eu estava no Paraná Clube, em 2014, e insatisfeito, no banco. Não pela situação de dentro de campo, mas pelo lado financeiro. Três meses de salários atrasados. Sugiram propostas de Náutico, Paysandu e Icasa, mas surgiu a proposta do América. Eu não pensei duas vezes, pela estrutura e grandeza do clube. Lembro muito bem que em 2013, jogando a Série B pelo Icasa, eu enfrentei o América no Independência. Eu me imaginei jogando num clube assim. No outro ano tive a oportunidade de jogar aqui e, agora, de renovar por três anos.

Já se sente um mineirinho de coração?
Os caras até brincam comigo porque às vezes solto um “sô”. A convivência diária faz pegar o sotaque. Já aquele do Sul eu praticamente não falo, que é o “Báh”, o “Tchê”... (risos) 

Você se destacou mesmo no time com a defesa mais vazada. Como enxerga esta realidade e em qual patamar se colocaria atualmente no futebol brasileiro?
O clube passou por uma situação que não é a que queríamos. Por mais que você brilhe em uma partida ou seja destaque, não quer passar por isso (rebaixamento). Eu pude ajudar da melhor maneira, dei meu máximo. Sobre o patamar, não quero desmerecer alguém. Estou num patamar bom, de tranquilidade, de um goleiro seguro e preparado.

Se pudesse apontar só uma, qual seria a sua grande ambição na carreira: Seleção, um título específico que sonha ganhar ou um clube que gostaria de defender?
Também tenho o sonho de ir à Seleção, mas o maior é me firmar como goleiro de uma equipe grande, de Série A. Quero ver o América na Primeira Divisão por vários anos. Quero me consolidar e ter uma carreira muito vitoriosa, com títulos. Acabar a carreira sem seria frustrante.

Quem é o melhor goleiro brasileiro na atualidade?
Considero muito o Alisson, que está na Seleção. O Danilo, que faleceu, pois estava vivendo um momento maravilhoso desde que começou a jogar na Chapecoense.

Como foi o trabalho de Givanildo Oliveira?
O Givanildo é um cara sensacional. Onde passou, deixou uma história de títulos. Aqui não foi diferente. A todo momento estava do nosso lado

E o Sérgio Vieira?
Foi uma passagem rápida, mas se mostrou uma pessoa de caráter. Tentou implementar uma maneira nova de jogar aqui mas, talvez pelo tempo, não conseguiu. Pela passagem, não tem muito o que falar. 

E o Enderson Moreira?
Ele chegou com a equipe um pouco desorganizada. Conseguiu arrumar isso, passou confiança e tranquilidade para o grupo. É um cara de grande caráter e da melhor índole possível. Organizou a casa.

O título do Campeonato Mineiro causou uma ilusão em dirigentes e jogadores do clube? Pode ter atrapalhado no restante do ano?
Título é título e todos querem. Não enxergo desta maneira. Por mais que a gente tenha sido rebaixado, o ano não foi péssimo. Conquistamos um título mineiro que há 15 anos não era conquistado. Não houve soberba. O Internacional, com o elenco que tem, está penando. Simplesmente não andou. Foram muitas trocas de treinadores, que pode ter contribuído, e outras coisas. Mas não sei. Ficar achando culpados neste momento não é o certo. Temos que nos unir e pensar no ano que vem.

Você fica em 2017?
Não sei se o América quer me vender... (risos). Pelos bastidores, dizem que não. Me considero muito feliz aqui e quero acabar meu contrato aqui e, quem sabe, renovar por mais tempo ainda.

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