Sem clube, Renato Gaúcho diz que futebol de hoje é chato sem os polêmicos

Henrique André e Alexandre Simões - Hoje em Dia
Hoje em Dia - Belo Horizonte
04/10/2015 às 09:02.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:56
 (Divulgação / Fluminense)

(Divulgação / Fluminense)

Sem clube desde abril do ano passado, quando foi demitido do Fluminense, o técnico Renato Portaluppi, ou Renato Gaúcho, de 53 anos, aproveita o tempo livre para curtir a família e praticar futevôlei com os amigos, em Ipanema. Em entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, ele diz que está sem clube por opção, compara o futebol praticado nas décadas de 80 e 90 ao atual, relembra o que viveu com as camisas de Cruzeiro e Atlético, e critica a falta de personalidade dos jogadores de hoje.

Cruzeiro e Grêmio se enfrentam hoje à tarde, no Mineirão. São dois clubes nos quais você foi ídolo e dos quais faz parte da história. O que guarda de cada um?
Só guardo coisas boas. No Grêmio joguei praticamente sete anos, conquistando tudo, inclusive o mundial. É o clube que cresci e que me deu a oportunidade de aparecer para o futebol. Sou gremista e nunca escondi isso. O Cruzeiro é um clube de uma torcida muito grande, que eu cheguei e fui recebido de braços abertos. Para mim, foi uma lua de mel (4 meses e meio). Adorei o clube, fiz amigos, e sempre procurei retribuir o carinho em campo.

A imagem do ex-jogador Renato Gaúcho, que era polêmico, interfere no que pensam do treinador Renato Gaúcho?
São fases diferentes. Tem que ser avaliado o trabalho que tenho feito. Não me achava um jogador polêmico. Eu tinha vontade de ganhar e fui um vencedor. O que vale é o currículo do jogador.

O futebol de hoje está chato e muito politicamente correto?
Está muito chato. Não sou contra assessoria de imprensa. Só acho que hoje em dia o jogador deixa muito os assessores tomarem decisões. O torcedor gosta de ouvir o que o jogador tem para falar e não uma nota oficial. Ele tem que falar nos momentos ruins e bons. Por isso que sinto falta de um Túlio, Edmundo, Viola e Romário. Isso levava público aos estádios. Hoje não vemos esse tipo de atitude nos jogadores, e faz falta para o futebol. As provocações – no bom sentido – também eram saudáveis, e hoje não existem mais. Todo mundo sente falta.

Você trabalhou com os principais treinadores brasileiros dos anos 80 e 90. Qual deles é a maior influência para você? Nossos técnicos estão mesmo ultrapassados taticamente, como tem sido comentado?
Trabalhei com os melhores técnicos do Brasil. Ninguém é perfeito. Eu sempre procurei tirar as coisas boas de cada um deles. Fiz um resumo, segurei para mim, e não abandonei meu estilo. Você aprende com os bons e com os ruins. Falar que os treinadores estão ultrapassados está errado. Acredito que, hoje em dia, o treinador não tem tempo e sofre muito com a falta de craques. Claro que alguns têm sua culpa, mas não os vejo como ultrapassados. Se a Seleção Brasileira sofre podendo convocar os melhores, imagina os treinadores dos clubes.

Você viveu um dos períodos de maior esperança e, depois, decepção da história atleticana, que foi a chamada SeleGalo. Por que aquele time não deu certo?
Tenho um carinho grande pelo Atlético. A torcida me acolheu bem. Realmente eu não joguei 1/3 do que joguei na carreira, por problema de lesão. Nosso maior problema é que nós tínhamos muitos craques, de nome, de uma certa idade, que não estavam mais atuando como em anos anteriores. Eu estava casado. As pessoas me viram no máximo três vezes jantando fora de casa. Eu não saía em BH. Até pelo assédio e pelo momento que não era bom. Sei que tinha uma turma que gostava, mas não vou citar nomes. Até o presidente da época sabia quem aprontava. Numa reunião até pedi para o pessoal pisar no freio, mas cada um tinha sua cabeça.

A Seleção Brasileira de 1990 tinha a base que foi tetra em 1994, nos Estados Unidos. O fracasso na Itália foi mesmo fundamental para a conquista da taça quatro anos depois?
Tínhamos um baita grupo. Saímos para a Argentina, num dos maiores massacres que já vi entre as duas seleções. Tivemos várias oportunidades, mas não fizemos. A Argentina foi lá, fez, e ganhou o jogo. Em 1994, o Brasil foi campeão com um futebol medíocre. Até concordo que é melhor jogar mal e ganhar do que bem e perder. Mas não tem nada a ver uma seleção com a outra. O que vale no futebol é bola na rede.

O que você sentiu quando percebeu que estava fora da Copa do Mundo de 1986, no México, após ter cometido atos de indisciplina?
Eu fui considerado um dos melhores jogadores das Eliminatórias. Estava voando em campo. A Copa era no México, com jogos ao meio-dia, e eu voando. Se um jogador faz o mesmo que eu fiz naquela época, eu vou puni-lo, sem prejudicar o time. Se o cara pisa na bola, eu o ferro no bolso. É onde você deve ferrá-lo. Cortá-lo do time eu me prejudico também. Não vou mandar embora, porque vou precisar dele.

Você tem intenção de deixar o Brasil para trabalhar nos chamados “países emergentes”?
Sei que não vou me adaptar lá fora. Gosto do meu país, não vou deixar minha filha. Até certo ponto não preciso sofrer lá fora. Tem muita gente que pensa o contrário, e eu respeito. Já botei na minha cabeça que lá fora não trabalho. Hoje curto a família, resolvo meus problemas. Procuro curtir meus amigos, vou à praia jogar futevôlei. Faço tudo o que eu faria nas férias.

Dunga está no caminho certo na Seleção?
Cada treinador tem seu pensamento. Às vezes, o que é bom para ele não é bom para os outros. Eu deixo a avaliação com ele e com vocês da imprensa. A única crítica que faço é que não dá para analisar a Seleção por amistosos. Antes da Copa América ficamos 11 jogos invictos. Não serve para nada. Eu analiso os jogos oficiais. Somos um povo exigente que não gosta de dar tempo para nada. Lá fora, os contratos são de dois ou quatro anos, e os presidentes mantêm a palavra. Aqui só se firma se estiver ganhando.

Como você analisa os escândalos envolvendo Fifa e também a CBF?
É uma vergonha. É que nem o pessoal da política. Quem é culpado tem que ser punido, seja quem for. Tem que acabar com isso no nosso país. Em todo lugar é roubo. Tem que punir para dar exemplo. Mas no Brasil prevalece aquele ditado de que “para tudo se dá um jeitinho”. Infelizmente.

Você tem muitos amigos no futebol? Quais os principais? E inimigos?
Prefiro falar que eu não tenho inimigos. Meu único “inimigo”, por um determinado tempo, foi o Telê (Santana). Depois, fizemos as pazes. Eu sempre chego bem nos lugares.

Você está há um ano sem clube. Aceitaria assumir um time nesta fase final do Brasileirão, especialmente algum tentando fugir do rebaixamento? Porque recusou as últimas propostas?
Às vezes, há certos clubes que fazem um monte de besteira durante o campeonato e pensam que não vai acontecer nada com eles. Aí acham que quando a coisa aperta têm que chamar um otário para apagar a luz. Se esse chega e não salva, vira o culpado. Se salva, vira herói. Se o Vasco cair o culpado vai ser o Jorginho? Claro que não. Mas vai ter gente que vai culpá-lo se acontecer.

De Gaúcho para Gaúcho: durante o período morando no Rio, você e Ronaldinho chegaram a se encontrar? Sobre o que conversaram? Como avalia o iminente fim de carreira dele?
Ali faltou um pouco de vontade da parte dele e de experiência no clube para conversar com o Ronaldo, saber se realmente estava a fim de jogar e prepará-lo. Foi feito tudo às pressas. Ronaldinho não se interessou muito e o clube não teve a malandragem de pegar alguém para conversar com ele, dar carinho e deixá-lo motivado e com prazer de jogar.

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