40% dos homossexuais já foram discriminados no trabalho por conta da orientação sexual

Sara Lira - Hoje em Dia
11/05/2015 às 10:11.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:58
 (Frederico Haikal/ Hoje em Dia)

(Frederico Haikal/ Hoje em Dia)

A relação da bacharel em cinema Luisa*, com o chefe no setor de marketing da empresa que ela trabalhava, era tranquila. Até que em uma festa entre os colegas de trabalho, ela decidiu contar a todos que é lésbica. Após esse dia, a relação entre os dois mudou. “Ele não conversava comigo e era como se eu não existisse”, lembra.

A jovem de 29 anos faz parte dos 40% dos homossexuais que afirmam terem sido vítimas de discriminação no ambiente de trabalho, em virtude da orientação sexual.

O estudo 'Demitindo Preconceitos', realizado pela Santo Caos – empresa de consultoria de engajamento, contou com entrevistas de participantes de 14 estados brasileiros, incluindo Minas Gerais.

“Percebemos que o público LGBT estava desconectado com as empresas e vice-versa. Muitas até incentivam a diversidade, mas não criam um ambiente confortável para que a pessoa se assuma”, salientou o sócio-diretor de comunicação da Santo Caos, Jean Soldatelli.

Segundo ele, 40% dos entrevistados afirmaram terem sofrido preconceito direto, mas todos disseram ter passado por algum tipo de dicriminação, ainda que velada.

Se abrir para os colegas de trabalho, como fez Luisa*, não é uma coisa comum de se fazer. De acordo com a pesquisa, menos da metade (47%) se declara nesse ambiente. “Destes que se assumem, 90% dizem para um colega de mesmo nível hierárquico, 32% para o chefe e apenas 2% para o profissional de Recursos Humanos”, informou.

PRECONCEITO

Luisa* conta que não enfrentou preconceitos por parte dos colegas de trabalho, mas o chefe passou a ignorá-la cada vez mais após ela se abrir. “Eu trabalhava como editora de vídeos. Ele passou a não me dar serviço mais e quando isso acontecia, passava para o meu colega e ele me dava o recado”, lembra.

A jovem conta que havia outros homossexuais na firma, mas que eles não passavam por discriminação por não serem assumidos. “Alguns me contaram que já ouviram o chefe fazendo piadinhas de teor homofóbico. Eles só não eram alvo direto, como eu, porque não tinham se declarado”, conta.

Em 2011, após seis meses convivendo com a discriminação, ela decidiu pedir demissão. E aconselha. “Mesmo diante dessa situação, acho que a pessoa tem que se assumir mais ainda, levantar a cabeça e ser quem ela é. Se ela prefere não falar, tudo bem, mas tem que ser ela. Ela não deixou de ser quem é, principalmente profissionalmente, por causa disso”, afirma.

Atualmente a jovem trabalha como produtora de conteúdo em uma outra empresa e conta que o ambiente é outro. “Todo mundo sabe que sou lésbica, meu chefe também. Todos me respeitam e agem normalmente comigo. É outra historia”, diz.

IMPACTOS

Para o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Carlos Magno Fonseca, todos os resultados da pesquisa são o recorte de uma realidade ainda mais ampla. Segundo ele, o preconceito no ambiente de trabalho é algo cotidiano para todos LGBTs, e não pontual.

“A homofobia tem maneiras muito sutis de se manifestar porque às vezes as pessoas acham que é só por meio da violência. Receber um tratamento diferenciado, ser motivo de chacota, não ter ascensão na carreira, isso já é preconceito”, explica.

Ainda segundo a pesquisa, um em cada quatro profissionais se sentia influenciado pela orientação sexual na escolha da carreira, de modo a definir uma profissão onde eles sabem que as chances de preconceito serão menores. E o presidente da ABGLT tem exemplos claros. “É muito difícil aceitarem gays homens e travestis para trabalhar com crianças, seja em creche ou na alfabetização”, lamenta.

Fonseca ainda destaca que transexuais, por exemplo, enfrentam ainda mais barreiras para conseguirem uma colocação profissional.

“Travestis e trans às vezes nem entram no mercado de trabalho pois este espaço é hostil e muitas empresas não aceitam. Então resta apenas a prostituição. É uma profissão como qualquer outra, mas queremos ver os trans também em outros postos, sendo professores universitários, em bancos, entre outros”, salienta.

Para ele, há muito o que se fazer para que o quadro mude. “Trabalhamos na perspectiva da sensibilização para que o LGBT seja tratado com respeito”, conclui.

*Nome fictício. A jovem preferiu não se identificar.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por