A cada 3 dias, uma pichação em BH; imóveis de importantes vias estão na mira

>Raul Mariano
rmariano@hojeemdia.com.br
07/02/2017 às 19:29.
Atualizado em 15/11/2021 às 22:45

Em meio a polêmicas envolvendo o tratamento dado pela Prefeitura de São Paulo aos pichadores e grafiteiros da cidade, Belo Horizonte registrou uma ocorrência por pichação a cada três dias só em janeiro deste ano, segundo dados da Polícia Civil. Os números revelam uma realidade que, apesar da forte repressão, não tem mudado. Seja nos muros, fachadas de lojas ou prédios residenciais, os símbolos e frases de protesto feitos com spray estão presentes em quase todas as regiões da capital.

Em um breve trajeto por alguns dos principais corredores da cidade, a reportagem contabilizou centenas de locais pichados. Na avenida Amazonas, há pelo menos 261 imóveis marcados. Até mesmo em frente ao 5º Batalhão da Polícia Militar, no bairro Gameleira, região Oeste, há muros e fachadas de lojas que não foram poupados.

Na avenida Cristiano Machado há pelo menos 205 imóveis pichados. Os alvos incluem, ainda, passarelas, o interior do túnel da Lagoinha e até mesmo o muro do terreno onde está sendo construída a Catedral Cristo Rei, em frente ao Shopping Estação, no bairro Juliana, na zona Norte.

Já na avenida Antônio Carlos há pelo menos 131 pontos sujos. Além de fachadas de prédios e lojas, pontos de ônibus, placas de trânsito e os próprios muros que cercam a área militar ao redor do Aeroporto da Pampulha estão repletos de escritas com spray. Em 2016, estações do Move localizadas em frente à UFMG também foram alvo de pichação.

Dilema

O assunto divide opiniões, a começar pela legislação que separa pichação do grafite, duas manifestações consideradas “irmãs” por estudiosos do tema. Hoje, pichar um monumento ou uma edificação urbana é crime previsto pela Lei 12.408/2011, com pena de três meses a um ano de detenção e multa. A mesma norma já autoriza o grafite, “desde que consentida pelo proprietário e, quando couber, pelo locatário ou arrendatário do bem privado e, no caso de bem público, com a autorização do órgão competente”.Flávio Tavares

DESRESPEITO – Nem área militar, como na avenida Antônio Carlos, é poupada pelos pichadores

Cientista social e professora da PUC Minas, Denise Pirani explica que a pichação tem origem na pré-história e, assim como o grafite, é uma linguagem urbana típica dos grandes centros. “Para mudar a lei é preciso mudar toda uma cultura. Não é só a lei que condena, mas também a sociedade. A pichação se compara à luta das mulheres por igualdade. Portanto, quem precisa mudar é a sociedade”, avalia. 

Para o urbanista Sérgio Myssior, a pichação faz parte da “gramática urbana”, mas precisa ser coibida uma vez que é lesiva para os espaços públicos. Ele afirma que não há uma solução pronta , mas ela parte da participação da sociedade na ocupação da cidade. 

580 ocorrências referentes à pichação foram registradas em todo o Estado durante todo o ano passado

“Precisamos de investimento em políticas para melhoria da qualidade de vida. Isso inclui a sociedade mobilizada, que ajuda a fiscalizar esse tipo de questão. Quanto mais utilizados os espaços públicos forem, maior o senso de pertencimento das pessoas e menor a chance de haver alguma pichação”, destaca Myssior.

Legislação municipal intensifica cerco a infratores

O cerco aos pichadores em Belo Horizonte motivou a condução de 192 pessoas pela Polícia Civil de janeiro a novembro de 2016. Além disso, 269 ocorrências desse tipo de crime foram registradas na capital em todo o ano passado. 

No entanto, a legislação municipal que condena a pichação não é nova. A primeira norma foi sancionada em novembro de 1995, há 22 anos, na gestão do ex-prefeito Patrus Ananias. Flávio TavaresPOR TODO LADO – Túnel, passarelas e muros estão pichados em vários pontos da avenida Cristiano Machado

Segundo o documento, a pichação é definida como “o ato de inserir desenhos obscenos ou escritas ininteligíveis nos bens móveis ou imóveis previstos no caput, sem autorização do proprietário, com o objetivo de sujar, destruir ou ofender a moral e os bons costumes”. 

Em 2010, outra lei foi proposta pela Câmara Municipal de Belo Horizonte, dessa vez com o intuito de implantar uma política para conter a poluição visual provocada pela pichação no município.

O documento tem como diretrizes “recuperar e promover a qualidade visual do ambiente urbano no município por meio do combate à pichação” e, ainda, “conscientizar os cidadãos dos malefícios que a prática da pichação traz à coletividade”.

Em junho de 2016, outra lei determinou que as lojas que vendem spray identificassem o CPF de todos os compradores.

Projeto Profeta

Na semana passada, os grafites em muros e viadutos da capital mineira receberam o reconhecimento do prefeito de BH, Alexandre Kalil. O chefe do Executivo anunciou, pelas redes sociais, a criação de um projeto para incentivar essa manifestação artística. 

Entre as ações previstas, está a divulgação de um edital para selecionar artistas que irão cobrir cerca de 50 espaços da capital, além de um valor em dinheiro. A antessala do gabinete do prefeito também receberá uma pintura em grafite.

O projeto em Belo Horizonte, chamado “Profeta Gentileza”, diverge da ação do prefeito de São Paulo, João Doria, que pretende “limpar” murais pichados na capital paulista. A atitude do chefe do Executivo paulistano divide opiniões e tem gerado uma onda de manifestações contrárias.

No último dia 4, Doria disse que “todos os pichadores são bandidos” e voltou a pedir que autores de pichação se tornem “grafiteiros ou artistas”. No mesmo dia em que o prefeito fez a declaração, duas pessoas foram presas pichando o muro de uma escola local.

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