'A Força do Querer' ensina que gênero é uma coisa e sexualidade é outra

Cinthya Oliveira
cioliveira@hojeemdia.com.br
31/08/2017 às 13:07.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:21
 (Rede Globo/Estevam Avellar/Divulgação)

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Globo/Estevam Avellar/Divulgação / N/A

Globo exibiu esta semana uma forte cena em que Ivana (Carol Duarte) revela à mãe (Maria Fernanda) que possui uma identidade masculina

A personagem de Isis Valverde está longe de ser a mais comentada entre os brasileiros quando o assunto é “A Força do Querer”, novela das nove da Globo. Todo mundo tem falado mesmo é sobre Ivana, personagem de Carol Duarte que decide mudar de gênero e assumir uma identidade masculina. Todo o drama vivenciado pelos transgêneros tem sido apresentado cuidadosamente pela autora Gloria Perez.

E além de trazer um olhar inédito sobre a transexualidade para o horário nobre, a autora inova ao mostrar ao povo brasileiro que identidade de gênero e orientação sexual são coisas diferentes. Afinal, Ivana passa a se apresentar como Ivan, mas o envolvimento com Claudio permanece – tanto que ainda vai ficar ficar grávida dele no folhetim.

A psicóloga Dalcira Ferrão, conselheira do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais e militante LGBT, explica a diferença entre orientação sexual e identidade de gênero. “O primeiro se refere ao nosso desejo e afeto. Já o segundo se refere à maneira como me reconheço no mundo, que não é necessariamente da mesma forma que foi designado em meu nascimento e nem de acordo com a genitália. No caso do personagem, ele se reconhece como homem trans, mas tem desejo por outro homem, neste caso sendo um homem trans gay”, explica.

A especialista diz ainda que a transexualidade não é considerada pela Psicologia como transtorno psicológico ou algum tipo de doença mental. “O adoecimento que pode ser acarretado às pessoas trans é decorrente da não-aceitação família e social e não por serem doentes em si. O que adoece é a transfobia”.

Transição

Diogo Trade de Oliveira, de 23 anos, não assiste à novela “A Força do Querer”, mas está feliz em ver que a transexualidade está sendo tratada no horário nobre da Globo. Ele passou a adotar a identidade masculina oficialmente há três anos, mas sempre se sentiu como um menino. “Quando cresci, era uma criança andrógina, já transmitia a masculinidade desde muito cedo. Mas ninguém sabia o que estava acontecendo, não sabia como falar. Se essa novela tivesse sido feita quando eu era mais novo, o processo da mudança de gênero teria sido mais fácil para mim e para minha família”, conta.

Ele ficou satisfeito em ver que Gloria Perez tem mostrado a diferença entre orientação sexual e identidade de gênero. “Quando comecei a fazer a transição, muitas pessoas achavam que eu só poderia ficar com mulheres. Mas sou bissexual, fico com homens e mulheres. Teve gente que questionou: 'por que você vai fazer a transição se gosta de ficar com homens?' Porque a minha sexualidade não influencia sobre quem eu sou de fato”. esclarece.

Diogo estudou no TransEnem, projeto educacional que oferece aulas para transgêneros, e passou no vestibular para Antropologia na Universidade Federal de Pelotas, no Rio Grande do Sul. Ainda não fez a retificação de nome oficialmente, mas conseguiu no estado sulista uma carteira de nome social, que permite que a identidade masculina seja respeitada na instituição de ensino e em todos os lugares.   

Confira nomes de transexuais famosos que têm contribuído para a diminuição da transfobia:

Lea T – A modelo belo-horizontina, filha do jogador Toninho Cerezo, ganhou fama mundial ao participar de uma campanha da marca francesa Givenchy e estampar uma capa da revista Vogue. Em fevereiro de 2015, foi eleita pela revista americana Forbes uma das 12 mulheres que mudaram a moda italiana.

– Quando a belo-horizontina Tereza decidiu mudar o gênero, apresentou as transformações nas redes sociais e ganhou milhares de seguidores. Sua história inspirou a personagem Ivana e Tarso chegou a participar da novela “A Força do Querer”. A mudança de nome (ainda não oficial nos documentos) se deu no início deste ano.

Laerte. Isso aconteceu quando a artista chegava à casa dos 60 anos de idade, mostrando que não há idade para mudar a identidade de gênero.

– Antes de revelar-se publicamente como homossexual, Thammy chegou a posar para a revista Sexy ao lado da mãe. Aos poucos, foi assumindo a identidade masculina e passando por transformações hormonais e retirada dos seios, processo acompanhado de perto pelo público brasileiro. Trocou o gênero nos documentos, mas manteve o nome de batismo.

– A atriz trans americana conquistou sucesso mundial ao participar da série “Sense8”, da Netflix, interpretando uma personagem também trans. Na trama, a personagem Nomi é apaixonada por uma mulher e é reflexo da vida da própria criadora da série – Lana Wachowski também é uma transgênero que gosta de meninas. Ela ficou conhecida mundialmente em 1999, quando ela (ainda com o nome Larry) e o irmão, Andy (hoje Lily, também trans), criaram o filme “Matrix”.  

Colaborou Nayara Soares, sob supervisão de Cássia Eponine

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