Assembleia Legislativa discute a liberdade de expressão artística em audiência

Da Redação*
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23/10/2017 às 21:12.
Atualizado em 02/11/2021 às 23:21
 (Sarah Torres /ALMG)

(Sarah Torres /ALMG)

A Comissão de Cultura, formada em sua maioria por artistas de Belo Horizonte, defendeu a liberdade de expressão em todas as formas de manifestação cultural e artística, em audiência nesta segunda-feira (23). 

Solicitada pela deputada Marília Campos (PT) e pelo deputado Rogério Correia, ambos do PT, a audiência da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) teve como objetivo debater como se expressa essa liberdade artística.

Para Brígida Campbell Paes, artista plástica e professora da Escola de Belas Artes da UFMG, “defender a liberdade de expressão é defender a arte em geral”. Ela afirmou que a arte deve ser vista não como simples contemplação e deleite, mas como um terreno de debate. “O campo da arte é político; é o lugar da diversidade, onde várias formas de pensamento se encontram para discutir”.

“O que está em jogo é o enfraquecimento de espaços onde prevalece a autonomia e a liberdade, o que é o caso da arte”, argumentou Brígida. Em sua concepção, a arte deve ser defendida como uma conquista da sociedade, pois é exibida geralmente em lugares públicos, onde todos têm acesso às produções culturais locais e de todo o mundo.

Na opinião de Guigo Pádua, vice-presidente da Associação Curta Minas, desde os primórdios, há pessoas se arvorando o direito de dizer o que deve ou não ser visto e apreciado pela sociedade, como forma de mostrarem seu poder. “Para isso, se valem de recursos como intimidação, obscurantismo e medo”, reforçou. 

E o público, segundo ele, acaba embarcando nesses discursos, porque é formado em grande parte por pessoas que se deixam manipular ao se contentarem com respostas prontas.

Já na visão de Michele Sá, atriz do Coletivo de Teatro As Bacurinhas, o atual momento de “caça às bruxas” se mostra de modo mais evidente na perseguição a artistas que estavam à margem e que ocuparam espaços importantes na sociedade. 

“Vemos atrizes trans com competência profissional e estética inquestionável sendo perseguidas. No final, isso passa a atingir não só a nós, artistas, mas ao público, que recebe uma imagem distorcida da arte”, avaliou.

Refletindo sobre o caráter subversivo deste tipo de manifestação, a artista plástica e professora da PUC Marta  Neves disse que a arte não cooptada é trans. Por esse motivo, afirma, todas as mostras dessa modalidade vem sendo duramente atacadas no Brasil. 

Ela exemplificou com a polêmica envolvendo a peça "O evangelho segundo Jesus Rainha do céu", de Jo Clifford, em que o Messias é um transgênero. Segundo Marta, foi necessário garantir na justiça a exibição da peça em São Paulo, já que grupos conservadores tentavam impedi-la.

A professora acrescentou que Jo Clifford, uma dramaturga trans britânica, escreveu a peça pensando Jesus como um transgênero, um oprimido falando aos oprimidos. “Cometem erros aqueles que pensam que o objetivo da obra é confundir crianças ou transformá-las em gays. Não se impõe um gênero a pessoa nenhuma”, concluiu.

Autorregulamentação

Rômulo Avelar Fonseca, presidente da Fundação Municipal de Cultura defendeu a autorregulamentação como forma de dirimir conflitos envolvendo obras de arte. “Não dá para aceitar que algum iluminado venha dizer o que pode ou não ser exibido”, sentenciou. Ele ainda advertiu para o perigo de haver precipitações na regulamentação dessa matéria, sem ser consultada a classe artística, que se encontra desmobilizada.

João Batista Miguel, secretário de Estado adjunto de Cultura, também se mostrou preocupado com o que chamou de “tentativa de desconstrução das expressões artísticas”. “Muitas opiniões expostas na rede social partem de quem não assistiu a exposição e nada é mais cômico do que criticar um livro que não se leu”, disse demonstrando apoio à liberdade artística e colocando as portas da Secretaria abertas para as manifestações.

Arte ofensiva

O deputado Léo Portela (PRB) defendeu o diálogo entre as partes que se opinam sobre a exposição de Pedro Moraleida no Palácio das Artes, “Faça sua própria capela sistina”. Sobre a exposição, Leo Portela disse que, depois de visitá-la, retiraria apenas uma tela, a qual, segundo ele, seria agressiva a crianças. 

“A arte é livre, mas a liberdade não pode ser manto para a prática delituosa. A linha entre a liberdade e o crime é muito tênue. Não há estado democrático sem lei, que deve ser observada por todos, inclusive pelos artistas”, defendeu. Por fim, ele ressaltou que sua voz será sempre em defesa da criança, da sua inocência, embasada no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Em resposta, Luiz Bernardes, pai do pintor Pedro Moraleida, disse que nunca foi para portas de igrejas para criticar pedofilia e cobrança de dízimo, porque respeita essas instituições. “Não vejo pedofilia em shows, peças de teatro. Nessa exposição, o que há de diferente são coisas que divergem da cultura majoritária.

Defesa das liberdades

Ao final, a deputada Marília Campos declarou ter a sensação de que a missão não estava cumprida. “Saio com mais perguntas do que respostas, mas com algumas convicções. Temos que radicalizar a luta em defesa das liberdades artística, política e religiosa e em defesa da democracia, que prevê a convivência com as diferenças”, concluiu.

*Com ALMG

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