Atingidos pela lama apontam preocupação com o risco de novo vazamento

Ernesto Braga
eleal@hojeemdia.com.br
03/11/2016 às 18:47.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:30
 (Lucas Prates)

(Lucas Prates)

As lembranças da noite de 5 de novembro de 2015 ainda estão frescas na cabeça de Ana Maria dos Santos Coelho, de 60 anos. Na fazenda onde mora em Gesteira, na zona rural de Barra Longa, na região Central de Minas, ela ficou ilhada por 12 dias. O acesso foi interrompido pelo mar de lama que vazou da barragem de Fundão, e o telefone ficou mudo.“Três pontes foram destruídas e a movimentação era só dos helicópteros. Meu medo era de que alguém adoecesse ou surgisse alguma emergência. Eu mesma tenho problema de hipertensão”, diz Ana Maria. Um ano depois, ela teme que o problema volte a se repetir neste período chuvoso.

Segundo o marido de Ana Maria, Mário Antônio Coelho, de 68, dois hectares da fazenda foram destruídos. A área já foi recomposta pela Samarco, que plantou cana no lugar. “O que falam é que a barragem que sobrou (Germano) é muito maior do que a que se rompeu. Tomara que consigam segurar ela por lá”, destaca o fazendeiro.

Entre os moradores do distrito de Bento Rodrigues, o mais atingido pela tragédia, também há desconfiança. “Tudo pode acontecer. Por isso, todos estamos de antenas ligadas”, afirma o líder comunitário José do Nascimento de Jesus, de 70 anos, o Zezinho do Bento.

“Tomara que a Samarco consiga segurar a barragem que sobrou” (Mário Coelho, dono de fazenda atingida pela lama em Gesteira)

Contenção

O trabalho de contenção do rejeito remanescente no complexo de Germano vem sendo feito desde novembro. A meta é impedir que mais lama chegue ao rio Gualaxo do Norte e consequentemente ao do Carmo, que deságua no Doce.

O engenheiro civil Eduardo Moreira, coordenador de construção da Samarco, fez uma exposição para a imprensa do plano de estabilização das estruturas e de contenção de sedimentos. Um dos desafios apontados por ele é promover a estabilidade da barragem de Germano, a maior do complexo.

A segurança aumentou com as obras que já foram concluídas, de acordo com Moreira. Outras intervenções estão em curso. O engenheiro, contudo, admite que o “teste de fogo” será feito com as próximas chuvas.

Grande parte do rejeito que vazou da barragem de Fundão ficou retido até Bento Rodrigues. “Há muito material impregnado e de fácil carreamento. Veremos como a água da chuva chegará até o rio (Gualaxo)”.

Balanço no campo
O engenheiro de minas Marcos Cunha, líder de campo e agropecuária da Samarco, apresentou um balanço dos prejuízos causados na zona rural. Segundo ele, 241 propriedades foram afetadas de Mariana a Santa Cruz do Escalvado.

"Houve problemas em acessos e as partes baixas das fazendas foram atingidas pela lama”, disse. A Samarco distribuiu silagem para alimentação de animais e disponibilizou pasto. Agora, busca parceria para fazer estudos do solo afetado.Lucas Prates

RECUPERAÇÃO – Meta é devolver a coloração natural do rio do Carmo, que corta Barra Longa a caminho do Doce

Desafio é devolver a coloração natural ao rio do Carmo

A reconstrução da parte de Barra Longa atingida pela lama está praticamente pronta. Imóveis foram reformados ou erguidos novamente, fachadas receberam nova mão de tinta.

“Sentamos com os proprietários e definimos o que seria feito, buscando atender às mesmas características. Nosso objetivo é retomar a condição anterior ao rompimento da barragem”, destaca Cláudio Siqueira, gerente de infraestrutura da Samarco e responsável pelas obras no município.

Além da retirada de 170 mil metros cúbicos de lama da parte baixa da cidade, a pavimentação foi revitalizada. Intervenções também foram feitas na zona rural, com a recuperação de pontes e de currais que foram destruídos.

Encostas

Obras estão sendo feitas ao longo do rio do Carmo, que corta o município. Operários trabalham na contenção de encostas para evitar que rejeito impregnado nas margens caia no curso d’água. “Até dezembro, 30 mil metros de pedras estarão protegendo as margens dele”, afirma Siqueira.

A força-tarefa em Barra Longa terá o desafio de devolver a coloração natural ao rio do Carmo. “Temos três anos para garantir a turbidez ideal do rio, garantido a coloração mais adequada, conforme acordo firmado com os órgãos ambientais”, diz o representante da Samarco.Lucas Prates

NOVA SANTARÉM – Estrutura está sendo construída para conter o rejeito que caiu na barragem de água

Pacote de obras será concluído com alagamento de Bento

Uma das frentes de trabalho da Samarco para conter o rejeito de minério que vazou de Fundão, mas não chegou ao rio Gualaxo do Norte, é a construção da barragem Nova Santarém. A obra está prevista para ser finalizada no mês que vem.

"Com o rompimento de Fundão, a barragem de Santarém, que era de água, sofreu uma carga de impacto muito grande, provocando o transbordamento. A estrutura em construção, chamada de Nova Santarém, está sendo erguida num nível acima da antiga, para conter o rejeito que ficou”, explica o engenheiro civil Eduardo Moreira, coordenador de construção da mineradora.

Erosões no sistema de drenagem da antiga Santarém foram contidas, de acordo com ele. Da mesma forma, a barragem de Germano, a maior do complexo de beneficiamento de minério da Samarco, passou por intervenções de reforço estrutural. A recuperação dos diques Sela, Selinha e Tulipa também está em andamento.

As primeiras obras de contenção feitas pela empresa foram os diques S1 e S2, consideradas emergenciais por causa da chuva de janeiro deste ano. O S3, de maior estrutura, está passando por um processo de alteamento para elevar sua capacidade de retenção dos rejeitos.

O Eixo 1, que consiste na construção de quatro barreiras, comparadas a quebra-molas, para diminuir a velocidade da lama carreada pela chuva, está previsto para ficar pronto em 2017.

Debaixo d’água

A última intervenção em andamento, antes do rio Gualaxo do Norte, é a construção do dique S4, na área de Bento Rodrigues. “Há grande quantidade do rejeito que vazou armazenada entre S3 e o Gualaxo, e o S4 vai funcionar para que essa lama remanescente não caia no rio”, ressalta Moreira.

Concluído o S4, parte do que sobrou de Bento Rodrigues será alagada. Por solicitação dos ex-moradores, serão preservados o cemitério e as ruínas da igreja e demais imóveis.

Leia neste sábado (5): No dia em que a tragédia completa um ano, a ansiedade pela construção do novo Bento Rodrigues
 

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