Debandada de usuários dos planos de saúde aumenta procura pelo SUS em BH

Raul Mariano
rmariano@hojeemdia.com.br
20/03/2017 às 09:07.
Atualizado em 15/11/2021 às 13:48

À espera de atendimento para a filha na UPA do Barreiro, a operadora de caixa Carolina Soares relembra com saudade o período de dois anos em que usufruiu dos benefícios de um plano de saúde. Hoje, ela compõe o grupo dos mais de 172 mil mineiros – 55 mil só em Belo Horizonte – que, castigados pela crise econômica, foram obrigados a abrir mão da atenção médica particular em 2016, segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Com orçamento apertado, a maioria migrou para o serviço público, sobrecarregando o Sistema Único de Saúde (SUS).

Na UPA abarrotada de pessoas, o clima de insatisfação pela demora no atendimento é comum à maioria dos pacientes. A aposentada Magda Campos relata que o mais difícil é se acostumar ao desconforto e ao tempo de espera pelas consultas. Aos 70 anos, ela sente dores fortes na coluna e chega a passar até 15 dias sem caminhar, até conseguir sair novamente em busca de alívio. “Tive plano de saúde por 20 anos, mas como recebo pensão e crio um neto, não tenho mais condição de pagar”. 

A situação se repete em outras UPAs, postos de saúde e hospitais de Belo Horizonte. Médicos, enfermeiros e diversos profissionais da saúde ouvidos pela reportagem confirmam a impressão de que há cada vez mais pacientes buscando atendimento na rede pública municipal.

Para especialistas, não faltam indicativos de que esse público está migrando para o SUS e contribuindo para sobrecarregar uma demanda já reprimida. Na capital mineira, levantamentos do Conselho Municipal de Saúde evidenciam o crescimento da busca por atendimento público de 2015 para 2016. 

Nesse período, o número de consultas realizadas nas UPAs saltou de 608.988 para 654.997. Uma elevação de aproximadamente 8%, equivalente a 46 mil atendimentos a mais de um ano para o outro. 

Assistência

A assistência à saúde da família também cresceu no mesmo período em Belo Horizonte. Enquanto 3,7 milhões de visitas foram realizadas por agentes comunitários em toda capital em 2015, no ano seguinte esse número subiu para 4,8 milhões. A quantidade de equipes, no entanto, permaneceu inalterada, sendo 583 em ambos os anos.

“De modo geral, com o desemprego a demanda cresceu e continua maior do que nossa capacidade de atendimento. Nacionalmente, cerca de 4 milhões de pessoas que eram atendidas pelos planos de saúde agora são atendidas pelo SUS”, afirma o médico Bruno Abreu Gomes, presidente do Conselho Municipal de Saúde de Belo Horizonte.

“Apesar disso, há serviços (públicos) de extrema qualidade em alguns lugares. Muitas vezes, melhores do que os planos”, pondera.

Para especialistas, proposta de planos populares não satisfaz demanda real

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) reconhece o impacto da recessão econômica na migração de usuários dos planos de saúde. Para o órgão, “a situação econômico-financeira e o crescimento ou queda da empregabilidade no país têm influência direta no comportamento das empresas e dos consumidores, sendo natural a redução no número de beneficiários verificada no cenário atual”. 

Frente ao problema, a alternativa proposta pelo Ministério da Saúde para aliviar a carga de atendimentos cada vez mais pesada direcionada ao SUS foi a criação de planos de saúde populares.

Na prática, a ideia é propor mudanças na regulação para diminuir as exigências mínimas para os planos de saúde que oferecem internação. De acordo com o ministro Ricardo Barros, responsável pela pasta, a mudança vai permitir que existam “planos mais acessíveis para que mais brasileiros possam ter conforto adicional do atendimento à saúde”.

A proposta, não foi bem recebida pelas entidades representativas dos hospitais e dos profissionais de saúde. Para a presidente da Federação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos de Minas Gerais (Federassantas), Kátia Rocha, a aposta nos planos populares pode ser perigosa.

“É uma alternativa para fazer com que esse cidadão que perdeu o emprego busque um plano de qualidade inferior. Mas por que não investir diretamente em saúde pública, ao invés dos planos populares?”, questiona. 

Para o Conselho Municipal de Saúde, planos populares não atendem às reais necessidades dos cidadãos. “Na hora que o usuário precisa de um exame ou especialista mais caro, é o SUS que resolve. Atendemos com frequência pessoas que são deixadas na mão por esses planos e acabam vindo ser atendidas na rede pública. Nossa posição é de defesa do investimento no SUS”, diz o médico e presidente do Conselho, Bruno Abreu Gomes.

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