Flagrantes de transporte irregular de estudantes aumentam 425% em BH

Renato Fonseca - Hoje em Dia
30/08/2015 às 07:42.
Atualizado em 17/11/2021 às 01:33
 (Luiz Costa)

(Luiz Costa)

Alheios à fiscalização e sem o menor constrangimento, motoristas ignoram a licença obrigatória para as vans escolares, abarrotam carros de passeio com estudantes e ainda fazem propaganda dos serviços ilegais. O transporte clandestino no caminho entre a casa e a escola é traduzido em estatísticas alarmantes na capital.   Oitenta e quatro condutores de Belo Horizonte foram flagrados colocando em risco a vida de crianças e adolescentes no primeiro semestre deste ano. O número é cinco vezes maior se comparado ao mesmo período de 2014. De janeiro a junho do ano passado, 16 motoristas foram pegos sem autorização para a condução de escolares.   A infração é grave, rende cinco pontos na carteira de habilitação e multa de R$ 127,69. O salto nas ocorrências, segundo a Polícia Militar, se deve ao aumento das irregularidades por parte dos motoristas e ao reforço nas operações. Já os motoristas regulares do transporte escolar garantem que a fiscalização ainda é tímida, o que estaria contribuindo para a clandestinidade.   Conforme a BHTrans, somente micro-ônibus, vans, ônibus e Kombis podem ser regularizados para o transporte escolar em BH. Porém, não é difícil ver o transporte clandestino atuando livremente nas imediações de escolas da metrópole.   Durante quatro dias, a reportagem do Hoje em Dia acompanhou a entrada e saída de estudantes belo-horizontinos em cinco instituições de três regiões: Centro-Sul, Leste e Venda Nova.   Rapidez e ousadia   No caso dos carros pequenos, a ação é bem planejada, rápida e ousada. A maioria estaciona em ruas adjacentes às unidades de ensino para evitar contato direto com as vans credenciadas. Em alguns casos, os alunos seguem a pé em direção ao automóvel.   Na última quarta-feira, a motorista de um Doblò, já conhecida por quem transporta alunos de uma escola do Santa Tereza, aguardava seis meninos. Ela foi abordada pela reportagem, mas fechou rapidamente as portas e pisou fundo no acelerador. No mesmo dia, um Celta com cinco crianças – quatro sentadas no banco traseiro – também atuava de forma clandestina.   As vans irregulares param livremente na porta. A diferença é que elas não têm o selo azul da vistoria, fornecido pela BHTrans. Em todos os casos, o principal atrativo é o preço, capaz de seduzir as famílias. Enquanto os motoristas regulares cobram, em média, R$ 200, há clandestinos pedindo cerca de R$ 150. “A concorrência é muito desleal”, afirma a motorista Eliane Sampaio, que há seis anos atua na região Leste.   Para cada credenciado, um veículo sem autorização   O transporte escolar em Belo Horizonte é feito por 1.914 veículos, entre micro-ônibus, vans, ônibus e Kombis. Porém, para cada automóvel cadastrado na BHTrans há outro clandestino. A afirmação é do presidente do Sindicato dos Transportadores de Escolares da Grande BH (Sintesc), Carlos Eduardo Campos.   “Esse é um problema antigo e as autoridades sabem disso. Porém, a situação está mais delicada agora. Há uma proliferação desses motoristas”, disse Campos.   Para o presidente da Federação das Associações de Pais e Alunos de Escolas Públicas de Minas Gerais (Fapaemg), Mário de Assis, a situação é grave e precisa ser debatida. “O simples credenciamento não é sinônimo de segurança, mas indica que as normas estão sendo respeitadas”.   Segundo Assis, a solução passa por ações conjuntas, como o remanejamento e ampliação de escolas, mais atuação da polícia e conscientização dos pais. “O serviço de ônibus é ruim e não há escola no bairro daquele estudante”. Ele completa: “Em muitos países, é comum o pai levar à escola o filho e os colegas do prédio que estudam na mesma instituição. É a carona organizada. O debate deve envolver toda a sociedade”.   A BHTrans informou que a autuação de condutores clandestinos deve ser feita pela polícia. O assessor de comunicação do Batalhão de Trânsito (BPTran) da Polícia Militar, tenente Nagib Magela, diz que desde o início do ano a corporação tem feito a operação “Transporte Seguro”. O objetivo é coibir abusos.   “Nós apertamos o cerco aos infratores do transporte escolar nessas operações”, garante o tenente. Segundo ele, o fundamental é a conscientização dos pais. “Eles estão adquirindo um serviço que pode colocar em risco a vida dos próprios filhos”.   Questionado sobre a utilização dos carros de passeio nesta atividade, o oficial alega que o percentual é pequeno e que as principais irregularidades são de vans sem os selos de autorização.   E mais   Diálogo da reportagem com um condutor clandestino que atua na região Oeste da capital mineira   Repórter: Boa tarde. Por favor, recebi um folheto informando que o senhor presta serviço de transporte escolar em Belo Horizonte. Condutor: Opa! Sou eu mesmo, chefe. Pode falar. Em que posso ajudá-lo? Repórter: O senhor atende escolas próximas ao bairro Gameleira? Condutor: Sim. Várias escolas, principalmente ali pros lados do Detran e na Amazonas. Repórter: Quanto o senhor cobra? Condutor: Olha...depende. Tem que ver a rua direitinho, onde fica a escola e, principalmente, o horário para saber se tem vaga disponível. Mas, em média, fica uns R$ 150. Repórter: Qual a forma de pagamento? Condutor: Em dinheiro e, normalmente, até o quinto dia útil, mas tudo pode ser combinado. A gente pode até fazer um contrato se o senhor quiser. Repórter: Pelo que percebi no anúncio, é um carro de passeio. A BHTrans autoriza esse serviço? Condutor: Com relação a isso, o senhor pode ficar despreocupado. Há oito anos faço esse trabalho. Repórter: Oito? Condutor: Exatamente. Repórter: Mas isso não é ilegal? Condutor: A única diferença é que as vans escolares têm licença da prefeitura. A licença é muito cara e, com a quantidade de meninos que carrego hoje, ficaria inviável. Repórter: Mas e se o carro for parado em uma blitz? Condutor: Já fui. Conheço os agentes da BHTrans que atuam na região. Nunca deu nada. É tranquilo. Repórter: São quantos alunos transportados atualmente? Condutor: Estou com 21 ou 22. Tenho que olhar. Faço um planejamento de acordo com os horários. Tem uns que estudam pela manhã, outros na parte da tarde. Os meninos vão sentados e com cinto de segurança. Nunca tive problemas. Repórter: Ok. Vou dar uma olhada e entro em contato novamente. Muito grato.

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