Grupos contrários à vacinação ganham a internet, mas discussão gera polêmica

Raul Mariano
rmariano@hojeemdia.com.br
24/05/2017 às 20:21.
Atualizado em 15/11/2021 às 14:42

Marcela* nunca vacinou a filha de 6 anos. Nem mesmo quando a menina teve coqueluche, aos 8 meses, a mãe mudou de ideia. Para ela, é totalmente possível que a criança desenvolva mecanismos de autodefesa que dispensem a imunização tradicional. Mais do que isso, a mulher é adepta de um grupo que afirma que conservantes e metais pesados contidos nas doses aplicadas na primeira infância podem ser prejudiciais à saúde. 

Apesar de ainda ser incipiente no país, o movimento antivacina tem ganhado repercussão, sobretudo na internet. A vasta quantidade de sites, blogs e grupos nas redes sociais focados na disseminação do tema dão uma dimensão do quanto a discussão é crescente.

Em muitos casos, o conteúdo divulgado não é embasado em evidências científicas. Em outros, a fundamentação está na homeopatia ou na medicina antroposófica, que considera as dimensões emocional, mental e espiritual dos pacientes. 

Apoiada pelo marido, Marcela relata que a família não sabe da decisão do casal e que é difícil falar abertamente sobre o tema. Apesar dos constantes questionamentos e da orientação contrária feita pela maioria dos médicos, ela tem a convicção de que a filha está sendo criada com a máxima saúde.

“Na minha família, meus avós, que vieram da zona rural, nunca foram vacinados e nunca tiveram nenhuma doença infecciosa. Já a minha geração, que tomou todas as vacinas possíveis, desenvolveu distúrbios alérgicos que até então ninguém tinha. E o pior é que não há pesquisas aprofundadas sobre os efeitos pós-vacinação”, justifica.

Riscos

Psicóloga especializada em homeopatia, Juliane Saborido explica que nenhum profissional tem a intenção de induzir pais a não vacinarem os filhos. No entanto, ela afirma que os estudos a respeito dos conservantes usados nas imunizações são insuficientes. 

“O mercúrio, usado em muitas vacinas, é uma substância perigosa porque acumula no organismo e o corpo tem dificuldades de eliminar. E temos estudos muitos rasos sobre isso. Acreditamos que uma criança que recebe essa carga de substâncias que não são naturais deixa de funcionar a partir da raiz verdadeira do que é ser humano. Essa bomba que vem de fora quase sempre é patogênica”, argumenta. 

Protagonismo

A médica e presidente da Associação Brasileira de Medicina Antroposófica (ABMA), Iracema Benevides, defende que, por se tratar de um problema de saúde pública, o apoio ao calendário nacional de vacinação deve ser sempre irrestrito. Ela explica, porém, que hábitos mais saudáveis poderiam dar às crianças um protagonismo maior no fortalecimento do próprio sistema imunológico.

“Hipoteticamente, seria desejável que a criança exercitasse o sistema imunológico entrando em contato direto com os vírus, por meio da natureza. Quando ela recebe a dose, a criança entra em contato com a vacina e não com o organismo original. Nesse sentido, teríamos maior liberdade no desenvolvimento, na convivência ao ar livre”, avalia Iracema. 

Para médicos, benefício das doses é inquestionável

A um dia do fim da campanha nacional de vacinação contra a gripe, pouco mais da metade das crianças mineiras entre 6 meses e 4 anos receberam a imunização contra o vírus, conforme dados do Sistema Único de Saúde (SUS). Diante disso, a meta do Estado de vacinar pelo menos 90% da população pode não ser cumprida.

Nesse contexto, especialistas em vacinação alertam sobre a importância de imunizar as novas gerações. A médica Andrea Lucchesi, presidente do Comitê de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria, considera o movimento antivacina um problema “seríssimo”. 

Para ela, não resta dúvida de que a mortalidade infantil foi drasticamente reduzida por meio de vacinas.

“Essa eficácia é inquestionável em qualquer lugar do mundo. A quantidade dos conservantes nas vacinas é mínima e não há efeitos negativos. Há inúmeros estudos sobre isso. Pais precisam consultar profissionais especialistas e jamais se orientarem pelas redes sociais ou sites”, critica. 

O Ministério da Saúde informou, por nota, que “o movimento contrário à vacinação é considerado pequeno no Brasil” e “não existem evidências de que esses grupos influenciem diretamente a cobertura vacinal no país”. Segundo o órgão, “ao não vacinar seus filhos, os pais podem ser responsabilizados civil e penalmente pela decisão”.

* Nome fictício

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