Inventário reúne histórias e tradições de ribeirinhos às margens do São Francisco

Raquel Ramos - Hoje em Dia
24/10/2015 às 09:50.
Atualizado em 17/11/2021 às 02:12
 (Leandro Saadi)

(Leandro Saadi)

A grandeza do rio São Francisco não está apenas no volume d’água. Às margens dos seus quase 3 mil quilômetros de extensão vivem tradicionais comunidades que resistem ao tempo, mantendo antigos costumes, histórias e simbologias de extremo valor cultural. Parte dessa riqueza imaterial foi reunida em um inventário sobre o Velho Chico, idealizado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG).

O trabalho começou em 2012 com o objetivo de percorrer toda a extensão do rio em Minas – da fronteira com a Bahia à divisa com São Paulo. “Não tivemos condições de fazer todo esse percurso de uma só vez e escolhemos apenas a parte navegável”, destaca a diretora de proteção e memória do Iepha, Françoise Jean. Foram contemplados 17 municípios, de Pirapora a Manga, no Norte do Estado.

Os pesquisadores descobriram heranças culturais de povos ribeirinhos, quilombolas e indígenas. “Eles vivem uma relação de simbiose com o meio ambiente. Toda a existência está atrelada às variações do São Francisco”, diz Françoise. Na cheia, se dedicam à pesca artesanal. Na vazante, plantam nas áreas secas.

Outros trabalhos seguem o ritmo da natureza e os princípios deixados por gerações anteriores. “Em algumas comunidades só se esculpe a madeira para fabricação de um barco nos meses que não têm a letra r (maio a agosto)”, exemplifica a diretora do Iepha. Neste período, segundo a tradição, a madeira não apodrece ou dá cupim. E o corte das árvores é feito apenas quando há “um quarto de lua”
 
Religião

A fé de quem vive à beira do Velho Chico tem influências do catolicismo e das culturas indígena e africana. A reza da chuva – herdada dos índios – é feita com cantos gregorianos. A dança de maior representatividade, segundo Françoise, é o batuque, de origem africana. “É nesse ritmo que acontecem muitos festejos católicos”.

Além disso, ainda estão vivos na memória dessas comunidades os antigos causos e lendas, como a do Caboclo d’água, criatura de aparência monstruosa que atormenta pescadores e derruba embarcações.

Ameaça

Toda essa cultura que sobrevive ao passar dos anos corre risco de desaparecer. O conflito fundiário é a principal ameaça, afirma Françoise. “Registramos todo esse patrimônio, que está sendo consolidado em um inventário. Em 2016, queremos pensar em medidas de salvaguarda para proteger a existência dessa riqueza que nos impressionou”.

E os planos vão além. Os vales do Jequitinhonha, Mucuri e Rio Doce, ainda muito desconhecidos, podem ser tema de futuras pesquisas.

De amanhã até 2 de novembro, haverá na Praça da Liberdade uma exposição sobre os bens culturais registrados pelo Iepha; outros eventos sobre o tema acontecem nos espaços que fazem parte do Circuito Cultural.

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