Mesmo tombada mundialmente, Pampulha convive com espaços vandalizados

Malú Damázio
mdamazio@hojeemdia.com.br
07/09/2016 às 19:36.
Atualizado em 15/11/2021 às 20:44
 (Flávio Tavares)

(Flávio Tavares)

Nas margens da Lagoa da Pampulha, a impecável Praça São Francisco de Assis concentra pessoas que descansam na sombra das árvores, atletas e um grupo de estudantes sentados em roda no chão. Logo atrás está a Praça Geralda Damata Pimentel. Ao contrário do primeiro espaço, esse parece abandonado.

A mesma Pampulha que carrega a história de Belo Horizonte e os traços curvos e limpos do modernismo também traz marcas do vandalismo. Em muitos pontos, lixo cobre o gramado. Sacolas e copos plásticos, garrafas de vidro quebradas, restos de comida em embalagens de isopor e bitucas de cigarro estão espalhados pelo chão. As pichações cobrem várias estruturas de metal e colunas de concreto no espaço. 

“A pichação deve ser avaliada como um fenômeno urbano de todas as cidades. Certamente ela compromete o patrimônio público, mas, se bem conduzida, pode resultar em um importante movimento artístico da cidade” (Sergio Myssior, urbanista)

Convivendo com o contraste, a região lidera os índices municipais de reparo aos bens públicos. Até junho deste ano, a prefeitura efetuou 94 intervenções relativas à reparação de patrimônio na Pampulha. O número colocou a regional de 141 mil habitantes à frente de outras quase duas vezes mais populosas. Barreiro e Centro-Sul têm, respectivamente, 262 mil e 260 mil habitantes, mas apresentaram somente 78 e 72 ações municipais de conserto de equipamentos públicos. 

Ao todo, Belo Horizonte gasta anualmente cerca de R$ 2 milhões com a reparação de bens em todas as nove regionais da cidade.

Cuidada

Para o urbanista Sérgio Myssior, membro do Conselho[/TEXTO] de Arquitetura e Urbanismo de Minas Gerais, o título de patrimônio cultural da humanidade, conquistado em julho, pode ter intensificado a ocupação do conjunto moderno da Pampulha, e, por consequência, aumentado a cobrança da população por um ambiente seguro e convidativo.

“Patrimônio público é aquilo que as pessoas reconhecem como importante na vida delas. Acredito que, com isso, a Pampulha seja mais cuidada, preservada e fiscalizada com relação à manutenção”, afirma.Flávio TavaresDESTRUIÇÃO – Brinquedos quebrados e lixeira pichada foram flagrados na região

Segurança

Um dos critérios da Polícia Militar para reforçar o patrulhamento em áreas da cidade é justamente o número de frequentadores do local. Chefe da Sala de Imprensa da PM, o capitão Flávio Santiago explica que, além de considerar a ocupação urbana, a quantidade de viaturas e policiais num determinado ponto é calculado também a partir dos registros de delitos na região.

Santiago afirma que a estratégia voltada à prevenção de criminalidade e a rapidez na reparação de danos ao patrimônio são grandes aliados para evitar crimes em locais públicos. “Um ambiente depredado atrai pessoas que querem continuar com o processo de degradação. Por isso, quando há ocorrência de vandalismo, é importante que o local seja rapidamente restaurado para não afastar a população frequentadora”.

Já a Guarda Municipal informou que os agentes são distribuídos por “diversos locais” da capital para evitar os crimes contra o patrimônio. A divisão, segundo o órgão, é estabelecida pelo setor de planejamento.

Moradores reclamam de áreas degradadas e afirmam que em algumas só sentem-se seguros para frequentar durante o dia 

No fim da Praça Geralda Damata Pimentel, duas crianças de divertem debaixo do sol nos brinquedos do parquinho. Feitos de ferro, um deles está quebrado e revela as extremidades pontiagudas. Ao lado do playground, há aparelhos para realizar exercícios físicos. Porém, não é possível ler as orientações para utilizá-los porque a placa está completamente pichada.

O administrador Paulo César Lima faz a série de atividades aeróbicas mesmo sem conseguir visualizar as instruções de uso dos equipamentos. Lima, que frequenta o local semanalmente, conta que só se sente seguro para permanecer na praça durante o dia. “À noite não tenho coragem de vir. Fica deserto depois das 22h”. 

A ausência de circulação de pessoas também assusta Greice Magalhães, moradora da Pampulha. A professora precisa utilizar uma grande escadaria que liga a avenida Portugal à lagoa para ter acesso à pista de caminhada da orla. O local, porém, é completamente deserto e tem os muros pichados em toda a extensão. Greice afirma que tem medo de utilizar o acesso porque a escada “foi totalmente vandalizada”.

 Flávio Tavares/Hoje em Dia Assustador - Escadaria que liga avenida Portugal à orla da lagoa completamente pichada 

Divergência

A categorização da pichação como vandalismo não é uma posição unânime. Frequentadora da região, a antropóloga Renata Otto Diniz vê as inscrições como uma forma de ocupação da cidade. “Tanto o grafite quanto a pichação são sinais de presença humana. Sinto-me segura”. Para ela, o grande problema do espaço é a falta de infraestrutura básica, como bebedouros e banheiros, para ser mais utilizado pelos moradores.

Com algumas intervenções urbanas, áreas vazias passam de locais desagradáveis a ambientes convidativos, dizem especialistas. O urbanista Sergio Myssior argumenta que o poder público deve revitalizar as estruturas públicas considerando as demandas dos moradores para que façam parte do processo de recuperação, preservação e valorização do lugar. 

“A escada deveria facilitar o acesso dos moradores à lagoa, onde fazemos esportes, mas acabou criando um ambiente muito ruim. Não me sinto segura para passar lá porque o local foi totalmente vandalizado” (Greice Magalhães, professora)

Editoria de Arte

  

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