Mudança na estrutura do ensino médio causa polêmica

Igor Patrick e Malú Damázio*
horizontes@hojeemdia.com.br
22/09/2016 às 14:26.
Atualizado em 15/11/2021 às 20:56
 (ABr)

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Engessado, retrógrado, desconexo da realidade. Os adjetivos para o ensino médio são conhecidos por professores e alunos há anos. Uma medida polêmica anunciada pelo governo federal vai tentar mudar o panorama da educação secundarista. Proposta pelo presidente Michel Temer e pelo ministro da Educação, Mendonça Filho, a medida provisória pretende flexibilizar a grade curricular do ensino médio, reduzindo as 13 disciplinas obrigatórias em quatro áreas do conhecimento: ciências da natureza, ciências humanas, linguagens e matemática, à exemplo do que já acontece no Enem.

Matérias comuns devem ser agrupadas dentro de um único tópico. A carga horária também deve ser maior, obrigando a mudança do regime para o período integral. Secretários de Educação estaduais ainda não conhecem o texto da proposta, mas apresentaram sugestões, como a inclusão de um ensino profissional.

Presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), Eduardo Deschamps comemorou as mudanças. "Estamos muito animados. É a primeira vez que vemos o Ministério da Educação falar em respeitar o que cada estado pode ter de potencial inovador no processo. [O MEC] vai dar o arcabouço geral e as diretrizes macro e deixar cada rede desenvolver modelos que possam fazer sentido para os seus sistemas", afirmou.

Sem diálogo

Mas as mudanças estão longe de serem unanimidade entre os especialistas em educação. Apresentadas na forma de medida provisória, elas têm aplicabilidade imediata e 120 dias para serem votadas no Congresso Nacional. O governo federal espera aprovar as alterações até o fim do ano e implementá-las já no ano que vem.

A justificativa pela urgência são os baixos resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que ficou abaixo da meta traçada pelo MEC em 2015 (o índice ficou em 3,7, contra os 4,1 esperados) e está estagnado desde 2011. Educadores, porém, reclamam da forma monocrática como as decisões estão sendo tomadas e acusam o governo de ignorar problemas estruturais do ensino médio que não serão resolvidos até o início do próximo ano letivo.

Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF), Paulo Carrano acredita que a Medida Provisória joga por terra todo o princípio de participação na implantação de políticas públicas e não leva em conta o ambiente diverso da escola. Ele, que também é diretor do projeto “Ensino Médio EMdiálogo”, prevê o fracasso na medida.

“A própria formação dos professores precisa ser incrementada, eles não são formados para desenvolver pensamento articulado e transdisciplinar. Não adianta achar que porque o ministro dá uma canetada, os profissionais vão pensar de uma outra forma do dia pra noite”, avalia o especialista. Carrano argumenta ainda que, embora aparente descongestionamento da grade, a mudança vai representar a precarização do ensino do estudante. “Temos sujeitos e processos de formação muito desiguais. Alunos chegam no ensino médio sem saber ler, como vai tomar a decisão definitiva do que cursar para o resto da vida?”, diz, referindo-se à possibilidade de escolha entre quatro eixos de ensinona divisão das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). 

Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Avaliação Educacional da USP, Ocimar Munhoz Alavarse concorda com o colega. “O governo faz os adolescentes precipitarem as escolhas. Aos 15, 16 anos, a gente acha que se conhece e que conhece o mundo, mas a maturidade mostra que não é assim. E se o aluno estiver errado? E se a cabeça dele mudar? Os efeitos ficam e são irreparáveis”, avalia.

Alavarse também cobra um diagnóstico mais detalhado do ensino médio antes de se discutir as mudanças, já que, na opinião do especialista, só o Ideb não é o suficiente para definir o sucesso ou o fracasso de uma política educacional.

Claudio de Moura Castro, porém, defende a reforma. Para ele, o modelo brasileiro é ultrapassado e precisa se alinhar com as habilidades do mundo moderno. “Pense em que todos os países que atraem estudantes, incluindo aí Ásia, Europa e América do Norte. Nenhum desses países tem um sistema como nosso, fechado. São oferecidas alternativas: programações diferentes, matérias optativas. Nos EUA, um aluno comum tem entre 100 e 200 disciplinas para escolher”.

*Com agências

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