Mulheres protestam em BH contra medida judicial que tira bebês de mães usuárias de drogas

Tatiana Lagôa
tlagoa@hojeemdia.com.br
12/05/2017 às 20:58.
Atualizado em 15/11/2021 às 14:32

A artesã Aline Paula, de 29 anos, teve o filho retirado dos braços com apenas doze dias de vida. Assim como ela, outras centenas de mulheres estão vivenciado essa situação por causa de uma determinação judicial. Com base na ordem, mães usuárias de drogas ou em situação de rua estão sendo afastadas compulsoriamente dos bebês ainda nas maternidades públicas de Belo Horizonte. Dados da prefeitura mostram que já são 297 casos desde 2015.

Foi contra essa realidade que, nesta sexta-feira, integrantes do Movimento “De Quem É Esse Bebê” protestaram em frente à prefeitura da capital. Elas pedem maior sensibilidade do Executivo. 

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 O filho de Aline, hoje com 4 anos, não somente foi levado para abrigos como também adotado sem o consentimento da família. “Ele foi sequestrado de mim, e eu não era usuária de droga frequente”, lamenta. 

Um ano após o afastamento do bebê, ela teve outra filha e conseguiu manter a guarda da criança. Neste ano, Aline deu à luz a um outro menino, hoje com dois meses. “A maior prova que tenho condições de cuidar do meu filho é que tenho outros dois”.Lucas Prates

Aline entrou na Justiça para tentar a guarda do primogênito, levado dela ainda na maternidade; há dois meses ela deu à luz ao terceiro filho

Penalidades

O acolhimento compulsório em abrigos de BH começou em 2014, quando o Ministério Público fez uma recomendação às maternidades públicas que indicassem as mães usuárias de drogas ao Juizado de Infância e Juventude. Em julho de 2016, o juiz da Vara, Marcos Flávio Lucas Padula, esitpulou o prazo de 48 horas para a comunicação à Justiça.

“Os profissionais de saúde estão sendo obrigados a denunciar as mães. Inclusive, existem penalidades previstas para os que não fizerem isso. Mas a regra vale apenas para maternidade pública e, portanto, afeta em sua maioria mães pobres, negras e vulneráveis socialmente”, afirma Carla de Carvalho, membro do Conselho de Saúde da capital. 

Em nota, a Secretaria Municipal de Políticas Sociais afirma que preza pela “garantia da convivência familiar e comunitária, assim como da defesa dos direitos de mulheres e crianças”. Entretanto, essa não tem sido a regra em BH. Só no ano passado, 132 crianças foram encaminhadas para abrigos. Em 2017, já são 25.[

Direitos

Segundo a defensora pública Adriane da Silveira Seixas, a recomendação fere direitos garantidos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “A regra é que o abrigamento ocorra apenas em caso de comprovada a vulnerabilidade da criança. Mas, em muitos casos, a mãe sequer é usuária de droga frequente e tem plena condição de ficar com o filho”.

Como as vítimas desse tipo de situação são, em sua maioria, mulheres vulneráveis socialmente, até que elas se reestruturem para conseguir a guarda da criança, o bebê pode já ter ido para a adoção. “Tem mãe que tem como justificativa a perda do filho porque apanha do marido. É um absurdo”, afirma Polly do Amaral, ativista do grupo Parto Humanizado.

Por nota, a Secretaria de Estado de Saúde afirmou que “a exigência de notificação dos casos de gestantes/mães usuárias de drogas que se encontram em pré-natal ou durante a internação em maternidades caracteriza-se como violência institucional e claro preconceito”.

Já a Secretaria Municipal de Saúde disse que o encaminhamento para a Vara Cível deve ocorrer quando esgotadas as possibilidades de atenção às mães. Em nota, a Vara Cível da Infância e Juventude de BH disse que as decisões de acolhimento acontecem após avaliação do juiz de que o retorno da criança para a família de origem a coloca em risco social e pessoal. O Ministério Público não pronunciou sobre o assunto. (Colaborou Raul Mariano)

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