Mulheres têm direito a cirurgia plástica gratuita para apagar sinais da violência

Ernesto Braga
eleal@hojeemdia.com.br
24/03/2016 às 19:24.
Atualizado em 16/11/2021 às 02:38

Em Minas, cerca de 350 mulheres são violentadas todos os dias. Além do trauma psicológico, em muitos casos as vítimas passam a conviver com as sequelas dos espancamentos, maus-tratos e abusos sexuais. Se livrar das marcas que carregam pelo corpo é o primeiro passo para que elas possam recuperar a autoestima.

O último 8 de março, Dia Internacional da Mulher, se transformou em um marco para aquelas que são gravemente feridas por seus algozes. Nesta data, elas passaram a ter direito à cirurgia plástica reparadora gratuita, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). Para isso, precisam denunciar a agressão à polícia.

Membro da regional mineira da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), Cláudio Salum aponta as lesões mais comuns: “São os cortes no rosto e fraturas de face, principalmente de nariz”, diz. Perda de partes da orelha, lábios e marcas de queimaduras pelo corpo também exigem a intervenção cirúrgica.

Segundo Salum, a oferta de cirurgia reparadora na rede pública para essas mulheres partiu da SBCP, que procurou o governo federal.

A Lei 13.239, com essa finalidade, foi promulgada em 31 de dezembro de 2015, mas entrou em vigor há 20 dias, regulamentada pela Portaria Interministerial nº 331. O conteúdo da portaria foi encaminhado aos gestores estaduais de saúde.

Estrutura

Em Minas, há poucas informações sobre a estrutura montada para atender as mulheres violentadas. A Secretaria de Estado de Saúde (SES) não detalhou como elas estão sendo comunicadas dos benefícios da Lei 13.239.

Segundo a assessoria de imprensa da SES, na semana passada, o único técnico que poderia falar sobre o assunto estava “em serviço externo e só retornaria hoje a BH”.

A secretaria explicou que, por se tratar de uma lei nova, não dispunha de “dados de quantas mulheres já fizeram a cirurgia em Minas ou outras informações mais específicas”.

A delegada Danúbia Quadros, chefe da Divisão Especializada em Atendimento à Mulher, Idoso e Pessoa com Deficiência, destaca a necessidade de uma mobilização da SES, em parceria com a Polícia Civil, para que a lei emplaque em Minas.

Na unidade comandada por ela, que registra casos de BH, nenhuma vítima havia demonstrado interesse pela cirurgia até a semana passada.

Denúncia

Segundo a delegada, para que a vítima seja encaminhada à rede de cirurgia plástica reparadora, ela precisa tomar a iniciativa de denunciar o agressor. “A mulher tem o livre arbítrio. Mas, nesse caso, tem que manifestar o interesse. A vítima pode procurar qualquer delegacia para registrar a queixa”, ressalta.

Paralelamente à abertura do inquérito, a denunciante recebe o comprovante de que esteve na polícia, que deverá ser apresentado na rede pública de saúde.

Caso ela procure um médico antes de comparecer à delegacia, “a equipe que prestar o atendimento também será responsável pela indicação da cirurgia plástica e encaminhamento para o local onde o procedimento é realizado”, informa a SES.

“Além de aumentar a autoestima dessas vítimas de violência, a lei vai tornar o serviço de cirurgia plástica mais eficiente, pois a mulher será encaminhada diretamente a um especialista sem ter que passar antes por outros médicos”, avalia Cláudio Salum.Editoria de Arte/Hoje em Dia / N/A

Ponto a Ponto

- A Lei 13.239, regulamentada em 8 de março pela Portaria Interministerial nº 331, garante cirurgia plástica reparadora de sequelas, por meio do SUS, às mulheres vítimas de violência.

- Os hospitais e centros de saúde pública que receberem as vítimas deverão informá-las deste benefício.

- Se omitir a informação, o responsável pela unidade de saúde fica sujeito a penalidades, como multa e perda da função.

- Para ter direito à cirurgia, a vítima deverá portar ocorrência da agressão registrada pela polícia.

- Em Minas, mulheres vítimas de qualquer tipo de violência, incluindo a sexual, que necessitam ou não da cirurgia reparadora, são atendidas em 87 unidades que prestam atendimento clínico e psicológico por meio do SUS.

- Compõem a rede de cirurgia plástica reparadora conveniada ao SUS os hospitais da Baleia, Felício Rocho, João XXIII, Universitário São José, das Clínicas, Santa Casa (em Belo Horizonte); da FFJF (Juiz de Fora); Santa Casa de Caridade (Montes Claros); Universitário (Pouso Alegre); da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro (Uberaba); e da Universidade Federal de Uberlândia.Lucas Prates / N/A

Delegada Danúbia dá orientações às mulheres agredidas sobre cirurgia plástica

Lei precisa de complementos, aponta delegada

A Lei 13.239 precisa ser aprimorada, na avaliação da delegada Danúbia Quadros, chefe da Divisão Especializada em Atendimento à Mulher, Idoso e Pessoa com Deficiência.

Não está definido, por exemplo, se mulheres que tiveram o corpo marcado pela violência antes de 8 de março deste ano, quando a legislação entrou em vigor, têm direito à cirurgia plástica reparadora na rede pública de saúde.

“A lei é muito curta, não aprofunda em detalhes. Serão precisos mais estudos neste sentido”, diz a delegada. Danúbia aponta a necessidade de uma ampla campanha de divulgação, por meio da parceria entre a Polícia Civil e a Secretaria de Estado de Saúde (SES).

“Já estamos informando as mulheres da possibilidade da cirurgia no momento em que elas registram queixa”, afirma.

De acordo com a Portaria Interministerial nº 331, que regulamenta a lei, além das cirurgias plásticas, as vítimas deverão ser assistidas, caso necessário, com medicamentos, órteses, próteses e outros materiais fornecidos pelo SUS. 

Pelo artigo 4º da portaria, “compete aos gestores do SUS no âmbito federal, estadual, municipal e do Distrito Federal dar ampla divulgação aos profissionais e colaboradores do sistema público” sobre os benefícios às mulheres vítimas de violência.

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