Número de inscritos no Enem com o nome social quadruplica em dois anos

Malú Damázio
mdamazio@hojeemdia.com.br
19/10/2016 às 20:37.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:17
 (WESLEY RODRIGUES)

(WESLEY RODRIGUES)

Dois anos depois da entrada em vigor da medida que permite a adoção do nome social no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), levantamento mostra que o número de inscritos que lançaram mão desse direito em 2016 (407) é quatro vezes maior do que em 2014, quando foram 102 candidatos.

Yasmim Melo está entre os 81 estudantes de Minas que se inscreveram para o exame deste ano assumindo a identidade que escolheu. Ela deseja cursar sociologia e decidiu usar o nome social em 2015. “É um direito que sempre deveria ter existido”, afirma. 

Pesquisador do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da UFMG, Marco Antônio Prado destaca que a adoção do nome social por transexuais é muito importante enquanto ainda não há um direito assegurado para troca de identidade e de gênero na lei brasileira. “Mesmo que seja uma política frágil, é uma tentativa de acolher com respeito, dignidade e sem humilhações públicas os estudantes alijados completamente do ensino universitário”.

Tranquilidade

Nathan Neubaner também se inscreveu no Enem com o nome social. Hoje aluno de engenharia ambiental no Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (Cefet), conta ter ficado mais tranquilo ao saber que os fiscais e aplicadores da prova iriam recebê-lo sem constrangimentos. “Evitei ter que mostrar o RG e ser questionado sobre minha aparência não estar coerente com meus documentos”. 

De acordo com o decreto 8.727, o nome social é a designação pela qual a travesti ou transexual se identifica e é socialmente reconhecido 

Apesar de comemorar a conquista, ele destaca que o sistema adotado pelo MEC ainda precisa ser aperfeiçoado. Ao fazer a prova, Nathan viu o nome de registro escrito em parênteses ao lado do social na lista de chamada. “A gente não quer, de modo algum, que nosso nome de registro seja exposto”, diz.

Na avaliação de Marco Antônio Prado, também professor do departamento de Psicologia da UFMG, o registro duplo de nome é “altamente prejudicial e desnecessário”. 

“Embora alguns documentos oficiais ainda persistam nesse tipo de lógica, temos que avançar de modo a criar uma política de acolhimento que pare completamente de causar constrangimentos nas pessoas”, afirma. 

Em nota, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), autarquia do MEC responsável pelo Enem, pondera que a lista traz nome social e o registro civil para “garantir a segurança da aplicação” do exame. “O participante deve apresentar um dos documentos listados no edital que contenha foto para evitar que um candidato faça a prova por outro. Agora, caso a alteração do nome já tenha sido realizada na receita federal, não são apresentados dois nomes na lista de presença”.Cristiano MachadoDIREITO – Yasmin descobriu em 2015 que poderia se inscrever no Enem com o nome social 

Cursinho prepara transexuais para ingresso na universidade

Tanto Yasmin quanto Nathan se prepararam para os vestibulares no cursinho TransEnem, em BH. Aberta há dois anos, a instituição recebe somente transexuais e não tem custo para os estudantes. Assegurar que o espaço tenha somente pessoas trans é um recurso para facilitar a reinserção delas na sociedade e no mercado de trabalho, explica a idealizadora do cursinho, Adriana Valle.

Ela diz que o projeto tem a finalidade de qualificar os alunos por meio da educação e devolver a eles a oportunidade de estudar em ambiente seguro e acolhedor. “É importante que as pessoas trans possam ter essa sensação de pertencimento. Elas recuperam a autoestima e passam a perceber que sempre foram capazes”.

Também na universidade

Nathan é o segundo aluno do Cefet matriculado com nome social. Satisfeito com a postura da instituição, o jovem lembra que a adoção de medidas que assegurem a permanência dos transexuais em espaços universitários é essencial para que possam seguir com os estudos e evitar que sejam alvos de preconceito. Ainda assim, o índice de evasão e afastamento escolar dos transexuais segue alto, inclusive no ensino superior, avalia Marco Aurélio Prado, da UFMG.

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