Operação Mar de Lama descobre desvios de cerca de R$ 1,5 bilhão em Valadares

Ana Lúcia Gonçalves
alucia@hojeemdia.com.br
11/04/2016 às 15:28.
Atualizado em 16/11/2021 às 02:53
 (Leonardo Morais/Hoje em Dia)

(Leonardo Morais/Hoje em Dia)

Viagens, carros de luxo e imóveis foram adquiridos com recursos federais destinados pelo Ministério da Integração Nacional às vítimas das chuvas e reconstrução de Governador Valadares, no Leste do Estado, em 2013. De acordo com a Polícia Federal, os desvios beneficiaram servidores municipais, empresários, vereadores e podem ultrapassar R$ 1,5 bilhão.

A organização criminosa foi desarticulada durante a “Operação Mar de Lama”, deflagrada pela Polícia Federal, Ministério Público Federal e Controladoria-Geral da União na manhã desta segunda-feira (11). Doze pessoas foram presas, entre elas diretores do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) e oito vereadores foram afastados dos cargos. A PF também determinou 17 bloqueios de bens e valores.

Segundo o delegado federal Cristiano Campidelli, após sobrevoar a cidade para avaliar os estragos provocados pelas chuvas no final de 2013, a presidenta Dilma Roussef (PT) determinou a liberação de R$ 4,7 milhões para as obras emergenciais e socorro às vítimas. Ruas e casas foram alagadas e pontes caíram. O dinheiro foi liberado no início de 2014, mas a investigações começaram em 2015 após indícios de fraudes em dois contratos com dispensa de licitação.

Os dois contratos iniciais, que somaram cerca de R$ 4 milhões, foram firmados com uma empresa do Espirito Santo que não tinha sede física, funcionários e nem máquinas ou equipamentos pesados para as obras de limpeza, objeto do contrato. Logo depois foi descoberto um segundo contrato com essa mesma empresa, mas com períodos de tempo e para o mesmo fim, consumindo os R$ 4,7 milhões.

A força-tarefa descobriu que nem 20% desse montante foi aplicado em obras. “A partir das investigações desses dois primeiros contratos, chegamos a outros 9, totalizando 11 contratos com indícios fortes de fraudes e que somam mais de R$ 1,5 bilhão”, explica Campidelli. As investigações revelaram, segundo o policial, que os oito vereadores afastados recebiam vantagens para aprovar projetos que favoreciam as fraudes.

Os valores estão sendo apurados, mas a polícia já teria descoberto que tanto os vereadores quanto os demais envolvidos investiam o dinheiro em veículos de luxo e imóveis. Foram presos o diretor geral do Saae, Omir Quintino, o então diretor adjunto da autarquia, Vilmar Rios; e o empresário Seleme Hilel Neto, que na época das dispensas de licitação investigadas era o secretário municipal de Serviços Urbanos.
 
E ainda a diretora do Departamento de Limpeza Urbana, Juliana de Oliveira Alves Melo; o sócio da empresa Fejoli Florestal Ltda., Carlos Helder Lazaro e o sócio oculto dessa empresa, Emílio Claudio Alvarenga Frois; e também Djalma Florencio Diniz e Djalma Florencio Diniz Junior, sócios nas empresas Pavimentação e Terraplanagem Ltda (Pavotec) e DPARK Serviços de Estacionamento Ltda., responsáveis pelo recolhimento do lixo.
 
Os vereadores alvos da operação são Ricardo Assunção (eleito pelo PTB), Ananias Paula da Silva, o Ananias Camelô (eleito pelo PSB); Geovanne Honório da Silva (eleito pelo PT), Gledston Gomes de Araújo, o Guetão (eleito pelo PT), Levi Vieira da Silva, o Levi Presidente (eleito pelo PMN), Marinaldo Carlos de Amorim, o Zangado (eleito pelo PTC), Sezary de Oliveira Alvarenga, o Cezinha Alvarenga (eleito pelo PRB) e Milvio Jose da Silva, o Milvinho (eleito pelo PSL).

Segundo o delegado Cristiano Campidelli, esses vereadores ficarão afastados por tempo indeterminado, e poderão ser cassados pela Câmara em processo político. Até lá continuarão recebendo os seus salários. A partir de hoje, todos os presos e vereadores afastados estão proibidos de entrar ou frequentar prédios públicos como a Câmara, Prefeitura, secretarias e departamentos. O delegado pede que a população denuncie caso isso aconteça. A prisão é temporária, de cinco dias e será cumprida no presidio local.

Segundo o procurador da República em Valadares, Felipe Valente Siman, analisando a documentação e onde o dinheiro foi aplicado, apurou que nem 20% de parte dos recursos federais destinados à cidade foram investidos em obras, mas em caprichos como como viagens de luxo, “enquanto a população sofria com os transtornos da enchente”.

Segundo ele, as investigações mostram que os diretores do SAAE afastados estariam envolvidos em todas as fraudes apuradas, e com poder de mando, liderança. ”Mas as investigações prosseguem para apurar a responsabilidade individual de cada um”, avisa.

O chefe da Controladoria Geral da União, Breno Barbosa, destaca a ousadia de contratos que se pautavam na sobreposição de objeto da mesma empresa contratada, inclusive com valor idêntico de outros contratos que já existiam. “Na verdade se tratava de uma contratação fraudulenta, cuja execução já era objeto de outro contrato, com superfaturamento integral no segundo firmado”.

Segundo ele, a prefeita Elisa Costa (PT) não foi alvo desta investigação. “Investigamos a partir da execução dos contratos, que agentes públicos estariam colaborando para que esses recursos fossem executados de forma irregular; que contribuíram para direcionar as licitações, simular serviços não prestados mas pagos e formar um conluio entre empresas com a participação de servidores públicos para favorecimento desses membros da organização criminosa”.

A má execução desses recursos também pode resultar na instauração de um procedimento pelo Ministério da Integração Nacional, chamado de Tomada de Contas Especial, através do qual o município é multado e obrigado a reparar os danos.

Efetivo

Cerca de 260 policiais federais e 24 auditores da CGU participaram da operação, cumprindo oito mandados de prisão temporária, 63 mandados de busca e apreensão, 20 ordens de afastamento de funções públicas (oito delas contra vereadores, além de 17 determinações de bloqueios de bens e valores.

Crimes

A PF, no decorrer do trabalho, levantou indícios de que a quadrilha tenha praticado pelo menos 150 crimes: oito de dispensa de licitação com inobservância das formalidades pertinentes; três crimes de fraude ao caráter competitivo de licitações; três crimes de peculato; 64 crimes de corrupção passiva; 64 crimes de corrupção ativa; três crimes de falsidade ideológica; um crime de violação de sigilo funcional; dois crimes de advocacia administrativa; um crime de organização criminosa e um crime de associação criminosa. Os principais envolvidos estão sujeitos a penas que podem chegar a até 775 anos de prisão.

Afastados

Além dos diretores presos, também foram afastados das funções públicas:

Alexandre Magno de Faria Mendes Bretas - diretor do Departamento de Obras e Serviços

Schinyder Exupery Cardozo - o procurador geral do município.

Jefferson Santos Lima - diretor de Gestão de Recursos Humanos do SAAE

Evandro Karister Mendes Azevedo -  funcionário do SAAE;

Ranger Belisário Duarte Viana - secretário Municipal de Governo

Darly Alves de Souza - secretário municipal de Obras

Orfeu Brandão Perim - diretor de Departamento de Obras e Sistema Viário

Marco Rodrigo Rios Bertolacini - secretário municipal de Serviços Urbanos

Marcos Antônio Vória - diretor do Departamento de Serviços Funerários e Cemitérios .

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por