Processo de adoção pode levar anos, frustrando crianças e potenciais pais

Iêva Tatiana - Hoje em Dia
31/05/2015 às 09:25.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:17
 (CARLOS HENRIQUE/Hoje em Dia)

(CARLOS HENRIQUE/Hoje em Dia)

O excesso de burocracia e a deficiência no quadro de funcionários – como psicólogos, assistentes sociais e até juízes – são as principais razões para a morosidade dos processos de adoção de crianças e adolescentes no Brasil, segundo especialistas. Atualmente, o tempo médio de espera para conseguir a guarda definitiva de um filho adotivo é de dois a três anos.   De acordo com a advogada e professora de direito civil da Universidade Fumec Sofia Miranda Rabelo, a base do problema é estrutural, mas, ao longo do caminho, outros entraves tornam-se evidentes.   “Sempre tivemos um Estado muito burocrático, desde a colonização. Não faltam crianças aguardando para ser adotadas, de maneira nenhuma, como também não faltam pessoas querendo adotá-las, mas os processos não fluem”, diz Sofia.   Limitações   Segundo ela, os mecanismos empregados pela Justiça também são questionáveis, porque trazem limitações. “Se um casal dá entrada no processo pela comarca de Belo Horizonte, por exemplo, ele não pode passar para outra. O que não faz sentido, porque o tribunal é um só, é do Estado. Muitas vezes, os pretendentes desistem e tentam a adoção em outras cidades, mas, aí, têm de começar do zero de novo”, lamenta a advogada.   Em uma tentativa de agilizar os processos, o Conselho Nacional de Justiça apresentou mudanças no Cadastro Nacional de Adoção (CNA), onde são inseridos os dados de quem aguarda novos pais e de quem busca filhos.   A proposta do novo CNA, que começou a ser implantado no fim de março – mas só foi apresentado no início deste mês –, é tornar mais fácil o trabalho dos magistrados da infância e da juventude. Agora, os juízes precisam preencher apenas 12 itens de informações – antes, eram 35.   Modernização   No novo sistema, o cruzamento de dados de candidatos e pretendentes à adoção é feito automaticamente. Caso haja compatibilidade de perfis, um e-mail é enviado ao juiz com um alerta.   “Com a simplificação do preenchimento e as novas ferramentas disponíveis, o Cadastro Nacional de Adoção será, a partir de agora, ferramenta mais efetiva para o juiz acelerar e concretizar o processo de adoção”, considera a corregedora nacional de Justiça, ministra Nancy Andrighi.   Para Sofia, da Universidade Fumec, no entanto, a medida está longe de preencher as lacunas do sistema. “Não sei se o caminho é pelo cadastro. Parece-me que há necessidade de uma reestruturação maior. As demandas estão aí postas para nós”, conclui.   Ansiedade toma conta de quem aguarda processo   Para quem aguarda o aumento da família pelas vias da adoção, o tempo de espera até conseguir a guarda definitiva da criança ou do adolescente parece ser eterno. A bióloga Daniela Nogueira, de 38 anos, deu início à tramitação na Justiça há cerca de um ano e mal pode esperar para ter a filha em casa. Por enquanto, a rotina dela é conferir, diariamente, a página do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) na internet para acompanhar o andamento do processo.   “Queremos uma menina, negra, de 3 a 4 anos. Disseram-nos que não seria muito difícil encontrá-la, porque são características menos procuradas, mas, até agora, nada”, diz Daniela.   Há meses, ela e o marido, Lucas, não recebem nenhuma informação adicional sobre o andamento do pedido de adoção, a não ser a de que a Justiça “está em busca de uma criança”, o que só aumenta a expectativa e a ansiedade do casal, que sonha em ter mais um morador em casa.   Contraponto   O desembargador da 13ª Câmara Cível do TJMG e professor de direito civil da Escola Superior Dom Helder Câmara, Newton Teixeira Carvalho, explica que nos casos em que os pretendentes determinam as características dos candidatos, a demora para a localização pode, realmente, ser maior.    Ainda assim, ele garante que o Brasil não destoa de outros países no que diz respeito ao tempo pelo qual os processos se arrastam.   “Mas eu também acho que é o tipo de coisa que não pode caminhar muito rapidamente. Estamos falando de algo irreversível. Se o pretendente adota logo e a criança não se adapta (à nova família), não tem como devolvê-la. O processo é demorado porque há estudos social e psicossocial da criança e do casal”, ressalta.   Uma alternativa, conforme o desembargador, é pleitear primeiro a guarda da criança, um estágio probatório para a adoção e que pode ser aprovado com mais agilidade.   Espera aflita   Para Daniela, não há problema nos critérios da Justiça e ela concorda com a aplicação deles. Porém, acredita que poderia haver mais informações disponíveis para quem está do outro lado, aguardando as movimentações seguintes.   “Todos os passos que tivemos de cumprir, concordo com eles. Até nem achei tão complicado e moroso, inicialmente. As coisas estavam andando bem, até chegarem nesse momento, em que já fomos avaliados, e ficaram paradas desde então”.   Casada há três anos, ela espera realizar em breve a vontade de ser mãe. “Não sei desde quando – para mim, parece que é desde sempre – eu desejo formar uma família com (filhos) adotivos e biológicos, mesmo se ainda fosse solteira. Aí, conheci o Lucas e ele abraçou a causa junto à família dele”, lembra.   Sob suspeita   Um blog hospedado em servidores do Google Brasil foi alvo de uma ação civil pública do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), que apresentou pedido de liminar solicitando a retirada da página do ar. Para o órgão, o blog “Quero Ser Mãe” atua como intermediário de adoções ilegais e, por isso, o conteúdo deverá torna-se indisponível e inacessível.   Violação   “Tais atividades violam o artigo 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que determina que cada Juizado da Infância e da Juventude deva manter dois cadastros: um com crianças aptas a ser adotadas; outro, de pessoas interessadas na adoção”, detalhou nota do MPRJ. De acordo com o Ministério Público fluminense, o Google é objeto da ação porque opera como provedor de hospedagem, atuando como intermediário, oferecendo ferramentas de edição e gerenciamento de blogs.   O MP pede que o Google guarde os registros de acesso ao blog sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, desde o ajuizamento da ação até o trânsito em julgado, e disponibilize os registros e dados cadastrais dos acessos de modo a identificar o usuário responsável pelo blog, sob pena de multa diária de R$ 100 mil por descumprimento.

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