Criação de vagas na educação infantil pode levar à transferência de alunos em BH

Mariana Durães
mduraes@hojeemdia.com.br
09/10/2017 às 20:32.
Atualizado em 02/11/2021 às 23:09
 (Pedro Gontijo)

(Pedro Gontijo)

A abertura de 4 mil novas vagas na educação infantil em Belo Horizonte, já para 2018, vai exigir uma reorganização das escolas municipais que divide opiniões e deixa dúvidas. Para a mudança, estruturas já existentes serão adaptadas e estudantes poderão até ser transferidos para outras unidades, dependendo do fluxo de alunos em cada uma.

A proposta é uma alternativa apresentada pela prefeitura para diminuir a fila de espera de crianças de 0 a 5 anos. De acordo com a Secretaria Municipal de Educação (Smed), há muitas vagas ociosas na rede. Porém, o número de salas que poderiam ser aproveitadas não foi informado.

A proposta também pode impactar na qualidade da educação infantil, considerada de excelência nacionalmente. “Não devem ser afetadas as Umeis já existentes. Mas, as forem abertas podem não ter todos os insumos pedagógicos que as atuais dispõem. A sociedade deve continuar cobrando”, observa o professor Carlos Roberto Jamil Cury, especialista em políticas públicas para a educação.

Em Venda Nova, onde o planejamento está mais avançado, reuniões e visitas foram feitas nas escolas Professor Tabajara Pedroso e Geraldo Teixeira da Costa (Geteco). A previsão é a de que até 600 vagas sejam criadas na regional em que apenas 31,9% das crianças de 0 a 3 anos são atendidas atualmente.

Por meio de nota, a Secretaria Municipal de Educação informou que a escola Professor Tabajara Pedroso tem capacidade para atender 36 turmas e hoje há 22 em funcionamento; na Geteco são 19 salas ociosas

Transferência

Com isso, alunos da Tabajara seriam transferidos para a Geteco, e a primeira passaria a receber estudantes da educação[/TEXTO] infantil (até 5 anos) e do 1º ciclo do ensino fundamental (de 6 a 9). Todos os alunos do 4º ao 9 anos seriam encaminhados para a unidade que fica a uma distância de cerca de 500 metros.

Apesar da curta distância, a comunidade escolar está preocupada. Pais, alunos e docentes afirmam que a troca é prejudicial por interromper um ciclo e quebrar a identificação dos alunos com educadores, colegas e o próprio espaço da escola.

“Será que ele terá suporte ou vou ter que começar do zero?”, questiona Aureliene Alves Batista, de 42 anos. Ela é mãe de Thiago, de 13, que tem perda auditiva nos dois ouvidos e conta com o apoio de uma intérprete em sala de aula e com o Atendimento Educacional Especializado (AEE), em horários extraclasse, na Tabajara Pedroso. Para a família, a mudança gera insegurança. “Ele tem professores que o acompanham desde pequeno, a possibilidade de separação tem o deixado muito apreensivo”, diz a mãe.

Essa seria a segunda grande mudança para Thiago desde que entrou na escola. Neste ano, o menino precisou trocar de intérprete. “Ele cria laços com elas. A troca é sempre um sofrimento. Agora, ele já está adaptado, mas mudar de novo seria muito ruim”.

Já Maria das Dores Ângelo, de 47 anos, diz que as informações ainda não estão claras. Ela lamenta a possibilidade de os filhos, Cauã Henrique, de 10, e Ryan Pablo, de 13, terem que sair da Tabajara.

“O ensino é ótimo, os professores muito bons. Não conheço a outra escola, mas não queria que meus filhos perdessem qualidade” (Maria das Dores Ângelo, mãe de alunos)

Manutenção

A Smed garante a manutenção dos programas de apoio, assim como a escola integrada. “A política não muda”, frisa a diretora Regional de Educação de Venda Nova, Valéria Inácio Chagas.

A PBH afirma que todos os estudantes terão vagas asseguradas. Docentes que tiverem interesse em se transferir para a mesma unidade que as crianças também terão prioridade. “Não posso garantir 100%, porque a quantidade de professores está relacionada ao número de matrículas, e o cadastro ainda está acontecendo”, explicou Valéria.

Professor defende término do estudo na instituição de origem

Professor de matemática na Escola Municipal Professor Tabajara Pedroso, em Venda Nova, há 26 anos, Walcir Pereira, de 55, diz que a mudança representa “um direito sobrepondo o outro”. “Os alunos da educação infantil devem ter a chance de estudar, mas nossos alunos também têm o direito de terminar os estudos na estrutura que estão acostumados”, afirma o docente.

Apesar de entender que a alegação da comunidade escolar é legítima, a diretora Regional de Educação de Venda Nova, Valéria Inácio Chagas, afirma que sem a reorganização o direito de acesso à escola de outros alunos será negado. Por lá, a mudança deve mesmo acontecer. “Queremos garantir tranquilidade aos estudantes e professores. É claro que a identificação, história e sentimento de pertencimento é importante, mas acredito que isso está mais ligado ao território do que ao espaço físico da escola. E isso será mantido porque a transferência é na própria comunidade”, afirma.

Alternativas

Para tentar evitar o processo, representantes da escola e do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte (Sind-Rede BH) enviaram uma proposta para a Secretaria Municipal de Educação. No documento, eles sugerem que a Professor Tabajara Pedroso permaneça atendendo aos atuais estudantes até que terminem o ensino fundamental, e recebam 20 turmas de educação infantil.

No entanto, Valéria Chagas disse que outras reuniões devem acontecer nas próximas semanas, já que a ideia não é viável. “Com o plano que mandaram, não tem como. O prédio não é adequado para receber, ao mesmo tempo, educação infantil, 1º e 2º ciclos”, explica. De acordo com ela, não faz sentido manter os alunos mais velhos na instituição porque o fluxo de estudantes não deve se manter por muito tempo.

Existem na rede municipal de educação de Belo Horizonte 131 Umeis

Comunidade escolar precisa participar das discussões

Doutora em educação e coordenadora do curso de pedagogia da Universidade Fumec, Alessandra Latalisa de Sá diz que os alunos precisam estar incluídos em todo o processo que trata sobre a mudança do ambiente físico. “Não será fácil, mas eles precisam se sentir ouvidos e respeitados”. Ela explica que, caso contrário, pode gerar um sentimento de desrespeito, já que o maior impacto será sobre eles.

Por isso, é preciso entender o que eles precisam. “Se a identificação for com o espaço físico, é necessário saber o que eles gostariam de manter na nova escola, o que acham que no novo espaço seria mais interessante. Esse planejamento pode ser feito tanto através de fotos quanto em visitas à nova unidade”.

173 colégios municipais estão em funcionamento na cidade; desses, 13 possuem turmas de educação infantil

Manutenção

Nas escolas Américo Renê Giannetti (bairro Concórdia) e Monteiro Lobato (São Marcos), ambas na região Nordeste, a proposta da prefeitura foi, pelo menos, adiada. A comunidade escolar “disse não” à alteração e, em reuniões com a Smed, ficou definido que os locais não passariam por mudanças para 2018. Outras instituições da rede municipal, porém, ainda estão sendo avaliadas e a reorganização não foi totalmente descartada.

Conforme Evely de Aquino, professora na Renê Giannetti, a permanência no local foi um pedido também dos alunos. “Conversamos com eles e entendemos que seria uma mudança muito brusca, em um período muito curto”. Uma comissão foi criada para negociar com a Smed. “Procuramos alternativas, fazendo um levantamento no Concórdia para indicar outros locais que possam atender à educação infantil”, disse a docente.

Mãe de Tauan, de 7 anos, que estuda na Escola Municipal Monteiro Lobato, Luzimar Fialho Viana da Silveira também está aliviada com a manutenção da escola. “Fico feliz porque o ambiente lá é muito bom, e meu filho não queria mudar para uma escola com alunos mais velhos”.

A preocupação do garoto era em ser transferido para a Escola Municipal Henriqueta Lisboa, que atende principalmente a adolescentes.

197 creches têm convênio com a Prefeitura de Belo Horizonte para dar atendimento à educação infantil

Estrutura

Outra preocupação da comunidade é em relação à estrutura das escolas, já que muitas delas foram pensadas para atender apenas adolescentes e nunca receberam alunos da educação infantil. A Secretaria de Educação de BH afirmou que os prédios vão passar por adaptações. Entre as reformas, estão incluídas mudanças nos banheiros, refeitórios e área de lazer, que terá brinquedos adequados para a faixa etária. 

“Serão investidos R$ 1,5 milhão em obras, que estão previstas para terem início ainda em outubro”, afirma a gerente de Logística da Smed, Jussara Fátima Liberal. <CW8>De acordo com a nota da pasta municipal, a construção de cada uma das Unidades Municipais de Educação Infantil (Umeis) ficaria em torno de R$ 5 milhões, e a obra duraria, em média, quatro anos para ser concluída.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por