Fred 'zicou'

04/04/2017 às 13:54.
Atualizado em 15/11/2021 às 14:00

Divulgação / N/A

  Quando Fred foi expulso, saí da sala ainda ouvindo meu pai esculhambando o artilheiro e voltei as minhas atenções novamente para o “Quest”, jogo de perguntas sobre temas diversos, que vão de artes e entretenimento à ciência e tecnologia. Minha filha Julia, que já estava há várias rodadas na mesma casa verde de esportes e lazer, não soube responder qual jogador perdeu o pênalti contra a França, no tempo normal, na Copa de 1986. Naquele 21 de junho, um sábado, havia uma grande confiança no ar, especialmente após o Brasil não ter levado nenhum gol nos quatro jogos anteriores, diante de Espanha, Argélia, Irlanda do Norte e Polônia. Olhava para a rua, orgulhoso de ter ajudado a pintar o meio-fio com as cores verde e amarela – nessa época, quando a Seleção era quase incontestável, a gente fazia isso, como parte da “concentração” para as partidas. Ninguém se comprometia com mais nada, às vezes só indo ao supermercado lotado para fazer os petiscos – os jogos eram sempre à tarde. Controle remoto para TV, se já existia, deveria ser em poucas casas, pois eu vivia mudando o seletor, para ver o momento da chegada da delegação no estádio Jalisco. Papai foi à banca e trouxe o jornal “O Globo” que ele sempre comprava e fui logo pegando a parte esportiva. Gostava do lateral Josimar, não porque era o melhor. Mas pela situação que chegou à titularidade, viajando às pressas para o México após Leandro se solidarizar com Renato Gaúcho, afastado do grupo por indisciplina. Edson se contundiu e Josimar, que antes veria a Copa de casa, entrou na terceira partida, contra os irlandeses, e marcou um golaço, num chute de longe, forte, sem chance para o cabeludo Pat Jennings. Fiquei com dó de Pat, até então o jogador mais velho a disputar uma Copa. Ele completara 41 anos justamente no dia do jogo contra o Brasil e nunca mais voltaria a vestir a camisa verde. Aposentadoria também para boa parte do envelhecido time polonês, liderado por Boniek, que levou um sacode da Seleção – 4 a 0, com mais um belo gol de Josimar. A Canarinho também tinha seus veteranos, como Sócrates, 32 anos, e Zico, 33. Nunca fui fã do Galinho, devido à forte rivalidade que o Flamengo tinha com o Atlético naquela época. Mas era o “cara”, fazer o quê? Tinha acabado de voltar da Udinese, um dos primeiros daquela geração a jogar no disputadíssimo calcio. Machucado, não começara contra a França, guardando-se para o segundo tempo. Substituiu Müller e, dois minutos depois, já estava com a bola embaixo do braço, pronto para bater o pênalti cometido em Branco. Ainda frio, bateu mal e Bats defendeu. O jogo se decidiu nas penalidades, Sócrates e Júlio César erraram suas cobranças, mas foi Zico quem levou a culpa. Fred, 33 anos como o Galinho em 1986, também foi responsabilizado pela derrota de domingo. Mas diferentemente de Zico ou Zidane, que deu uma cabeçada no italiano Materazzi e foi expulso, na final da Copa de 2006, a “culpa” talvez vire apenas um bastidor de um clássico sempre elétrico. Julia saiu da casa verde, após responder que “cestinha” se refere ao maior pontuador no jogo de basquete, e, sem errar mais, conseguiu me passar no tabuleiro. Talvez nunca irá saber o que aconteceu em 1986. Se o Brasil tivesse vencido a Copa, aquela geração não se lamentaria até hoje. Para Fred apagar esse episódio da memória, não será preciso um daqueles aparelhos do filme “Homens de Preto”. Basta fazer o que sabe: muitos gols.

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