Livre para voar

08/07/2016 às 19:17.
Atualizado em 16/11/2021 às 04:13

Depois de ver, pelas redes sociais, o Fred soltando pipa (ou papagaio, como preferirem) no CT do Galo, num fim de tarde, todo alegre, aproveitando o imenso espaço que as crianças pouco dispõem hoje nas ruas (muitas criadas em apartamento, como o atacante descreveu seu ajudante Gabriel, em tom de brincadeira), logo viajei no tempo e me lembrei da época de infância. Não propriamente das tentativas de empinar minhas pipas, pois detestava perdê-las nas guerras travadas no céu.

Havia um disquinho colorido com uma história sobre um festival de papagaios, em que vencia quem tinha o exemplar mais bonito. Sempre o ouvia, juntamente com outro vinil sobre um fabricante de bolos. Pesquisei na internet e não achei nenhuma referência à música principal cantada pelo protagonista mirim, sobre um “papagaio de três cores que voa como um passarinho”. Resgate ilustrado pelo atacante, ao escolher uma brincadeira de criança interativa e saudável, diferente desses jogos eletrônicos.

Fred não completou um mês no grupo do Atlético, mas já é possível perceber a mudança de ambiente e a personalidade do jogador, um imã assim como quando está em campo, numa perseguição incansável à bola. Com tantos jovens no elenco do Fluminense, essa característica acabou representando uma forma de cobrança, exagerada muitas vezes. Numa equipe mais experiente como a do Galo, esse jeito é um alívio, um incentivo para que outros jogadores sigam nessa brincadeira.

O futebol perdeu, com o tempo, aquele lado lúdico, em que os resultados vinham da magia, das atrações individuais, e não da destruição, de uma jogada fortuita lançada ao ataque. Íamos ao estádio para ver Garrincha, Pelé, Reinaldo e Zico. Enxergo em Cazares essa possibilidade também, como mostrou a partida diante do Botafogo, em que os gols tomados pouco importaram para a torcida, deslumbrada que estava com o espetáculo promovido pelo equatoriano, com a luxuosa assistência de Fred.

Do atacante mineiro posso dizer que o prazer dele está em marcar gols. Parece óbvio, mas hoje em dia essa equação não parece tão simples. Com Diego Aguirre no comando, o Atlético era um paciente no divã, tentando explicar ao psicólogo a sua falta de libido, a ausência de apetite para pôr a bola nas redes. Esse apetite Fred exibe de sobra. A bola pode vir quadrada, de baixo, de cima, dos lados, mas ele não pense em outra coisa que não empurrá-la para dentro. Seus gols pelo Galo têm sido assim, frutos da intensa vontade.

Há partidas em que deixo de prestar atenção nos caminhos trilhados pela bola para observar apenas a movimentação de Fred, ansioso por encontrá-la, “comendo-a” com os olhos como se fosse um desses conquistadores que, sem qualquer modéstia, diriam que “logo você será minha”. A relação do artilheiro com a bola é assim, natural, como a criança que visualiza, feliz, um brinquedo e não pensa duas vezes antes de pegá-lo, seja de quem for. É essa alegria e essa vocação que esperamos ver no Atlético a partir de agora.

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