O vínculo empregatício na era digital

20/02/2017 às 20:29.
Atualizado em 16/11/2021 às 00:38

Carolina Ferreira de Freitas* 

A polêmica decisão da 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (TRT 3ª Região), que reconheceu o vínculo empregatício entre o Uber no Brasil e um motorista que atendia pela companhia, evidencia a fragilidade da interpretação das normas contidas na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) a que os prestadores de serviços estão expostos.

     Não obstante ao fato de haver precedente judicial em sentido oposto, cuja decisão foi proferida pela 37ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte (TRT 3ª Região), não é possível prever a jurisprudência que será firmada diante do impasse.

     A empresa ressalta os pontos que devem ser considerados, quais sejam, a atividade Uber como empresa de tecnologia, a liberdade para que o motorista parceiro escolha suas horas online, sem qualquer imposição por parte da Uber, a liberdade para não aceitar e cancelar viagens e a relação não-exclusiva entre o motorista parceiro e a Uber, que permite que os mesmos prestem o serviço de transporte de passageiros também por meio de outras plataformas.

     O aplicativo, por óbvio, não tem o condão de caracterizar a existência de vínculo trabalhista com a empresa administradora, já que esta somente cria o meio de conexão entre dois interessados (motoristas e passageiros).

     Dessa forma, há uma nítida distorção da legislação trabalhista no que tange os princípios básicos capazes de gerar o vínculo empregatício, estabelecido no artigo 2º da CLT, quais sejam: relação entre empresa e pessoa física; pessoalidade; onerosidade não eventualidade ou habitualidade; e subordinação.

     É, de fato, absolutamente questionável a incidência de habitualidade e/ou subordinação no caso dos motoristas que prestam serviços pelo aplicativo. Não há que se falar em execução dos serviços na possibilidade do motorista estar off-line, o que por sua vez, demonstra a autonomia do indivíduo em determinar o turno e a duração da jornada a ser realizada.

     Com relação aos requisitos sugeridos pelo aplicativo, é importante destacar que qualquer organização empresarial irá exigir o mínimo de qualidade na prestação dos serviços, por tratar-se de algo inerente a vários modelos de negócios e empresas, sem que isso caracterize, via de regra, a subordinação a que um empregado está submetido quando da existência real de vínculo empregatício.

     Essa distorção das normas trabalhistas a serem aplicadas a cada caso concreto, acarreta vulnerabilidade não só aos prestadores de serviços, mas aos empresários, que na tentativa de sobrevivência e adaptação à crise econômica que assola o país, diante da possibilidade de inovação e investimento capaz de gerar empregos, opta por recuar face às ameaças de um passivo trabalhista.

É indispensável, portanto, a reforma das normas estabelecidas na CLT, com o fim do excesso de protecionismo ao trabalhador, sob pena de afastá-lo, inclusive, das possibilidades de labor e sobrevivência no contexto econômico da nova era.

(*) Advogada da área Corporativa da Andrade Silva Advogados

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