Os desafios da hidrologia urbana

16/08/2017 às 13:08.
Atualizado em 15/11/2021 às 10:06

Marília Carvalho de Melo*

O modelo de desenvolvimento urbano no Brasil perpetuou uma visão do rio como um problema para a cidade. São exemplos de paradigmas ultrapassados, as ocupações urbanas que não respeitam o leito de inundação do rio, região na qual, naturalmente, o rio se expande no período chuvoso. A impermeabilização das cidades, não permitindo a infiltração da água no solo, parte importante do ciclo hidrológico, e gerando um aumento da quantidade e da velocidade de água que escoa no terreno. Ambos exemplos são causas de enchentes urbanas, de desmoronamentos de taludes, especialmente em áreas habitadas por populações vulneráveis. 

Na perspectiva da qualidade das águas, o rio nas cidades é utilizado como meio para se afastar o esgoto e o lixo. A poluição das águas, no modelo tradicional, leva a decisões técnicas que combatem a consequência, como canalizar os rios urbanos, de forma a torná-los invisíveis à população. 

Com a qualidade comprometida, as opções para mananciais de abastecimento público se tornam cada vez mais distantes das áreas urbanas, aumentando os custos de transporte da água, podendo até gerar conflitos entre municípios vizinhos. Os problemas decorrentes deste modelo demonstram que a engenharia de recursos hídricos deve perseguir um outro paradigma. Os rios nas cidades têm múltiplas funções, paisagística e lazer, além de suprimento de água para a população, como o consumo humano, a produção de bens e serviços, de alimentos, dentre outros. 

Os engenheiros civis têm um papel central na proposição de soluções sustentáveis para a hidrologia urbana. Precisamos projetar as cidades com rios integrados e pensar no melhor aproveitamento das águas urbanas. A operação técnica de um novo paradigma para as águas urbanas se divide em dois momentos. Primeiro tratar uma herança decorrente de um modelo ultrapassado, priorizando a coleta e o tratamento de esgotos domésticos para despoluição dos rios. Fomentar projetos de revitalização de rios, minimizando enchentes e retomando a relação cultural do convívio das pessoas com rio.

E, um futuro a projetar, com o rio integrado à cidade. Com a utilização das margens dos rios para parques lineares com áreas verdes para o lazer da população. E, aproveitamento de águas de chuva em residências familiares e reuso de água em atividades industriais e agrícolas, duas iniciativas que minimizam a retirada de água diretamente dos corpos de água, diminuem a sobrecarga no sistema de drenagem pluvial e minimizam a poluição dos rios. O novo cenário que garante a segurança hídrica nas cidades só se torna possível com profissionais preparados para o desafio da hidrologia urbana, reforçando a responsabilidade na formação de engenheiros com conhecimento de tecnologias apropriadas para construção das cidades sustentáveis no futuro.

(*) Doutora em Recursos Hídricos e professora do curso Engenharia Civil da Faculdade Kennedy 

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