A inteligência de Thiago Larghi

04/04/2018 às 15:34.
Atualizado em 03/11/2021 às 02:10

Thiago Larghi começou seu trabalho no Atlético priorizando uma postura reativa. Transições rápidas, contra-ataques mortais. Time precavido, esperando o adversário no campo de defesa, sem fazer tanta questão da posse, de controlar. Era mais do que compreensível naquele momento: duelos decisivos com pouquíssimos dias de treinamento; um conjunto que se apresentava despido de padrão, desorganizado na fase defensiva com Oswaldo; ademais, vale lembrar as máximas de que é mais fácil destruir do que construir, e de que, em geral, deve-se começar a ajeitar um esquadrão pela retaguarda.

Noves fora o contexto traçado, o início da trajetória de Larghi foi interessante no seguinte aspecto: ele escalou titulares que combinavam com a filosofia que escolheu na época. Velocidade, contragolpe? Otero e, sobretudo a dupla Erik/Roger Guedes se adequam bastante a este tipo de estratégia. Os dois últimos citados, agudos, verticais, carregadores de bola, normalmente trabalham claramente melhor com espaços mais fartos, quando a defesa inimiga encontra-se desguarnecida; estamos falando aqui de atletas não muito afeitos a um estilo de cadência; atacantes por definição, não armadores de origem – embora Erik tenha executado o papel de arquiteto central da linha de três meias neste período ao qual me refiro.

Com o tempo, paulatinamente, à medida que ia ganhando cancha, confiança e sequência, Larghi foi agregando ao repertório também um jogo de proposição. Linhas mais altas, anseio por tomar a iniciativa, ter a bola por mais tempo, orientação para seu escrete criar mais, dominar... Em sintonia com este novo estágio, com esta nova ideia, Luan e Cazares assumiram as vagas de Guedes e Erik. De novo, coerência entre teoria e peças selecionadas: o menino maluquinho e o equatoriano habilidoso podem até ter velocidade/capacidade para participar de ótimos contra-ataques; mas, comparados aos dois titulares que substituíram, variam mais e melhor entre um jogo de aceleração, condução, e outro de paciência, passe, construção.

Diferente acerto do comandante alvinegro materializou-se em seu ápice no clássico do último domingo: Cazares mais recuado, mais próximo dos dois volantes, nos moldes abordados por nós no texto da semana passada. Um novo detalhe me chamou atenção no duelo frente ao Cruzeiro, porém. Com o recuo do seu principal armador, e o time atacando em diversos momentos mais num 4-3-3 do que num 4-2-3-1, pode surgir um vazio pelo centro na sua intermediária ofensiva; pois então... Para evitar esta lacuna, em inúmeros instantes, enquanto Cazares ajudava na saída de bola, Elias se adiantava para criar. Em outros avanços do Galo, Luan ou Otero saíam das pontas, afunilavam para executar este labor de ligação pelo meio. Na fase defensiva, a sincronia seguia dando as caras. Às vezes Cazares ganhava certa liberdade por trás de Ricardo Oliveira e duas linhas de quatro bem compactadas, competentes no balanço eram armadas; em outras ocasiões o equatoriano também preenchia os espaços, combatia mais diretamente – e somente o centroavante ficava isento da recomposição.

Em um futebol repleto de um fanatismo, uma obtusidade anti-intelectual da torcida e da imprensa; em que invariavelmente o simplório surge como explicação/mandamento tão determinista quanto redentor, muito se fala que técnicos excessivamente jovens, e “não boleiros”, não conseguiriam ter moral com medalhões. Na prática, e por enquanto, Larghi vem desmentindo aparentemente este chavão. Afinal, à parte e em sinergia com os aspectos mais táticos que tracei, os atletas têm demonstrado um foco, uma obstinação em termos de posicionamento e combate que frequentemente não aparecem quando não se compra a ideia do líder.

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