Gastronomia x Cultura

27/11/2016 às 10:28.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:50

Olá, amigo da cozinha, 

como num canto gregoriano, minha defesa repetitiva, mas nem sempre no mesmo tom, compasso ou diapasão, nem sempre no mesmo estilo literário, às vezes com humor ou com a falta dele, e até em encenações teatrais e malabarismos interpretativos, tenho externado minhas opiniões sobre os amores e dissabores entre a gastronomia e a cultura.

Pois é, amigo, será que ainda tem gente que não reconhece esse segmento como um dos nossos maiores ícones culturais, que representa os costumes e tradições de nosso estado, e que tanto reforça a nossa imagem positiva fora de nossas fronteiras regionais e internacionais?

Pois bem, se ainda existe, gostaria de convidá-lo a buscar em qualquer referência histórica o significado e a abrangência do termo “cultura” e encontrar nas dezenas ou centenas de definições e conceitos algo que exclua a gastronomia desse contexto.

Essa semana que se passou, recebi com alegria um convite interessante de nossa Secretaria de Estado de Cultura, assinado pelo meu estimado e admirado secretário Ângelo Osvaldo. Tratava-se da eleição do CONSEC, Conselho Estadual de Política Cultural.

No convite, um layout indicando uma diversidade explícita e exaltando “um processo de renovação do Conselho ainda mais democrático.” Minha alegria durou o tempo que meus olhos percorreram a lista dos segmentos que estão contemplados ou reconhecidos no edital como cultura em nosso estado e que terão direito a ter seus representantes escolhidos para compor o Conselho.

São eles: audiovisual e novas mídias, circo, culturas afro-brasileiras, culturas indígenas, culturas populares, tradicionais e folclóricas; dança, design e moda; entidades de trabalhadores e entidades empresariais; literatura, livro e leitura; museus e artes visuais, música, patrimônio material e imaterial, produção cultural e teatro.

Infelizmente, nossa gastronomia não se fez presente ou, talvez, quem sabe, foi pensada integrando indiretamente alguma manifestação genérica popular tradicional ou folclórica, indígena, afro brasileira ou patrimônio imaterial, dentre outras.

Se assim foi, apesar de reconhecê-la em todas essas áreas, reitero minha tristeza por tal omissão ou descuido, pois não bastassem todos os movimentos recentes de valorização e reconhecimento da cultura alimentar brasileira em toda a sua cadeia produtiva, conseguimos inserir o segmento na lei estadual de incentivo à cultura e estamos quase reconhecendo através de lei federal, cujo processo já foi aprovado em várias comissões na Câmara em Brasília.

A gastronomia, ou como queiram os mais puristas, a nossa cultura alimentar, merece certamente um tratamento, no mínimo, mais cuidadoso e deve ter seu lugar nesse importante Conselho, mesmo que alguns ainda insistam em não reconhecê-la como importante ferramenta de desenvolvimento econômico social e sustentável, lastreada exatamente na história e na tradição que tão bem representam o modo mineiro de ser, de agir e se manifestar.

Espero que o nosso querido secretário de Cultura, sempre lembrado e homenageado pela gastronomia mineira por sua imensa sensibilidade, por seu conhecido apreço e admiração pelas nossas tradições à mesa, que conhece como poucos a nossa história, dos escritos de Eduardo Frieiro aos poemas de Adélia Prado e Guimarães Rosa, e as letras musicadas de João Bosco, dentre outros mestres, não irá se furtar de rever esse equívoco e, oportunamente, colocar definitivamente a gastronomia mineira no merecido patamar das artes populares e, por que não dizer, também eruditas! 

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