Crônica de uma Condenação Anunciada

24/01/2018 às 20:23.
Atualizado em 03/11/2021 às 00:56

Não se poderia esperar outra coisa! Como bem explicitou Mark Weisbrot, em artigo no New York Times, nessa terça-feira, não havia expectativa de imparcialidade do TRF-4 no julgamento do ex-presidente Lula. A repercussão desse julgamento de exceção está sendo a pior possível no exterior. Curiosamente, as contestações têm sido mais incisivas nos EUA.

No mesmo artigo do NYT, Weisbrot esclarece que “a evidência contra o Sr. da Silva está muito abaixo dos padrões que seriam levados a sério, por exemplo, no sistema judicial dos Estados Unidos”. O mesmo tipo de denúncia foi feita por uma dúzia de deputados federais americanos (em cujo grupo havia alguns eminentes juristas), em carta enviada ao Itamarati e ao STF.

As razões para considerar este um julgamento de exceção foram apresentadas na minha coluna da semana passada. Quando a autoridade máxima do tribunal de apelação dá uma entrevista dizendo que a sentença que será analisada é irretocável, mesmo confessando que não a tinha lido, o que esperar? Uma condenação com ou sem provas fundamentadas!

Assisti todas as partes do julgamento com atenção. A sustentação oral do representante do MPF foi inacreditavelmente pobre. Os votos, em particular do relator, foram lamentáveis. Ficou evidenciada a incapacidade da denúncia de mostrar culpa do acusado.

Todavia, isso se fazia desnecessário, pois a condenação independia da existência de provas irrefutáveis e convincentes. O relator tentou mostrar que a OAS funcionou como “laranja” do ex-presidente Lula. Todavia, sua narrativa foi totalmente infundada.

Se o julgamento de hoje tivesse ocorrido sob a égide do Estado Democrático de Direito brasileiro, o ex-presidente Lula jamais teria sido condenado. Ocorre que, infelizmente, se criou no Brasil, a partir do julgamento da famosa Ação Penal 470, um arcabouço legal que formou um “Estado Paralelo de Direito” no país. O que torna isso ainda mais grave é que esse arcabouço legal - criado de forma ilegítima - é aplicado de forma seletiva, com base em critérios políticos baseados em elementos relacionados à estratificação social de classe e de status.

Os votos do relator e do revisor fizeram referências exemplarmente coerentes com as “inovações jurídicas” (que criaram o “Estado Paralelo de Direito”) do julgamento da Ação Penal 470. Em particular, mas não somente, as referências à aplicação equivocada da chamada Teoria do Domínio do Fato.

Um conflito político em torno dessa arbitrariedade seletiva do judiciário já era para ter eclodido naquele momento do julgamento da Ação Penal 470. Agora, isso se tornará inevitável. Será um conflito sobre o processo civilizatório no Brasil e o seu resultado será fundamental para determinar o que será este país!

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