O Golpe e a Caixa de Pandora

04/04/2018 às 22:18.
Atualizado em 03/11/2021 às 02:10

Era bastante previsível que o golpe de 2016 nos levasse para onde nos levou, ou seja, para um ambiente dae antagonismo extremo e de violência crescente. Assim como na Europa a crise econômica de 2008 fez aflorar uma série de demônios que estavam adormecidos nas profundezas da sociedade europeia, o golpe de 2016 teve o mesmo efeito no Brasil.

A verdade é que o Brasil é um país preso ao arcaísmo. O processo de modernização, aqui, teve um caráter profundamente conservador. Por exemplo, a modernização tecnológica e econômica do setor agropecuário se deu com a manutenção de uma das estruturas agrárias mais retrógradas do mundo, com uma concentração fundiária que beira o inacreditável (há estados brasileiros nos quais o coeficiente de Gini da distribuição de terra está acima de 0,9 e nenhum estado ele é inferior a 0,6).

O arcaísmo da sociedade brasileira está aflorando, neste exato momento. Uma das dimensões desse arcaísmo é a falta de comprometimento da elite nacional com valores democráticos. Isso está presente tanto na elite econômica, quanto no estamento burocrático e profissional e no estamento político.

Evidências disso são abundantes. A manifestação do governador Alckmin e do prefeito Dória de que os tiros recebidos pela caravana do ex-presidente Lula foi algo merecido é uma. A ameaça velada do general comandante do Exército é outra, bem como – talvez a mais chocante de todas – o fato de que o TRF-4 “curtiu” (provavelmente, por iniciativa de seu presidente) a ameaça do general.

Escrevo este artigo antes de saber o resultado do julgamento do habeas corpus requerido pelo ex-presidente Lula. Seja qual for o resultado, muitos ficarão insatisfeitos. De uma coisa tenho certeza, contudo, a segurança jurídica e a normalidade institucional só podem resultar da preservação do nosso arcabouço legal, principalmente da Constituição. Quiseram os constituintes que o estado brasileiro privilegiasse a presunção de inocência.

Portanto, para se fechar a caixa de Pandora e o país começar a retomar um caminho de certa normalidade, o melhor é que nos mantenhamos o mais fiéis possível ao pacto político e social da Constituição de 1988. Espero, portanto, que no momento da leitura desta coluna, estejamos diante de uma decisão do Pleno do STF que retome o que foi decidido pelos constituintes, ou seja, a garantia da presunção de inocência.

P.S.: Meu único receio é que, quando falham as instituições, nos sobra confiar nas pessoas. Ocorre que, infelizmente, algumas pessoas que ocupam posições centrais no atual processo não parecem merecer tanta confiança, vide a atual presidente do STF que politizou o processo e escolheu um caminho mais desgastante para o tribunal, tendo, inclusive, sido censurada por colegas mais sêniores.

 

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por